O ciclone bomba é o vento carpinteiro que provocou o naufrágio de Garibaldi

O ciclone que causou mortes e destruição no sul do País não é novo. As histórias catarinense e gaúcha registram a força desses ventos, como conta o autor

O ciclone bomba que assola o litoral sul, com ventos de mais de 100 km por hora em Santa Catarina e nos Aparados da Serra, no Rio Grande do Sul, vagalhões de quatro metros nas praias gaúchas e catarinenses, nada mais é do que o velho Carpinteiro da Praia que assombrava navegadores desde o século XVI. Há quase 100 anos, em 15 de julho de 1839, o vendaval afundou parte da esquadra da República Rio-Grandense, comandada por Giuseppe Garibaldi, que se deslocava de Tramandaí (RS) para atacar Laguna (SC) e fundar a República Juliana. Também foi essa tormenta que, em junho de 1861, jogou nas dunas o navio inglês Prince of Wales, que, saqueado, provocou a Questão Christie, uma grave crise internacional entre Brasil e Inglaterra.

O vento era chamado Carpinteiro (hoje rebatizado pela mídia como ciclone bomba) porque, vindo do sudeste, destroçava as embarcações construídas em madeira, mesmo as grandes naus, reduzindo-as a cavacos, espalhando destroços pelas areias – daí o nome de carpinteiro. Hoje, atualizaram o nome, mas ainda é o velho vento sul que, da altura de Florianópolis, inflete para o oceano, poupando as populações litorâneas dali para norte.

Em 15 de julho de 1839, depois de uma peripécia que tem destaque na biografia do “Herói dos Dois Mundos”, Garibaldi foi o único sobrevivente do naufrágio da escuna “Farroupilha” nas imediações de Araranguá (SC). Ele chegara ao Oceano Atlântico transportando seus navios por terra, saindo da Lagoa dos Patos (RS) para o arroio Capivari. Dali, cruzando os campos, voltaram a flutuar no rio Tramandaí, enganando a esquadra imperial, que bloqueava a barra de Rio Grande, comandada pelo almirante anglo-brasileiro John Pascoe Greenfeld.

A travessia dos navios “navegando” por terra (cada um tracionado por 100 juntas de bois) está registrado no quadro histórico “Garibaldi liderando a expedição”, de Lucílio de Albuquerque, obra épica reproduzida no mundo inteiro pela relevância histórica do italiano.

Ilustração da Guerra dos Farrapos, 10 anos de luta entre o Império e o Rio Grande do Sul – Guilherme Litran / Acervo Museu Júlio de Castilhos

Os republicanos venceram a batalha, que contou, entre outros, com o corpo de Lanceiros Negros, famosos escravos guerreiros da Guerra dos Farrapos. Também neste episódio, Garibaldi conheceu e se casou com Ana Maria de Jesus Ribeiro, registrada na História Universal como Anita Garibaldi, enterrada em Roma sob um monumento equestre na famosa praça Giancolo, onde foi sepultada a mando do então ditador Benito Mussolini, em 1931, com honras militares. Anita, uma catarinense de etnia paulista (mistura de índio com branco cristão novo), ensinou Garibaldi a montar e, daí por diante, ele se transformou num general de cavalaria, relembrado também em monumentos equestres pelo planeta inteiro. Obra do vento carpinteiro, que, uma vez mais, levanta polvadeira no sul do País.

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