Generais barram passa-moleque do Itamaraty e clã Bolsonaro em Israel

Depois dos vexames nas viagens presidenciais ao Estados Unidos e ao Chile, militares exercem poder de veto nas concessões do governo Bolsonaro em Israel.

Bolsonaro, o filho senador Flávio, Netanyahu e Araújo. Divulgação

Nas primeiras viagens, mancadas e bolas por baixo da perna incomodaram, mas eram estragos administráveis. Nos Estados Unidos o que mais irritou foi o paparico com o guru Olavo de Carvalho e o ridículo do caçula Eduardo Bolsonaro roubar a cena na Casa Branca de seu afilhado chanceler Ernesto Araújo. Nada muito relevante até porque a imprensa americana não deu a menor bola para a visita.

No Chile foi diferente. Bobagens ditas aqui e lá a favor da ditadura do general Augusto Pinochet conseguiram a proeza de unir todas as forças políticas, inclusive o presidente anfitrião Sebastian Piñera, que passaram um pito em Bolsonaro e sua trupe. Para complicar a situação, Eduardo Bolsonaro, agora presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, aventou lá a possibilidade de uma intervenção militar na Venezuela. Mais uma vez, o papai Bolsonaro teve que corrigi-lo.

A ministra da Agricultura, Tereza Cristina. Foto Marcelo Camargo, Agência Brasil

Esses rompantes bolsonarianos no exterior foram avaliados pelos generais no Palácio do Planalto como desagradáveis, mas sem maiores consequências. O temor ali era a viagem a Israel pelo receio de mexer numa caixa de marimbondos em uma das áreas mais explosivas do planeta. Semana passada escrevi aqui O empenho de generais para evitar que Bolsonaro pise na bola em Israel. A preocupação não é só dos militares, que com razão não querem importar conflitos alheios. Os ministros Paulo Guedes e Tereza Cristina alertam para o custo econômico dessa guinada na política externa brasileira.

General Rego Barros com os jornalsias em Israel. Divulgação

Nesse cenário, cuidados excepcionais foram tomados para evitar maiores problemas em Israel. Por intermédio do porta-voz presidencial, general Otávio Rêgo Barros, foi descartado o anúncio da transferência da embaixada brasileira de Telavive para Jerusalém, promessa de campanha de Bolsonaro, toda hora alardeada por seus filhos e pelos discípulos do guru Olavo de Carvalho. A comitiva partiu daqui acertada que seria anunciado apenas um escritório de negócios em Jerusalém.

Mal desembarcou em Israel, deparou com uma narrativa diferente. O ministro do exterior de Israel, Israel Kratz, havia postado um agradecimento ao Brasil nas redes sociais: “Obrigado por abrir um escritório diplomático em Jerusalém!”. Eduardo Bolsonaro retuitou o post de Kratz e acrescentou:”O escritório é o primeiro passo para a mudança definitiva da embaixada”. Segundo os enviados especiais do Estadão, na mesma toada o Itamaraty informou que o tal escritório seria instalado como “parte da embaixada do Brasil em Israel”. Os militares reagiram rápido. Logo depois o comunicado foi corrigido com a exclusão da informação de  que o escritório em Jerusalém seria parte da embaixada.

General Heleno. Divulgação

Um pouco mais tarde, durante a entrevista coletiva de Jair Bolsonaro e o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, foi anunciada a intenção de instalar um escritório do governo brasileiro em Jerusalém nos termos acordados com os generais em Brasília. Com todas as letras, Bolsonaro passou recibo: “Agora há pouco, tomamos a decisão final, ouvindo inclusive o nosso general Augusto Heleno, ministro de Estado, de abrir em Jerusalém um escritório de comércio voltado para a ciência, a tecnologia e a inovação”.

Menos mal. Em outras bolas divididas, o Brasil optou pela abertura de escritório comercial. O caso mais comparável foi em Taipé, porque o Brasil, por exigência da China, não reconhece Taiwan como estado independente. No começo do ano passado, o clã Bolsonaro fez barulho por lá, o que até hoje é motivo de estranhamento nas relações com a China, principal parceiro comercial do Brasil.

A pá de cal no conluio entre o clã Bolsonaro e seus aliados no Itamaraty foi do general Otávio Barros. Depois de repetir que o polêmico escritório em Jerusalém tem objetivos específicos, ele arrematou: “O escritório será comandado por pessoas não ligadas à carreira diplomática”. Assim, pelo menos por enquanto, fechou a porta para interferência do chanceler Ernesto Araújo e do lobby para a transferência da embaixada.

Bolsonaro, o filho senador Flávio, o chanceler Araújo e o primeiro-ministro Netanyahu. Divulgação

Depois do que aprontou nas viagens ao Estados Unidos e ao Chile, Eduardo Bolsonaro ficou de fora na comitiva a Israel. Sua vaga foi ocupada pelo irmão mais velho, o senador Flávio Bolsonaro, menos fanfarrão, mas igualmente partidário de uma aliança incondicional com Israel. Ele fez questão de expor essa opção. Exibiu-se em público com um quipá (solidéu judeu) em estampa camuflada com iniciais em hebraico do exército israelense.

Papagaidas à parte, a estadia de Bolsonaro em Israel ainda não acabou. Outras surpresas podem pintar no pedaço. Uma delas, seguir Donald Trump no reconhecimento de que as Colinas Golã, território ocupado da Síria, pertencem à Israel, à revelia de toda a comunidade internacional. Antes mesmo da viagem, por meio do general Otávio Barros, o Planalto avisou que não está na pauta.

A conferir.

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