Antes de Bolsonaro, só um vereador chegou a ser presidente

Espera-se que nesta nova leva de vereadores, e com novidades inclusive fisiológicas  e de gênero sexual, aconteça uma bela surpresa para os milhões de brasileiros que  passaram um dia entregues às urnas eletrônicas nas quais todos os brasileiros, menos Bolsonaro, confiam.

Jânio, o vereador que chegou a ser presidente do Brasil

58.208 vagas de vereador estiveram em jogo na eleição desse ano coronavírico que estamos vivendo, ou melhor, tentando sobreviver. Juntamente com 5.568 mil prefeitos, nas capitais e municípios de grande, médio ou pequeno porte. Eleição maior do que essa talvez só na Índia. A China é um país ainda bem maior, mas lá não tem eleição nenhuma. A nossa eleição foi uma das maiores do mundo. Só assim, sem concorrentes, o Brasil consegue um primeiro lugar. Campeão só em disputas de índice per capita de corrupção e criminalidade.

A nossa eleição foi particularmente inovadora, mas  teve abstenção razoavelmente elevada. Os partidos participantes foram mais de 30, e cada eleitor, ao entrar na sala de votação, recebia uma lista oficial com o nome de todos, para não se confundir e votar errado. A simples existência de tantas legendas já confunde a cabeça dos cidadãos. Os vereadores,  de todo o país, em sua grande maioria não correspondem às eventuais expectativas dos cidadãos de cada município.

Eduardo Suplicy, vereador recordista de votos em São Paulo
Chiquinho Scarpa, celebridade do mundo da sociedade obteve 1.177 votos. Mas não foi eleito vereador em São Paulo – Foto Manuela Scarpa/Brazil News
Aguinaldo Promissória, vereador em Santarém, no Pará

A grande maioria, na realidade, pelo que produzem em favor da comunidade que os elegeu, nem deveria receber salário, ou subsídios, como chamam a recompensa financeira que recebem. Nas grandes cidades, recebem elevados proventos, além de outras vantagens, como acontece em todo o Poder Legislativo brasileiro. E os vereadores, boa parte deles eleitos com base em campanhas populistas e até grosseiras, com demonstrações explícitas de má educação e apelidos  chulos, expressam o claro interesse em se eleger para ganhar dinheiro e se aproveitar de vantagens.

Apesar desses problemas, comuns a qualquer país, pode ter havido algum progresso nesse último pleito, pelo  lado humano. Houve  vários  exemplos de personagens que ganharam expressão e o direito de lutar por seus direitos, obtendo o reconhecimento da sociedade. A despeito de preconceitos e violências, várias delas se elegeram e demonstraram coragem. Em suas primeiras declarações e entrevistas, bom nível de conhecimento político e social , demonstrando a possibilidade de realizar um corajoso trabalho na área política e social.  Assim, alguns transexuais ou sexuaistrans bem eleitos estão incorporados (as) à vida política brasileira, e merecem o respeito devido a todas as Vossas Excelências da política.

A atividade  legislativa municipal é dos passos iniciais na vida política, tratando-se da representação dos cidadãos e cidadãs de cada cidade. Daí evoluem  para outras  representações nas Câmaras Estaduais e Federal, ou mesmo o Senado e cargos executivos. A baixa qualidade moral e intelectual dessas representações em várias décadas passadas, fez com que a  população demonstrasse revolta e levasse os vereadores simplesmente na troça. Daí à quase desmoralização total do poder legislativo municipal. Jogadores de futebol, cantores, qualquer pessoa que se considerasse conhecida da população se candidatava  a vereador. E às vezes levavam.

O folclórico Cacareco, eleito vereador em São Paulo

Chegou ao ponto de haver revolta popular com a apresentação de candidaturas no mínimo esdrúxulas, como aconteceu em São Paulo, em 1959. Irritados com os candidatos pretensiosos e desqualificados, grupos revoltados da sociedade se uniram e conseguiram, de verdade, apresentar um animal como candidato a vereador. Não um animalzinho qualquer, obviamente. A convenção escolheu bem: nada  menos que um rinoceronte do zoológico de São Paulo. Logo tornado popular e sucesso também como marcha carnavalesca. Pelos votos obtidos, mais de cem mil, foi eleito. O nome de sua nova Excelência  gigante  era Cacareco. E o slogan, de moralização:  – Cacareco de ninguém tem dó.

O Rio também teve, em 1988, candidato do mesmo naipe: o Macaco Tião. Não foi eleito para a prefeitura carioca, mas obteve 400 mil votos.

A carta renúncia de Jânio Quadros

Entre os pouquíssimos vereadores que chegaram ao ápice da carreira política começando pela  vereança, um se destacou pelas  excentricidades.  Foi o famoso Jânio Quadros, descabelado, vassoura na mão, apreciador de uísque, carreira fulminante: por São Paulo, vereador, prefeito, governador, e depois  presidente da República, tudo em seguida. Mas cansou e sete meses depois  renunciou. Até hoje não se sabe a razão. Ele próprio não soube explicar. Assim, o vereador Jânio deixou de ser um exemplo para a classe.

Espera-se que nesta nova leva de vereadores, e com novidades inclusive fisiológicas  e de gênero sexual, aconteça uma bela surpresa para os milhões de brasileiros que  passaram um dia entregues às urnas eletrônicas na quais todos os brasileiros confiam. Menos o Bolsonaro, que não confia no modernismo eleitoral brasileiro, assim como Trump, seu amigo e guru, também não acredita na eleição americana.

— José Fonseca Filho é Jornalista

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