Salles e Pazuello, dois ministros com cabeça a prêmio

Enquanto o vice-presidente Hamilton Mourão tem como tarefa imediata apagar o fogo da Amazônia, o Governo Federal pode perder dois colaboradores: Ricardo Salles, do Meio Ambiente, e Eduardo Pazuello, o interino da Saúde

O vice-presidente da República, Hamilton Mourão, tem o desafio de apagar o fogo de proporções amazônicas - Foto: Orlando Brito

O vice-presidente Hamilton Mourão está alisando o lombo para a saraivada de pancadas que vêm aí na esteira de queimadas e incêndios na Amazônia. Na condição de gestor do caos ecológico, o general terá de inverter sua visão do combate: oficial de artilharia, formado para saturar o inimigo e abrir caminho para infantes e cavalarianos, ele terá que abrir espaço, como um comandante guerrilheiro, atuando solitário num terreno totalmente ocupado pelo adversário. Esta metáfora guerreira é a propósito do imbróglio ambiental que bota nas cordas um governo substancialmente ocupado e gerido por militares. É um grande desafio.

Em meio a um tsunami de fake news (meias-verdades, as tecnicamente autênticas fake), o general terá de se haver com uma opinião pública hostil, sem canais para contradizer o noticiário. Muito menos conseguir algum apoio de aliados minimamente condescendentes fora dos quadros estritos da extrema direita política ou econômica, quais sejam: seguidores ideológicos do presidente da República ou os interessados nos negócios ligados às denúncias, os segmentos do agronegócio tidos como retrógrados.

As queimadas na Amazônia aumentaram em 2020 – Foto: Márcio Pimenta / Conexão Planeta

Sua missão, para ter êxito, teria de se descartar de tais aliados e procurar interlocutores que pudessem ouvir seus argumentos: o Brasil é um dos países com maiores e mais exitosos projetos e esforços de preservação das matas nativas, tem um retrospecto brilhante, com ações efetivas e uma legislação de fazer inveja a qualquer ambientalista europeu, e sua ocupação econômica da Amazônia Legal, tanto agrícola quanto de outras atividades (indústria e extrativismo), atendem acima da linha básica às recomendações da sustentabilidade. O ponto fora da curva é a atividade ilegal. Mas ninguém ouve uma só palavra neste sentido. Pelo contrário.

O general Mourão está nas cordas, como ele disse. O mato está pegando fogo e não há o que detenha as chamas nas savanas de cerrado ou capoeira. A floresta úmida, que é a Amazônia no imaginário dos ambientalistas estrangeiros e brasileiros urbanos, não pega fogo. Aquele mar verde é imune às labaredas.

Mas quem quer saber disso? Este é o problema do general de artilharia, estar num lugar que deveria ser de um especialista em comunicação, com credibilidade de formador de opinião entre profissionais da mídia nacional e internacional. Os jornalistas, ele deveria saber, repetem o que ouvem das fontes. O que sai da boca do presidente Jair Bolsonaro não ajuda a desdizer o dito por não dito.

Queimando pontes

O vice-presidente Hamilton Mourão com o ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles no Conselho da Amazônia – Foto: Orlando Brito

Diante disso tudo, usando a metáfora mais adequada, o vice-presidente está no mato sem cachorro. De um lado há uma realidade incontornável a curto prazo, e ele tem menos de um mês para reverter esse quadro negativo, que é o escândalo do fogo nas telas das tevês e telinhas dos celulares das redes sociais mundo afora.

De outro lado, o belicismo do presidente da República deixa Mourão sem recuo, pois já se queimou todas as pontes à retaguarda. Ao atacar indiscriminadamente as chamadas ONGs, o governo excluiu um possível apoio ou cooperação, pelo menos condescendente, de uma boa parte dessas entidades, no Brasil e mundo afora. Há muitas organizações não-governamentais de linhas moderadas, que não estão ligadas às militâncias estridentes que dominam a base das redações, formando a opinião dos ativistas, dando margem a tais campanhas. Estes estão sendo levados de roldão. Ninguém se atreve a dar o braço a torcer.

Entregando os anéis

O general Eduardo Pazuello, ministro interino da Saúde – Foto: Orlando Brito

Ainda na metáfora da batalha perdida, o governo vai entregando aos poucos os seus anéis. As cabeças a prêmio que se cuidem, tratando de não escorregar nas cascas de banana. E assim o presidente da República vai entregando de um a um, parcimoniosamente, seus desastrados ministros.

O primeiro a cair, depois de, como o técnico de futebol da anedota, ser “prestigiado”, foi o ministro da Educação, Abraham Weintraub. Agora temos dois na fila. Ricardo Salles, do Meio Ambiente, e Eduardo Pazuello, da Saúde.

Há apostas de qual dos dois será a primeira cabeça a rolar diante das multidões na praça. Salles tem sua boiada a levá-lo para o cadafalso; Pazuello, suas incômodas estrelas de general comichando no ombro, enquanto o novo coronavírus resiste. Bolsonaro entrega a conta-gotas.

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