“Defrontei-me com o caso de um respeitável senhor, professor universitário, que nutria havia muitos anos o desejo natural de ser o sucessor do mestre que o iniciara nos estudos. Quando esse professor mais antigo se aposentou e os colegas informaram ao pretendente que ele fora escolhido para substituí-lo, começou a hesitar, depreciou seus méritos, declarou-se indigno de preencher o cargo para o qual fora designado, e caiu numa melancolia que o deixou incapaz de toda e qualquer atividade durante vários anos.”
O trecho acima é de um texto de Sigmund Freud cujo título pode ser traduzido como “Os que fracassam ao triunfar”, ou “Os arruinados pelo êxito”. Tanto faz.
O fato é que, hoje, essa expressão traduz um problema quase psicanalítico do brasileiro: sofremos de pânico com o sucesso.
Nos últimos tempos, fizemos tudo para fracassar. Mesmo sabendo que temos tudo para dar certo.
Em 2009, eu almoçava com a minha mulher num restaurante frequentado pelo poeta Fernando Pessoa em Lisboa, o Martinho da Arcada, quando o Brasil foi escolhido sede dos Jogos Olímpicos de 2016.
O mundo mal saía da crise iniciada em 2008 que o Brasil passara ao largo, com políticas anticíclicas, bolsas famílias, etc… Um nível de crescimento melhor até do que se esperava dos novos protagonistas do mundo moderno, os BRICS — Brasil, Russia, Índia, China e África do Sul.
Lembro dos festejos do garçom português e do dono do restaurante, somente pelo fato de serem nossos primos-irmãos. Lembro da minha comemoração e, sobretudo, da esperança. Enfim o Brasil começara a triunfar.
Mas que nada.
Pouco antes da Copa do Mundo de 2014 — cuja sede também havíamos conquistado nos tempos da esperança –, as ruas foram tomadas em 2013. Uma justa reivindicação em torno das passagens de ônibus nos centros urbanos virou crise nacional misturada com protestos contra os gastos da Copa do Mundo.
E o noticiário tratou de incrementar a crise, apontando o fracasso que seria a organização da Copa: trânsito, violência, estádios por terminar…
No final das contas, a organização da Copa do Mundo no Brasil foi um sucesso. O único fracasso que tivemos foi onde menos esperávamos: 7 a 1 da Alemanha contra a Seleção Canarinho.
Mas o fato é que fracassamos ao triunfar…
Agora chegamos às Olimpíadas.
Passamos os anos de 2015 e 2016 com o país em crise: Eduardo Cunha aceitou a abertura de processo de impeachment contra uma presidente da República acuada e o país parou. Estamos há mais de um ano parados, sem saída, esperando que o novo governo de Michel Temer, ou seu sucessor, ou uma nova eleição deem uma solução para a crise.
Caiu doente o governador do Estado do Rio de Janeiro e o prefeito da capital, onde se realizarão as Olimpíadas, não se entende com o governador interino. Os jogos vão começar em meio a declarações dos dirigentes estaduais, municipais e federais que parecem ter enlouquecido — falando de cangurus e de quanto a cidade é perigosa, dos riscos de ação terroristas, enfim, de tudo de mal.
Mas, caro leitor, você pode estar certo: os Jogos Olímpicos do Rio provavelmente repetirão o sucesso da Copa do Mundo.
Mesmo assim, mais uma vez, estamos nos preparando para fracassar ao triunfar. Suspeito, sinceramente, que o brasileiro sofre de um problema psicanalítico.