O mundo político aproveitou o “julgamento do ano” para se manifestar – e ganhar um espaçozinho na mídia. Nada melhor do que ir no vácuo do fato mais comentado do momento, ainda que seja na carona do candidato favorito nas pesquisas eleitorais. Michel Temer, que já inflou mil balões de ensaio colocando-se como potencial candidato à sua própria sucessão (correção histórica, sucessão da presidente eleita Dilma Rousseff), percebeu que ninguém o enxergará na Suíça, onde pousou para participar como coadjuvante do Fórum Econômico Mundial de Davos, e decidiu projetar seu holograma sobre Porto Alegre com uma declaração acalma-mercado. Segundo Temer – licença poética minha -, um país que julga seu maior ídolo político é um país onde as instituições funcionam. “Dá tranquilidade para quem quiser investir no país”, dissertou Temer, como se não estivesse secando Lula. Temer vai discursar nesta quarta, 24, no paraíso fiscal, enquanto Lula é julgado. Apostas em que será manchete?
O candidato paralelo do governo, Henrique Meirelles, na mesma comitiva, filosofou sobre o óbvio: Lula lidera pesquisa porque há boas lembranças de seu governo. “A inflação estava sob controle e houve criação de empregos, especialmente nos primeiros anos do governo. Eu sei muito bem porque estava no Banco Central”, ressaltou Meirelles. Se falasse mais meia hora, seria convidado por Lula, de novo, para o BC. Modesto, porém, disse que investidores – essa figura poderosa e etérea – pedem “o tempo todo e sem parar” que se candidate à Presidência. Não há espírito cívico que resista.
O governador tucano de São Paulo, Geraldo Alckmin, a quem foram dados microfones e holofotes durante a inauguração de um trecho do metrô – em meio a protestos do Movimento Passe Livre, o MPL -, afirmou o que nenhuma pesquisa mostra, nem em sonho: derrotará o ex-presidente e qualquer outro candidato petista na disputa presidencial de outubro. Tucanos e metrô têm sido um assunto tenso, já que são investigados por cartel nas obras do extenso tatu paulistano. Presidente nacional do PSDB, Alckmin se apresenta como pré-candidato à Presidência – ainda que a definição da sigla só saia, efetivamente, nas prévias do partido agendadas para março, que disputará com o franco-atirador Arthur Virgílio, prefeito de Manaus.
Enquanto isso, onde realmente interessa, o “esquenta” começou. Diante de milhares de manifestantes – não vamos entrar no mérito da quantidade, cheque suas fontes mais confiáveis, mas tinha muita gente – , Lula discursou no centro sitiado de Porto Alegre, na chamada Esquina Democrática, cruzamento entre a Avenida Borges de Medeiros e a Rua dos Andradas. Em 35 minutos de discurso, atacou o governo Temer e disse, em tom desafiador, que “não existe nenhum magistrado no país mais honesto do que ele”. Lula também reconheceu que o PT cometeu “erros”, mas, segundo ele, foram menores do que os dos adversários. “Só uma coisa vai me tirar de continuar fazer o que estou fazendo: é o dia que eu morrer.”
Além da ex-presidente Dilma Rousseff, estavam lá dois pré-candidatos presidenciais de esquerda, Manuela D’Ávila, pelo PCdoB, e o líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), Guilherme Boulos, que pode sair pelo Psol. O julgamento do recurso apresentado pelo ex-presidente no processo do triplex em Guarujá será realizado a partir das 8h30 na sede do TRF-4, em Porto Alegre.