Decotelli pode ser ministro da Educação?

A posse de um diploma de doutorado ou pós-doutorado não é impeditivo para assumir o cargo de ministro da Educação. Mas o que dizer de quem diz que tem o que, na verdade, não tem?

Jair Bolsonaro com Carlos Decotelli, indicado para o cargo de ministro da Educação, cuja posse foi adiada

Ser doutor não é requisito para virar ministro da Educação. Mas quem diz que é, sem ser, pode ocupar o cargo?

O ministro Carlos Alberto Decotelli da Silva foi nomeado, na última quinta-feira (25), com um vasto currículo que incluía o título de doutor em administração pela Universidade Nacional de Rosário, na Argentina. No dia seguinte, veio a notícia de que não era bem isso.

Desmentido publicamente pelo reitor da universidade argentina, o que fez Decotelli? Divulgou que havia concluído os créditos (disciplinas) do doutorado, entre 2007 e 2009. Em outras palavras, que assistira às aulas, que entregara os trabalhos solicitados pelos professores e que fora aprovado − nas disciplinas.

Foi preciso que o reitor Franco Bartolacci revelasse que a tese de Decotelli havia sido reprovada, numa etapa preliminar à banca de avaliação, para que o ministro confirmasse a história, em nota divulgada pelo Ministério da Educação (MEC).

Ficamos sabendo, então, que o novo ministro foi aluno de um curso de doutorado durante um ano e quatro meses, que teve sua tese reprovada antes mesmo de ser defendida e que não viu problema em incluir um título inexistente no seu currículo Lattes − a plataforma do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) que registra as atividades de professores e pesquisadores.

O ex-ministro da Educação, Abraham Weintraub, o presidente Jair Bolsonaro e pretendente ao cargo máximo no MEC, Carlos Decotelli

Como se sabe, a tese é o cerne de qualquer doutorado. O doutorando deve trilhar o caminho da construção do conhecimento, com o apoio de um orientador que já passou por isso. Ao completar o processo − e aí, sim, conquistar o título −, o novo doutor deverá ter demonstrado a capacidade de produzir ciência. É assim que funciona para os milhares de matriculados nos programas de pós-graduação das universidades brasileiras, sob a supervisão do MEC.

A notícia sobre o doutorado incompleto do ministro abriu caminho para novas denúncias sobre sua vida acadêmica. No último sábado, um professor levantou a hipótese de plágio em sua dissertação de mestrado na Fundação Getúlio Vargas (FGV). Em nota, o ministro negou dolo, afirmou que vai revisar a dissertação e que eventuais omissões, se existentes, decorreriam de falhas técnicas ou metodológicas. A FGV anunciou que investigará o caso.

Nesta segunda-feira (29), a imprensa noticia que a Bergische Universitat Wuppertal, na Alemanha, negou que Decotelli tenha cursado um pós-doutorado naquela instituição − outro título no currículo do ministro.

No ano passado, Decotelli foi anunciado como doutor e pós-doutor, ao tomar posse como presidente do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), o braço financeiro do MEC. De um ministro da Educação ou de um presidente do FNDE, não se exige que tenha doutorado, menos ainda pós-doutorado. Mas se espera que o que diz sobre sua formação acadêmica seja verdadeiro. Ou não?

* Demétrio Weber é jornalista, mestre em Direitos Humanos, Cidadania e Violência e criador do blog Educa 2022

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