O agronegócio brasileiro é pujante, moderno e, sem dúvida, o setor com maior vantagem competitiva no País atualmente. Durante a pandemia foi o único ramo da economia a crescer e a garantir um pouco de alívio na balança comercial brasileira.
Nem sempre foi assim. Até o início dos anos 70, o Brasil era importador de alimentos. A criação da Embrapa e os investimentos em pesquisa e inovação mudaram esse cenário. Hoje, somos um dos maiores players do mundo. Exportamos soja, milho, algodão, carnes, açúcar, café, frutas e mais uma penca de produtos provenientes do agro. Produzimos alimentos para bilhões de pessoas.
Não por acaso a Europa – que compra mais de U$ 13 bilhões ao Brasil e vende apenas U$ 1 bi em produtos agro-, vive procurando motivos para tentar impedir a entrada de grãos, frutas e carnes produzidos por nós. A questão ambiental tem sido usada como o principal argumento para criticar nossos produtores e criar empecilhos para o aumento das vendas.
A desastrosa gestão de Ricardo Sales à frente do Ministério do Meio ambiente forneceu muitos argumentos aos europeus. Tanto assim que o acordo União Europeia – Mercosul, assinado no final do governo Michel Temer, depois de anos de negociação, voltou à estaca zero.
Apesar de ter sido eleito com o apoio do agro, Bolsonaro tem atrapalhado muito mais do que auxiliado, como faz em tudo em que se mete. Além do desleixo com a questão ambiental, o governo resolveu inovar e arrumar mais um problema para o agronegócio, que pode custar muitos milhões de dólares ao País. Em uma postagem em homenagem ao dia do agricultor, comemorado nesta quarta-feira, a Secom escolheu a imagem de um caçador carregando um rifle nas costas para representar o agricultor brasileiro.
Ao ligar a imagem de agricultores a armas, violência e morte, no mínimo o próprio governo oferece aos concorrentes motivos para que o mundo civilizado imponha novas barreiras aos nossos produtos. Mais um tiro no pé.
A ministra Tereza Cristina passou o dia ouvindo queixas dos produtores indignados com o post do governo. Representantes das principais associações do setor reclamaram da total falta de conexão com a realidade. E avisaram que já avaliam apoiar outro nome à presidência no próximo ano.
A tosca “homenagem” só demonstra o despreparo da Secom no atual governo, que se preocupa apenas em atiçar a militância nas redes sociais e não pensa nas consequências. A comunicação institucional precisa ser séria, responsável e ter credibilidade, pois qualquer palavra mal colocada pode provocar implicações comerciais e até diplomáticas ao País.
A postagem repercutiu tão mal que a Secom a retirou do ar poucas horas depois. A imagem lembrou a de um jagunço e os agricultores sentiram-se mais ofendidos que homenageados pelo governo.
Tentando justificar o injustificável, a comunicação do governo fez uma lambança ainda maior. Escreveu um texto afirmando que a redução no número de invasões a imóveis rurais nos últimos dois anos deveu-se ao fato de o governo Bolsonaro ter conseguido aprovar no Congresso, ainda em 2019, um projeto permitindo que os proprietários circulem armados por todo perímetro do imóvel.
Além de uma falácia, a postagem revela a total ignorância dos próprios integrantes do governo, em especial da Secom. Houve sim uma redução no número de invasões de propriedades nos últimos anos, mas não por causa do uso de armas e, sim, por outros fatores que nada tem a ver com rifles e similares.
Primeiro é importante destacar que a redução do número de invasões começou ainda no governo Temer e não foi obra de Bolsonaro. Depois, esse fato se deve ao corte de verbas destinadas a movimentos sociais como o MST, responsáveis pelas invasões. Por último, um fato que pouca gente conhece, mas que mudou o regramento para a seleção de famílias que querem ingressar no Programa Nacional de Reforma Agrária. Essa alteração ocorreu a partir de uma decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) de 2016, com base em uma auditoria realizada nos assentamentos da reforma agrária no País entre 2012 e 2016.
O TCU criticou a forma como as famílias eram escolhidas para ter direito a um lote da reforma agrária. Antes da decisão do Tribunal, os movimentos sociais levavam listas com os nomes de quem deveria ser assentado nos lotes. Agora, a seleção das famílias para participar do Programa de Reforma Agrária é feita por meio de edital público, sem qualquer interferência de políticos ou movimentos sociais. São essas as medidas, aliadas a outros fatores, que reduziram o número de ocupações na zona rural. Esse é um avanço que até poderia ser comemorado.
No entanto, o governo incompetente, ao invés de afagar seus aliados na agricultura, resolve irritá-los com uma postagem completamente estúpida. Talvez faça isso por pensar que tudo se resume a armas e morte. E não pensar em alimento e vida.
Outro erro crasso.