Quando Dilma Rousseff assumiu o Palácio do Planalto, comemorou-se o fato até então inédito de uma mulher assumir o comando da República brasileira. Já em seu primeiro dia de governo, seus fãs e aliados passaram a dirigir-se a ela como como presidenta. Dupla novidade. Mas a segunda provocou discussão sobre a correção da grafia da palavra presidente, então modificada com a letra “a” substituindo o “e” do final.
As divergências saíram dos limites da descontração e tomaram as páginas da mídia. Ultrapassaram as barreiras da falta de importância e, de certa forma, até viraram questão ideológica: aqueles que se referem a Dilma como presidentA passaram a ser identificados como seus partidários. E os que a chamam de presidentE, contrários a ela.
Nessa quarta-feira a ministra Cármen Lúcia foi eleita para presidir o Supremo Tribunal Federal nos próximos dois anos. Assim como a engenheira Rousseff foi a primeira mulher a comandar o Poder Executivo, a magistrada Cármen será a segunda mulher a conduzir o Judiciário. Antes dela, somente a jurista Hellen Grace Northfleet esteve à frente da Suprema Corte. Ao fim da votação, o ministro Ricardo Lewandowski indagou-lhe, de forma bem humorada, se gostaria de ser chamada de presidente ou de presidenta. Ela então relembrou seus tempos de escolar para dar sua resposta:
– Eu fui estudante e eu sou amante da língua portuguesa. Acho que o cargo é de presidente, não?
Nascida em 1954, na cidade de Montes Claros, no Norte de Minas, a ministra Cármen Lúcia tem carreira irretocável. Respeitada pela justeza de suas decisões, proferiu vários votos memoráveis. Em um deles, relativo a um réu da Operação Lava Jato, disse: “Na história recente da nossa pátria, houve um momento em que a maioria de nós, brasileiros, acreditou no mote segundo o qual uma esperança tinha vencido o medo. Depois, nos deparamos com a Ação Penal 470 e descobrimos que o cinismo tinha vencido aquela esperança. Agora parece se constatar que o escárnio venceu o cinismo. O crime não vencerá a Justiça”.
Entre os maiores conhecedores do nosso idioma, os filólogos, há controvérsias sobre o devido uso do vocábulo “presidenta”. Uns acham que sim, outros que não. Há também aqueles que defendem a tese de que se trata de uma linguagem livre e moderna e que, portanto, não tem a importância que muita gente dá à controvérsia. Outros gramáticos defendem não ser problema usar a expressão, pois se trata de uma forma inerente à regra que determina os substantivos para dar ênfase ao gênero feminino.
Orlando Brito