A fotografia pode não ser a peça mais completa para descrever um acontecimento. Mas é a forma mais aproximada para reproduzi-lo. É seguindo esse critério que um fotógrafo de notícias pauta seu trabalho, busca retratar com uma só imagem a inteira representação daquilo que viu. Para isso, seleciona as informações que vão se tornar a figura mais perto da exatidão.
“Toda imagem é um convite ao olhar”, diz a ensaísta Susan Sontag em seu livro Diante da Dor do Outros. A escritora norte-americana, falecida em 2004, analisa as imagens das aflições da humanidade ao longo da história. Ela avalia não somente a violência dos conflitos armados, mas também o infortúnio da pobreza e a fatalidade das tragédias. É uma viagem que começa nos primórdios da ilustração, com os desenhos do notável espanhol Francisco Goya, passa por todas as guerras e chega até aos dias que ela viveu, com o ataque às Torres Gêmeas de Nova Iorque e a Guerra do Iraque.
Em sua reflexão, Sontag faz considerações sobre o quanto uma foto pode levar a dor ao coração de quem a vê. Uma fotografia se transforma em tema extremamente palpitante, permeado pelo caos, na lança que atinge o emocional de cada um. Além de expor o sofrimento dos indivíduos, toca e angustia com igual ou maior intensidade as pessoas que os cercam e até de quem sequer os conhecem: os pais, um parente, um amigo ou um desconhecido expectador. A dor da vítima está de alguma forma ligada à dor dos outros.
A câmara estreou nos campos de batalha em 1855, na Guerra da Criméia. De lá até hoje, um imenso time de fotógrafos produziu acervo de imagens chocantes. Mas na grande maioria, encontra-se o terrível aspecto da dor. Robert Capa, por exemplo, captou o exato momento em que um soldado é atingido por um tiro, durante a revolução espanhola, em 1936. O realismo do instante da morte criou um novo padrão para todos os olhos.
A dor, porém, não se restringe apenas aos conflitos beligerantes protagonizados pelo homem, na luta entre exércitos. Está também nas vítimas da violência urbana abatidas pela marginalidade. Vai além. Está presente na desventura dos seres humanos doentes, infectados por epidemias e pandemias, como agora. Enxerga também os famintos, que sub-vivem nos países do terceiro mundo, onde a miséria ultrapassa a pobreza e é reflexo direto das desigualdades sociais. Exposta pela fotografia, a miséria se torna produto de destaque nas discussões de políticas sociais e econômicas raramente eficazes.
As tragédias marcam o cotidiano e os acidentes arrematam o destino de multidões com a destruição e a morte. A natureza não fica atrás e contribui com sua parcela de calamidade – os terremotos, as enchentes, os vendavais, a seca, incêndios de reservas ecológicas e devastação de florestas, como acontece agora com a Amazônia. Às vezes temos a impressão que o Brasil comete suicídio ambiental.
Seja em qualquer país ou no Brasil, marginais e policiais cometem crimes hediondos e fornecem material que ocupa as páginas da mídia, nos jornais, na tevê, nas redes sociais e nas telas da Internet. Tudo vira imagem que destaca o sacrifício de inocentes e cujo efeito é, invariavelmente, a lágrima.
Orlando Brito