No cobertura da chamada seara do poder na capital do Brasil um fotojornalista encontra de tudo durante o rolar do cotidiano. Fica diante de personagens de alta importância e de outros de nenhuma relevância. Se depara com situações e cenas que vão, muitas vezes, determinar ou indicar o futuro do país. Raros, na verdade, são os momentos de bom humor e, digamos, descontração. Ainda mais em tempos de crises, como agora. Nada, porém, passa incólume sem a sua percepção. Nada, ou pouca coisa.
Nem tudo é propriamente notícia de alta ou relativa dimensão. Na semana em que vimos em Brasília um colecionador de serpentes com alto teor de veneno criadas em cativeiro, lembrei-me de ter fotografado uma despretensiosa cena com um “personagem” que circula nas cercanias do Palácio da Alvorada, residência ofical do presidente da República: o cãozinho Alvorino.
Me refiro ao Alvorino, que não tem raça definida. É o típico cachorro vira-latas, sem pedigree. Não late, não morde e não investe contra ninguém. É dócil, enfim. Mas é, como se diz, “marrento”, apesar de não agressivo. Jamais aceita aproximação, tipo tomá-lo nos braços para afagos, algo assim. Também não obedece a nenhuma ordem. De ninguém. Há sempre alguém querendo lhe dar comida. Aceita, é claro, desde que em troca não ameace sua liberdade de ir e vir. De água, vemos sempre, serve-se do laguinho em frente ao gramado palaciano.
Não se sabe a idade de Alvorino. Por seu tamanho, calcula-se que não tenha mais que um ano. Também é desconhecida sua origem. De onde vem, quem tenha sido seu eventual dono. É sujo. Amigável, mas arredio. Segue os soldados que ali montam guarda, os turistas que por lá aparecem e se mete no meio dos jornalsitas de plantão. Por um tempo, depois toma outro caminho. Presta atenção nas cerimônias de subida e descerramento da bandeira nacional, às oito da manhã e às seis da tarde.
Na semana passada, Alvorino foi motivo de pequena altercação. E com a participação do pessoal que faz a segurança palaciana. Duas jovens, talvez veterinárias, que sempre fazem caminhada por aquelas cercanias, resolveram capturá-lo para um banho, dar-lhe melhor aspecto, talvez adotá-lo, ou quem sabe levá-lo para um canil, algo assim. Ao perceber a intenção das benfeitoras, o cãozinho saiu em desabalada carreira. O que iria ser uma ação de “humanidade”, terminou em discussão com os agentes, preocupados com a ordem pacífica do local. O cão deve ter entendido que corria o risco de ter uma coleira no pescoço e se mandou. Evadiu-se. Virar peça de petshop, jamais.
E porque Alvorino ganhou esse nome? Sua contumaz presença obviamente chamou a atenção de todos que alí vão por alguma razão. No afã de atraí-lo, um dos colegas fotógrafos que lá estamos diariamente aguardando o momento de uma imagem de autoridades que entram e saem do palácio, tentou fazê-lo chamando-o primeiramente de Lulu, Leão, Camarada, Gigante, Solitário, Gente Fina… Ficou indiferente a todos. Então, desiludido, mandou Alvorino. E não é que o cachorrinho atendeu? Pronto. Ficou batizado como Alvorino.
O vira-latas Alvorino não tem a ver com o Zeus, o cão de raça pastor-maremano que após ser adotado pela primeira-dama ao vê-lo vagando na vizinhança do Alvorada quando fazia sua pedalada matinal, ganhou nova residência e nome: Augusto. Até que o verdadeiro dono foi resgatá-lo ao vê-lo nas páginas do Twitter.