Ao criticar a aliança partidária em torno da pré-candidatura de Geraldo Alckmin, onde identificou a repetição do palanque para reeleger a ex-presidenta Dilma Rousseff, em 2014, a pré-candidata Marina Silva (Rede), que naquele ano como candidata pelo PSB teve em sua coligação o PSL de Jair Bolsonaro, errou na sua avaliação. O maior desafio do tucano, na verdade, será descolar-se do governo do presidente Michel Temer, que o PSDB ajudou a montar com o Centrão e do qual até hoje participa.
Os tucanos, que têm histórico de convivência com o Centrão desde os governos de Fernando Henrique Cardoso (1995-1998 e 199-2002), se juntaram ao MDB e ao PSB para derrubar a presidenta eleita pelo PT para formar um governo com Temer, no qual o PSDB entrou com quatro ministros: Bruno Araújo (Cidades), José Serra (Relações Exteriores), Alexandre Moraes (Justiça) e Luislinda Valois (Igualdade Social).
Além desses ministros, os tucanos emplacaram a secretária-executiva do Ministério da Educação, Maria Helena Guimarães de Castro, e a presidente do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), Maria Inês Fini, enquanto o senador Aloysio Nunes Ferreira assumiu a liderança do governo no Senado. Mais tarde, Aloysio substituiu Serra no Itamaraty e o deputado baiano Antônio Imbassahy, ex-líder do PSDB na Câmara, também virou ministro de Temer ao assumir a Secretaria de Governo da Presidência da República.
Por essa participação no governo, por duas vezes o PSDB precisou garantir com os votos dos seus deputados a permanência de Temer no Palácio do Planalto, quando ajudou a rejeitar as denúncias da Procuradoria Geral da República pelo afastamento do presidente para que fosse investigado por seu envolvimento com a JBS.
Com a crise do presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves, parceiro de Temer nas propinas da JBS, os tucanos foram pressionados pelos “cabeças pretas” do partido para desembarcar do governo, mas essa pressão foi contida exatamente por Geraldo Alckmin, ao defender a manutenção do apoio a Temer.
Uma pesquisa encomendada pelo próprio partido e divulgada em outubro do ano passado revelou o custo dessa participação do PSDB no governo Temer. De acordo com a pesquisa, 75% dos brasileiros não acreditavam na eleição de um presidente tucano nas eleições de 2018. No Nordeste, o percentual chegava a 84%. Uma das causas do desencanto do eleitor com o PSDB, apontou o estudo, era a participação do partido no governo Temer.
Essa participação também se mostraria forte no Congresso. Além de ajudar a rejeitar as denúncias contra Temer, o PSDB contribuiu para a aprovação da reforma trabalhista, que reduziu direitos dos trabalhadores; o teto dos gastos públicos, que inviabilizou investimentos; e a reforma do ensino médio, repelida por estudantes e especialistas em educação. E embora tenham se esforçado, os tucanos não conseguiram aprovar a reforma da Previdência.
Somente em 2018, um levantamento da consultoria Arko Advice divulgado nesta quarta-feira (25) pelo Estadão, mostra que os parlamentares do PSDB aparecem como em terceiro lugar entre os mais alinhados ao governo Temer, com um índice de 63,05% das votações, perdendo apenas para o MDB (64,34%) e o para o PSL de Jair Bolsonaro, com 67,73% das votações favoráveis ao governo do emedebista.
Confirmando sua fidelidade a Temer e contrariando o deputado Paulo Pereira Silva, que levou o Solidariedade para a coligação de Alckmin, o tucano já disse que não revogará, se eleito, dispositivos da reforma trabalhista comandada por Temer, como trazer de volta o Imposto Sindical, reivindicada por Paulinho da Força.
Essa ligação siamesa do PSDB com Temer, que Alckmin procura negar, é o maior desafio do candidato tucano para sair do rabo das pesquisas. Por isso Alckmin torce para a confirmação pelo MDB da candidatura do ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles, o que ajudaria o tucano a se descolar do atual governo. A tarefa não será fácil, pois embora alguns ministros do PSDB já tenham deixado o governo, Alckmin tem compromissos com sua base eleitoral de dar continuidade ao governo Temer.
Junto com esse conjunto de carcomidos partidos, Alckmin também trouxe para a sua pré-candidatura economistas que participaram da elaboração do Plano Real, gestado no governo Itamar Franco (1992-1995) para controlar a inflação reprimida pelos governos militares e que os primeiros governos civis depois da ditadura, José Sarney e Fernando Collor, não conseguiram debelar.
Implantado por Fernando Henrique, que era ministro da Fazenda de Itamar, o Plano Real transformou-se na joia da coroa dos dois governos tucanos de Fernando Henrique e até hoje enfeita a vitrine de realizações do PSDB, ao lado das privatizações de empresas públicas de diversos setores da economia promovidas pelo tucanato. Mas essas realizações atualmente pouco significam para o eleitor, ao contrário do que fez o PT nos seus 14 anos de governo.
O vice-governador de Pernambuco, Raul Henry, presidente estadual do MDB mas que já rifou a candidatura de Henrique Meirelles para ser cabo eleitoral de Alckmin, afirma, em entrevista ao Estadão, que o tucano precisa, na verdade, “olhar o exemplo de Lula” e superar a dificuldade que o “PSDB tem de compreender o Nordeste.”
Seria o caso, com a desistência do empresário mineiro Josué Gomes para ser o seu companheiro de chapa, de Alckmin buscar no Nordeste um candidato a vice-presidente, até para se contrapor à candidatura de Ciro Gomes (PDT) e reduzir a influência de Lula na região Ganha força para ser esse candidato o deputado Mendonça Filho (DEM-PE), outro ex-ministro (Educação) de Temer.
Em ato de agradecimento ao convite para ser vice de Alckmin, Josué Gomes, com seu nome completo, assinou hoje na Folha de S. Paulo um artigo onde afirma que “pelo que já fez e demonstrou em termos de liderança, sobriedade, capacidade de dialogar e de gerenciar bem em plena crise, Geraldo Alckmin reúne todos os requisitos para cumprir a complexa missão que se coloca”. Como vem de um aliado de Lula, o elogio pode render frutos ao candidato do PSDB.
Geraldo Seabra é jornalista