O tuíte do general Villas Boas nesta manhã, solidarizando-se com o general Santos Cruz e criticando o guru Olavo de Carvalho, fez subir de patamar a mais nova crise do governo Bolsonaro- ou seu mais recente tiro no pé. Fica claro que, para os militares, há um limite, e que eles estão juntos. Quem conhece o ex- comandantedo Exército, ainda hoje muito respeitado nas Forças Armadas, sabe que sua manifestação foi acertada com os demais militares palacianos, como o general Augusto Heleno, e que é um recado claro a Jair Bolsonaro para colocar um freio na inconsequência de filhos e gurus.
Como se chegou a isso?
O general Santos Cruz, chefe da Secretaria de Governo, é um dos mais próximos auxiliares de Bolsonaro, um antigo companheiro da juventude, talvez o ministro com quem ele tenha hope mais intimidade – já que com o chefe do GSI, Heleno, a relação é de reverência paternal. Santos Cruz é também o chefe da Secom, subordinada à sua pasta. Apesar de tudo isso, está apanhando e sendo xingado com palavras de baixo calão nas redes bolsonaristas – que, em tese, estariam sob seu comando -, alvo de uma campanha de desmoralização patrocinada por Olavo e claramente turbinada pelos filhos presidenciais.
O normal em qualquer governo seria que o presidente botasse ordem nessa casa. Ou chama os filhos – e o guru – e manda pararem de agredir seu mais leal auxiliar ou, ainda que para espanto geral, demite o general, se entender que ele é que está se comportando
E o que fez Santos Cruz? Aparentemente, deu uma entrevista, um mês atrás, criticando o radicalismo nas redes sociais e defendendo algum tipo de disciplinamento para conter abusos. Foi uma declaração tão anódina que, na época, ninguém nem comentou.
Coincidência ou não, foi ressuscitada – e rebatida pelo próprio Bolsonaro, em tuítes reproduzidos pelos filhos, em que se nega a “regumentar as mídias sociais”, como se disso se tratasse o assunto. Obviamente que não se trata.
Por trás da ira de Olavo, dos meninos e dos bolsominions está mais uma disputa de poder entre as alas militar e ideológica do governo, desta vez em torno da nomeação do novo presidente da Apex, o militar Sergio Segovia, que saiu este sábado. Segovia é ligado a Santos Cruz – e a outros militares palacianos – e desagradou a turma de Olavo e do chanceler Ernesto Araújo, que depositam todas as suas fichas nos superpoderes da diretora Leticia Catelani na Apex.
O problema é que a Apex virou coisa menor nessa crise. Sobretudo depois do gesto do general Villas Boas. As agressões a Santos Cruz – que também não é santinho e rebateu chamando Olavo de “desocupado esquizofrênico” depois de ser chamado de “bosta” outros xingamentos – parecem estar chegando a um ponto de não-retorno. E o apoio militar a ele dificulta uma demissão pontual para por fim à crise.
Santos Cruz fica. Mas o general, que esteve no Alvorada ontem à noite, perde grande parte de sua autoridade para continuar comandando uma das pastas mais importantes do Planalto, que cuida de articulação e de comunicação. Quem irá obedecê-lo, sabendo que pode correr para o Carluxo e desautorizá-lo com uma campanha #ForaSantosCruz?
Piores ainda são os efeitos disso na imagem interna e externa do governo. Passa a impressão de barata-voa, zorra total, um governo quase militar em que a hierarquia não é respeitada e todo mundo atira em todo mundo. Como todos os pés levam tiros, ninguém anda e continua tudo parado. Bolsonaro não percebeu que, ao esvaziar instituições e auxiliares que lá estão para servir a seu governo, favorecendo o núcleo familiar-afetivo, está esvaziando a si mesmo. Os militares que o cercam perceberam.