O vale tudo contra a Lava Jato

O chicote mudou de mão. O mesmo atropelo das garantias legais atribuído a Moro e a procuradores parece agora ser a principal arma contra eles.

Estatua da Justiça, em frente ao Supremo

Desde sempre, a Justiça no Brasil parece reproduzir a gangorra na política. Há muitas e muitas décadas prevalece no país a máxima de “aos amigos tudo, aos inimigos os rigores da lei”. No antológico Quincas Borba, Machado de Assis foi no ponto: “O melhor modo de ter o chicote é ter-lhe o cabo na mão”. A avidez pelo desmonte da Operação Lava Jato reproduz os defeitos a ela atribuído.

Benedito Gonçalves – Foto Rafael Luz/STJ

O parecer do ministro do Benedito Gonçalves propondo a cassação do mandato do deputado Deltan Dallagnol, endossado por todos seus colegas no Tribunal Superior Eleitoral, é a negação de toda a pregação da advocacia criminalista em favor de uma justiça  “garantista” dos direitos dos réus. Essa turma simplesmente fingiu que não viu.

Pelo prognósticos de advogados e repórteres que cobrem o STF, os garantistas do STF, como Gilmar Mendes, vão referendar a decisão do TSE. É o avesso do discurso que adotaram para enterrar a Lava Jato.

Sérgio Moro e Deltan Dallagnol – Foto Reprodução

O que está em questão nem é mais se Sérgio Moro e Deltan Dallagnol extrapolaram suas atribuições legais. Depois de endossar uma penca de decisões de Moro e seus parceiros, inclusive a prisão de Lula, o STF fez uma revisão e anulou as sentenças de Moro, classificadas como parcial.

Eduardo Appio foi afastado do comando da 13ª Vara Federal de Curitiba – Foto Divulgação/Justiça Federal do Paraná

Na esteira dessa virada da ventania, a Procuradoria-Geral da República, sob a batuta de Augusto Aras, detonou a força tarefa do ministério público. Alvejada por todos os lados, a Lava Jato parecia ter morrido. Além de seus escombros, o que ainda restava começou a ser removido pelo juiz Eduardo Appio, escalado para a famosa 13 Vara Criminal de Curitiba. Lá, suas seguidas canetadas anulavam condenações e delações sobre megas esquemas de corrupção.

Desembargador Marcelo Marucelli – Foto Reprodução/TRF-4

Estava virando celebridade quando foi afastado do cargo pelo Tribunal Regional Federal da 4 Região, acusado de ter ameaçado um dos desembargadores que investigava sua conduta em outros procedimentos. Pela denúncia, Appio tentou constranger o desembargador Marcelo Marucelli em um telefonema em que teria usado nome falso para ameaçar seu filho, o advogado João Eduardo Barreto Marucelli, sócio e genro de Sérgio Moro.

A conversa constrangedora, em que revelou ter acesso a dados confidenciais de João Eduardo, terminou com uma ameaça velada. “E o senhor tem certeza de que não tá  aprontado nada?”. Pela investigação do TRF, com o auxílio da Polícia Federal, além da probabilidade da voz no telefonema gravado ser do juiz Eduardo Appio, há digitais dele no acesso a dados confidenciais de João Eduardo.

O advogado criminalista Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay – Foto Reprodução

O que se espera diante dessas evidências é um mínimo de cautela. Não foi a reação do advogado Antônio Carlos Almeida Castro, o Kakkay, a mais estridente voz do movimento de parte dos criminalistas contra a Lava Jato: “Afastar o juiz de sua jurisdição por um ato que, ao que tudo indica, não tenha gravidade suficiente para tal, é um abuso inominável. É o judiciário desdenhando do judiciário”.

Como assim? Quando a Vaza Jato revelou conversas em que juiz e procuradores da Lava Jato acertavam procedimentos  nas investigações, Kakkay e outros advogados defenderam a prisão de Sérgio Moro. Agora, diante a acusação de tentativa de chantagem de um juiz a um desembargador, antes mesmo de concluída a apuração, é definido por Kakkay como um ato de menor gravidade.

O problema é que esses dois pesos e duas medidas parece valer também em julgamentos em última instância em Brasília.

A conferir.

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