A primeira Constituição brasileira, outorgada em 25/3/1824 por D. Pedro Primeiro, trazia o artigo 99, cujo texto definia a natureza do regime. Prescrevia o dispositivo: “A pessoa do Imperador é inviolável, e sagrada; ele não está sujeito a responsabilidade alguma”,
Com a proclamação da República a irresponsabilidade cedeu lugar à responsabilidade. A Constituição de 24/2/1891 continha o artigo 54, onde estavam definidos os crimes de responsabilidade do presidente da República, entre os quais o inciso 6º, que tratava do atentado contra “A probidade da administração”. A Carta Constitucional de 10/11/1937, redigida por Francisco Campos e outorgada por Getúlio Vargas, previu a responsabilidade do ditador por crime praticado contra “a probidade administrativa e a guarda e emprego dos dinheiros públicos” (Art. 85, letra d).
Segundo o artigo 84 da Constituição de 1988, “Compete privativamente ao presidente da República: I – nomear e exonerar os Ministros de Estado”, cujas competências se encontram definidas artigo 87. Presume-se que, para composição do ministério o presidente observa os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (Art. 37). Pode errar. Não é, porém, o que de ordinário acontece.
As atividades políticas não se deixam guiar por rígidos princípios de hierarquia e disciplina, indispensáveis nos quartéis e na guerra. A sociedade civil funciona sob o domínio da razão e do consenso. Para “exercer a orientação, coordenação e supervisão dos órgãos e entidades da administração federal na área de sua competência”, o Ministro de Estado deve ser dotado de bons conhecimentos na esfera de atuação. Cabe-lhe, nesse sentido, orientar o presidente da República, quase sempre especialista em generalidades.
O presidente Jair Bolsonaro é capitão de infantaria, paraquedista, professor de educação física. Foi deputado federal. Ser parlamentar não exige especialização. Além de deputado federal o Ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta é médico, e está cercado de consultores especialistas em saúde e medicina. Não pode ser acusado de errar. Tem feito mais do que está ao seu alcance.
Há falta de máscaras, de leitos, de equipamentos mecânicos de respiração. A culpa lhe não cabe, mas a governos anteriores que se descuidaram da área da saúde. Neste aspecto o Distrito Federal é uma das unidades da Federação mais carentes. O entorno se caracteriza pela existência de comunidades como a Sol Nascente, afamada pela pobreza extrema dos moradores.
A pandemia do coronavírus atinge a humanidade. À falta de vacina e de medicamentos específicos todos os países, a partir da China, adotaram enérgicas medidas de isolamento social, aceitas com tranquilidade pela população. Ignoro manifestações em sentido contrário.
O presidente Jair Bolsonaro pode demitir o Ministro Mandetta? Pelas razões conhecidas, não. Praticaria ato contrário à “probidade na administração” (Art. 85, V). Nomear e exonerar são prerrogativas presidenciais. Não, porém, de caráter absoluto. Irresponsável era o Imperador D. Pedro Primeiro, forçado a abdicar em nome dos interesses da Nação. O mesmo sucedeu com Fernando Collor, Renunciou, mas não impediu a deposição. Há poucos anos tivemos o impeachment de Dilma Roussef.
O Brasil não suportará nova crise política. O presidente Jair Bolsonar deve se orientar pela prudência e ignorar aqueles que o aconselham a ser arbitrário. Ao invés da exoneração, assegure ao Ministro Luiz Henrique Mandetta os recursos de que necessita. O Brasil lhe agradecerá.
— Almir Pazzianotto Pinto: Advogado, ex-ministro do Trabalho e do Tribunal Superior do Trabalho