As cartas do Visconde

O vice-presidente da República, Hamilton Mourão - Foto Orlando Brito

“O Brasil não é para principiantes”. A observação clássica de Tom Jobim deveria ter sido considerada pelo presidente Bolsonaro, antes de transformar seu governo numa máquina contínua de crises, desestabilização, má-gestão e espetáculos sugestivos de uma contínua e ininterrupta escalada autoritária.

Já em janeiro de 2019, dias depois da sua posse, Bolsonaro vê-se diante das denúncias sobre as “rachadinhas” do Queiroz – de novo na ribalta — e o envolvimento de seu filho, o senador Flavio Bolsonaro, em negócios nada republicanos quando deputado estadual no Rio de Janeiro. Talvez, não só por isso, mas também por isso, o presidente tenha perdido os meios e os modos, partindo para uma crescente escalada autoritária.

Desde então, os desencontros e destrambelhos acentuaram-se numa dimensão tamanha que, numa visível ação de contenção e advertência constitucional, o ministro do STF Luiz Fux, em resposta a uma petição do PDT, definiu no último dia 12 próximo passado, em caráter liminar, as atribuições das Forças Armadas segundo o artigo 142 da Constituição Federal.

Presidente Jair Bolsonaro e o ministro Fernando Azevedo – Foto Orlando Brito

Na noite daquela mesma sexta-feira, uma nota assinada pelo presidente Bolsonaro, o vice Hamilton Mourão e o ministro da Defesa General Fernando Azevedo, numa flagrante ameaça, disse que “as FFAA do Brasil não cumprem ordens absurdas, como por exemplo, a tomada de Poder. Também não aceitam tentativas de tomada de Poder por outro Poder da República, ao arrepio das Leis ou por conta de julgamento políticos”.

Apesar de imprudente e despropositada, a nota não mereceu, exatamente, uma resposta formal do STF ou mesmo do Congresso Nacional. Nem a grande mídia deu maiores atenção ao conteúdo daquela manifestação. De todo modo, nota-se agora que o Palácio do Planalto deve ter compreendido que, como se diz no “Goiás profundo”, havia pulado do “corguim”.

O governador Ibaneis Rocha e o ministro Toffoli – Foto Renato Alves/Agência Brasília

Nas últimas 72 horas, numa ação que compreende-se coordenada, o Supremo Tribunal Federal, a Policia Federal, o Ministério Público, o governador do DF Ibaneis Rocha e até o palaciano Augusto Aras, Procurador Geral da República, puseram em marcha um conjunto de medidas que levou para a cadeia militantes vândalos do bolsonarismo, desmontou acampamentos, suspendeu manifestações na Esplanada dos Ministérios, autorizou a Polícia Federal a fazer busca e apreensão na residência de suspeitos de atentarem contra a democracia e suas instituições e no gabinete de 11 parlamentares, supostamente envolvidos na divulgação das fake news.

A densidade da reação jogou nas cordas o protegido pela família do presidente da República e nada equilibrado Abraham Waintraub que deixouo Ministério da Educação e continuará sendo investigado, pelo STF, no inquérito das fake news.

Sabe-se agora que, entre um momento e outro, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso articulou um encontro do ministro Gilmar Mendes com o comandante do Exército, general Leal Pujol, e do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, com alguns generais da ativa. FHC, além de príncipe da Sociologia brasileira, permanece como uma espécie de Visconde da Avenida Paulista. Vai aprendendo Bolsonaro!

Deixe seu comentário