A Revolta de Canudos é a mais sangrenta página da história do Brasil. Entre novembro de 1896 e outubro de 1897, portanto nos fins do século dezenove, o beato Antônio Conselheiro arrebanhou uma multidão de miseráveis que o seguiram pelo sertão do Nordeste ouvindo suas pregações contra a República, novo sistema de governo recém instalado no país. Foram necessárias quatro expedições do Exército para sufocar de vez o movimento liderado pelo peregrino nascido no Ceará.
Talvez a Guerra do Paraguai tenha resultado em tantas mortes, anos ano. Há controvérsias sobre o número preciso de mortos, mas estima-se que ao final dos combates em torno de 40 mil soldados e conselheiristas perderam a vida. João Botão foi um dos raríssimos sobreviventes. À época era ainda um menino e viu de perto o sofrimento daquela guerra tão bem contada em detalhes por Euclides da Cunha em “Os Sertões”, um dos livros mais sensacionais da literatura brasileira.
Como foi – Quem quiser conhecer o Brasil profundamente não pode deixar de ir a Canudos. De uns anos para cá, a cidadezinha passou a receber visitantes de todos os interesses. São estudantes, pesquisadores, historiadores, fotógrafos. Eu sou um deles. Devo ter ido umas quinze vezes. Também, com um cenário daqueles e os personagens que a gente encontra, impossível não estar sempre por lá. Os amigos Evandro Teixeira e Antônio Olavo fazem a mesma coisa. Ambos, aliás, publicaram magistrais livros sobre o tema. Bons, muito bons.
Na verdade, quando digo Canudos, me refiro a toda região onde a seca pega pesado no Norte da Bahia, cenário dos combates entre os seguidores de Antônio Conselheiro e as tropas do Exército. Vou a Bendegó, Uauá, Crisópolis, Monte Santo, Euclides da Cunha, Quijingue, Massacará etc.
Essa foto aí, do João Botão, é parte do que colhi durante uma viagem com Roberto Pompeu de Toledo para uma matéria de Veja, em 1997. João Botão morreu pouco depois de completar cento e três anos. Morava em uma pequena casa de varas cobertas por barro, ao lado de uma igrejinha que construíra para rezar pelos pais e irmãos que morreram no conflito.
Não se encontra mais homem ou mulher que tenha vivido na época do Conselheiro, mas há filhos e netos deles que sempre têm histórias para contar e muitos lugares para mostrar, como o lago Cocorobó, que serve de sepulcro para mais de trinta mil conselheiristas e soldados.
Orlando Brito