“2,5 milhões de anos em 5 dias – Onde caçar sua própria comida”.
Manchete do tabloide carioca Meia Hora.
Michel Temer só precisou de dois anos para ser chamado de quase tudo. Vampiro (“Olha a Tuiuti Aí, Gente!”), biruta de aeroporto, e, agora, comporta-se como um boneco de posto. Aponta em todas as direções, e, ao mesmo tempo, nenhuma. Não que Temer precisasse de um apagão nos estertores de seu governo tampão, como o que paralisa agora o país, no sexto dia de greve dos caminhoneiros, com mais de 600 pontos de bloqueio – ruas vazias, desabastecimento, desalento dos cidadãos. Seu governo é um apagão do início ao fim. Um apagão da democracia, com a deposição de Dilma Rousseff pelo Congresso comandado pelo hoje detento e delator mudo Eduardo Cunha, o autor do best seller nunca escrito. Um apagão ético completo, dos três poderes. Com Supremo, com tudo, com delações cirúrgicas, tornozeleiras de camurça e habeas corpus rotativos. Até onde havia alguma luz, fez-se trevas.
A PF dos vazamentos seletivos e o MP do powerpoint aliaram-se ao Supremo de Carminha para apagar as premissas legais mais simples, o direito de ampla defesa, a presunção da inocência, a proibição da prisão até o trânsito em julgado, com o STF transformado num ringue televisionado ao vivo e o Ministério Púbico de Salém criando sua versão do Malleus Maleficarum, o guia para a inquisição petista. Com Lula preso, e revolução alguma nas ruas, num black out popular decepcionante, apagou-se o processo eleitoral. O Ficha Suja virou o Ficha Lula. O fósforo queimado Eduardo Azeredo não trouxe equidade a uma Justiça equina, como nos melhores torneios de hipismo. Cavalo dado não se olha os dentes.
Veio o apagão do emprego e das leis trabalhistas. O apagão do pré-sal e das estatais que estivessem na frente do nariz dos tecnocratas, e o clarão das leis de mercado trouxe o país ao nirvana do subemprego, do rebaixamento salarial, da evaporação da nova classe média e do empobrecimento das demais, da perda do poder de compra, da inflação escamoteada, das dívidas impagáveis, dos juros básicos que os bancos privados ignoram. Se a economia teimava em apagar, a indústria em não crescer, o comércio em não vender, era só culpar a herança maldita do PT, mesmo depois de dois anos – em 20? – de um inédito emedebismo tucano. Queimadas as carteiras de trabalho, o mercado virou um isqueiro sem carga. E queime-se Henrique Meirelles, o candidato fake, na fogueira das vaidades, em meio a um economia ainda estagnada, e mantenha-se o farol sobre o prodígio Pedro Parente, e a futura aliança com os tucanaros de Alckmim. Mas Temer ainda tinha, além do apagão democrático, moral, de políticas sociais, de segurança pública, o apagão dos apagões, a mãe de todos os apagões, deixando no chinelo apagões hídricos e elétricos que exterminaram outros governos.
E, pronto, em maio de 2018, chegamos ao ponto: o preço em disparada nas bombas, volátil como o próprio combustível fóssil. Como resistir a um apelo desses? Era só preciso um grupo empresarial que dissesse: chega. O apagão de comando, de pulso, de moral encarnado na greve-locaute dos caminheiros, inflados pelos donos de cargas e comandantes em chefe das boleias. A volta do Brasil ao tempo das cavernas, o desabastecimento amplo, geral e irrestrito – ainda que por alguns dias -, será o grande legado de Temer. Quem pegou fila não esquecerá. A Venezuela não é aqui, não adianta agora ir pra Cuba, este é o Brasil de Temer. Que sem voto, sem poder, sem comando, rodeado de um séquito de indiciados pendurados no foro privilegiado, a começar pelo próprio, chama, irresponsavelmente, de novo, urutus e tanques, os que não deram certo nas favelas do Rio, mas que quem sabe com seu treinamento de guerra, conseguem afugentar 700 mil caminhoneiros, massa de manobra de seus patrões.
Nosso Alamo, embora aqui não seja o Texas, nossa Volta Redonda, nas muitas CSNs espalhadas pelas estradas brasileiras. Em um país sem memória, que aceita Temer como presidente e Bolsonaro como candidato, porque não apostar num confronto entre caminhoneiros e soldados, afinal, de todos os apagões, o pior vive o terceiro andar do Palácio do Planalto, onde mal se consegue acertar num slogan de governo, imagine saber acabar, pacificamente, com uma greve.