Fevereiro, afinal

Saudades do Bola Preta - Foto Orlando Brito

Não há nuvens no firmamento, onde se equilibrará o Sol para seus malabares? O páramo está translúcido, límpido. Ainda é possível ver Nictheróy. Não com tanta nitidez como outrora, infelizmente, a poluição retornou. Cidade preguiçosa, desperta… talvez ainda não, “só mais dez minutos…”, afinal é o primeiro dia do mês de fevereiro e logo numa segunda-feira! Ou seja; o suprassumo da pasmaceira, ainda mais fazendo 39° a sombra, é um convite à mandriice. Mas, espera aí, fevereiro tem Carnaval, tem Carnaval?

Carnaval de 1952 – Foto Jean Manzon/Acervo IMS

Pois é; esse ano não vai ser igual aquele que passou, não mesmo. Ninguém brincará. Sem ponto facultativo, sem blocos na rua, sem botar ‘pra’ gemer, sem avenida colorida, sem minha Portela para sentir meu coração apressado. Não tem Olinda, Circuito Barra-Ondina nem Campo Grande. O Pelourinho estará mudo. Largo do Batata, só se for cozida ou frita. Bloco das Piranhas, Boitatá, Bola Preta. As ruas e avenidas estarão vazias. Também não vai ter viagem, semana prolongada em esquema sanduíche emendado com as férias. Nadica de nada, este Carnaval é virtual. Não tem Sovaco, nem a Banda de Ipanema, não tem Imprensa que eu Gamo nem ExaltaRei, esse ano está para refrão de música chiclete: “…nada, nada, nada…”.

Lirismo onírico na Sapucaí – Foto Orlando Brito

Esqueça a máscara negra que envolveu o rosto da amada, cravejada de paetês, miçangas e lantejoulas, também não terá o beijo. A máscara é de proteção, pode até ser preta, para os mais criativos, poderá ser ricamente ornada, joias resplandecentes da Rainha de Sabá, como narraria Hilton Gomes na transmissão do desfile de fantasias do Hotel Glória, com presenças marcantes e hors concours dos eternos Evandro de Castro Lima, Clóvis Bornay, Mauro Rosas, Marlene Paiva, Nelcimar Pires e Wilza Carla.

Bailinho para a molecada? Pode esquecer. Aquele famoso lá da pracinha bucólica do Jardim Botânico capitaneado pela cantora Bárbara Lau? Nanãninãnão! Este ano será no YouTube. Você chama a garotada para a sala, liga a TV, conecta com o sibercanal e a petizada faz a festa, não requer prática nem tampouco habilidade, qualquer criança brinca e se diverte. ‘Tá’ bom, você tem razão de fugir assim, confete e purpurina é bem difícil de retirar do piso. Carpete? Vais ter que trocar.

A Bandinha de Ipanema

As fantasias compradas, ano passado na 25 de Março ou na Alfândega – e a Casa Turuna nem existe mais -, ficarão limitadas às travessuras do armário-embutido, pedindo bandeira branca para 2022.

Tons azulados-escuros, em lilás, avermelhados, alaranjados, doirados, e, por fim, amarelados-gema-de-ovo invadem o famoso “lindo céu azul-de-anil” do “…Rio dos sambas e batucadas/Dos malandros e mulatas/De requebros febris…” nos versos do poeta Silas de Oliveira. Estão lá e lá ficarão com os batuques e as batidas nos tamborins. O Astro-Rei marca presença!

Assim como o surdo de marcação, somente ele, uníssono, melancólico, diáfano, maltrapilho e maltratado pelos homens sem-razão! O que resta? Acreditar que amanhã será um novo dia!

‘Tô’ me guardando ‘pra’ quando o Carnaval, de 2022, chegar ‘pra’ botar meu bloco na rua…

Evoé Momo!

— Carlos Monteiro é jornalista

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