Hoje o Chile viveu sua festa da democracia. A socialista Michelle Bachelet deu posse a seu sucessor, o bilionário Sebastián Piñera, ex-presidente conservador e representante da coalização de centro-direita “Vamos Chile”. Ele venceu o segundo turno das eleições contra o adversário de centro-esquerda Alejandro Guillier. Michel Temer foi lá, dizem. Não levará de volta a grande lição que deveria. De respeito à democracia. Ao resultado das urnas. Aécio Neves não foi. Também não adiantaria. Bachelet, que já havia passado a faixa presidencial a Piñera, e seu grupo político, perderam o poder, mas não a pose, a fleuma, a capacidade de absorver uma derrota pelo bem maior da democracia. Diferentemente de Temer. E Aécio.
Temer, investigado pelo Supremo Tribunal Federal, passou o fim de semana dando demonstrações de agilidade, apesar do estômago proeminante. Fez um passeio de bicicleta fake ao lado da mulher, Marcela, e depois deu uma corridinha, sem colocar na agenda, até a casa da ministra Cármen Lúcia. Presidente do Supremo. O Planalto tentou emplacar uma piada. O encontro teria servido para discutir assuntos relacionados à segurança pública. É evidente que foi coincidência ele ocorrer alguns dias depois de o ministro Luís Roberto Barroso determinar a quebra de sigilo bancário de Temer no chamado inquérito dos portos. E de Edson Fachin determinar a inclusão de Temer no rol de investigados no inquérito que investiga o suposto recebimento de recursos ilícitos repassados pela Odebrecht. Os jornais chamaram o tête-à-tête Temer-Cármen de “ofensiva jurídica”. O jornalista Xico Sá deu um nome mais apropriado: “putaria institucional”.
Como vergonha na cara é uma mercadoria em falta na Esplanada, depois de Marun e Padilha, foi a vez do próprio ministro da Justiça defender nada menos que a blindagem de Temer. Torquato Jardim panfletou, na Folha de S.Paulo, a tese de que o presidente não pode ter seu sigilo bancário quebrado, em razão do cargo que ocupa. “Tratamento diferenciado” foi a expressão usada por Torquato. Isso porque, logo após a decisão de Barroso, Temer havia jurado tornar públicos seus extratos bancários. Até parece.
Já Aécio, outro que não soube perder nas urnas, e que agora foi alijado pelo PSDB da disputa interna pela candidatura presidencial, anda até com dificuldades de sair ao Senado por seu partido. Um ano depois de ser gravado pelo empresário Joesley Batista, do Grupo J&F, pedindo R$ 2 milhões para pagar advogados, e de ser denunciado no Supremo por corrupção passiva e obstrução da Justiça, o senador começou a entender que dificilmente renovará seu mandato por mais oito anos. Nem Márcio Lacerda (PSB) e Rodrigo Pacheco (MDB), possíveis candidatos, o apoiariam, nem seu partido confia em sua performance. Há quem o aconselhe e sair pra deputado federal mesmo, afinal, nesse país, imunidade é uma virtude.