Jair Bolsonaro parece ter percebido que entrou numa fria, e agora tenta sair de fininho das manifestações convocadas por movimentos de direita para domingo. Alguém levou ao presidente o raciocínio repetido nos gabinetes do Congresso: a convocação para o povo ir às ruas no dia 26 em apoio ao governo e seus projetos, e contra o Congresso e o STF, é um jogo de perde-perde para o Planalto. Se for um fracasso e aparecerem poucas pessoas nas ruas, enfraquece ainda mais o governo; se for um sucesso, provocará reação implacável e imprevisível dos outros poderes contra o Executivo.
Pena que Bolsonaro tenha demorado um pouco para perceber isso. Ele foi longe demais, dedicando os últimos dias a atos de provocação pura com o Legislativo, acirrando os ânimos com a propagação de texto considerando o Brasil “ingovernável” por causa do Centrão e afirmando em discursos que o problema do país é sua classe política.
Fiel a seu estilo vai-e-vem, foi alertado e recuou nas ofensas ao Congresso, que, diante do cenário esquisito, tratou de botar em pauta as medidas provisórias que relutava em votar. Nesse mini-acordo de paz, Bolsonaro ensaiou elogios a seus dirigentes e aproveitou a reunião ministerial da manhã de terça-feira para orientar seus ministro a não comparecerem aos protestos de domingo – determinação repetida depois pelo porta-voz da Presidência. Foi avisado inclusive que o próprio presidente decidiu não ir mais à manifestação – como se, em algum momento, alguém tivesse dito que ele iria.
Desde o início, havia sérias dúvidas na própria base bolsonarista em relação a essa iniciativa. Estrelas de seu próprio partido, o PSL, como Joice Hasselman e Janaína Paschoal, já haviam se colocado contra a convocação, assim como integrantes do MBL e de outras organizações de direita especializadas em mobilizar coxinhas para ir às ruas. Mas, dentro da desorganização que caracteriza essas forças, a mobilização continuava sendo feita nas profundezas das redes sociais ativadas pelos bolsominions.
A quatro dias do protesto, pode ser tarde demais para Bolsonaro se livrar do abacaxi. O movimento poderá ser esvaziado, com pouca gente nas ruas, sem chegar aos pés das manifestações dos estudantes da semana passada – o que, por si só, já provocará um contraste desfavorável às forças da direita governista. Mas, a não ser que o próprio Bolsonaro e seus filhos digam explicitamente que não é para ninguém sair de casa – o que, a esta altura, seria um vexame e uma desfeita para seus seguidores – as manifestações do domingão vão ocorrer.
Quatro dias depois, no dia 30, está programado um novo protesto com sinal contrário, convocado pelos movimentos de esquerda de estudantes, centrais sindicais e outras categorias. E se tiver o impacto do último, que em 15 de maio levou muita gente às ruas, em todo o Brasil? A situação já anda desconfortável para Bolsonaro, mas pode ficar muito pior.