Enterro de criança recém-nascida. Cidade de Aprazível. Ceará, 1996.
“Diante da Dor dos Outros” é um livro essencial para aqueles que, por alguma circunstância, se depara com o sofrimento alheio. Tocante, cruel. Isto acontece o tempo todo com um fotógrafo de notícias, por exemplo, que está no “front” de todo tipo de acontecimento, o meu caso.
E é justamente isto que a autora de “Diante da dor dos outros“, a escritora Susan Sontag, falecida em 2004, aborda com maestria um tema pouco comum: o que sente um fotógrafo ao retratar a amargura e aflição de um indivíduo vitimado por uma tragédia, um acidente, a morte de um ente querido.
Tem razão a ensaísta norte-americana. Quantas vezes eu próprio tive de demonstrar frieza para, cara a cara com a desgraça, ficar indiferente a ela. Indiferença não, aparente distância. Numa hora você está retratando a placidez de uma cerimônia num palácio. Dez minutos depois, está na muvuca de um protesto, entre o gás de pimenta da polícia e o grito dos manifestantes. Noutro momento, está no interiorzão, com a câmara captando a dureza da vida real.
Essa foto aí, que fiz durante uma viagem pelo interior do Nordeste, é uma amostra dessa situação. O pai, seguido pela mulher e dois filhos, leva nos braços caixão do caçula morto para o cemitério.
E pensar que, por três vezes, fotografei o exato momento da morte de quatro pessoas. A primeira, o atropelamento de um menino durante uma corrida de automóveis, em Goiânia. Depois, de dois soldados num exercício militar, no Rio Grande do Sul. E, por último, de um deputado no plenário da Câmara, quando este perdeu a vida com enfarte fulminante.
Triste, muito triste. Pesado. Uma dor intransferível.
Mas, em minha profissão, com a câmara pendurada no pescoço, não há como deixar de registrar a dura realidade, por mais chocante e desagradável que seja.
Orlando Brito