Gás natural e conectividade estão na base da terceira revolução agrícola

Reconhecido como o único setor produtivo que cresce mesmo em meio a crises, como a pandemia do coronavírus, o agronegócio se prepara para mais uma salto de produção

Deputado Alceu Moreira - Foto: Orlando Brito

A Frente e Ruralista pretende liderar a terceira revolução agrícola no Brasil. O deputado Alceu Moreira (MDB-RS), presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, está trabalhando no sentido de viabilizar as novas legislações para a conectividade e do gás natural, que possibilitem um upgrade tecnológico que vai catapultar um novo salto do agronegócio no País.

Falando a’Os Divergentes, o parlamentar gaúcho detalhou este projeto estratégico que está tramitando no Congresso Nacional. A Lei do Gás, já aprovada pela Câmara, agora vai ser votada pelo Senado, e a teia legal para amparar e regulamentar a conectividade virá no bojo da nova fase 5.0 da era digital.

Nesse sentido, está sendo formatado um esquema financeiro para sustentar estes projetos. O gás natural terá atrativos para captar capitais internacionais em investimentos de médio e longo prazos.

A conectividade também propõe a liberação de recursos retidos da telefonia, cerca de 24 bilhões de reais das contribuições para a rede de orelhões totalmente em desuso. Com este dinheiro será possível formar um fundo garantidor com o BNDES, que alavancaria 240 bilhões de reais no mercado financeiro, dinheiro suficiente para botar de pé a conectividade do agronegócio porteira para dentro em todo o País.

Segundo o deputado Moreira, o setor da agropecuária será o mais beneficiado com as novas normas da flexibilização da extração, venda da matéria prima, transporte, industrialização e comercialização do gás natural. Com essa fonte de energia, será possível incrementar a dessalinização da água salgada do Oceano Atlântico no litoral nordestino. Purificada, a água do mar será canalizada para os sertões.

No caso da conectividade, diz o parlamentar, embora beneficie toda a cadeia do agronegócio, desde a lavoura até à gôndola do supermercado, será no campo que a internet das coisas irá produzir sua parte da nova revolução agrícola. Satélites, fibras óticas e toda a parafernália eletrônica vão alimentar uma automatização da atividade agropecuária.

Revoluções agrícolas

Getúlio Vargas e a marca “o petróleo é nosso”

As revoluções agrícolas brasileiras ocorreram a partir do governo democrático do presidente Getúlio Vargas, alavancado na histórica Campanha do Trigo. Com financiamento da Carteira de Credito Agrícola do Banco do Brasil, o governo federal incentivou o plantio de trigo, mas também de outras culturas de que o País era dependente de importações. Neste processo, a classe rural foi induzida a adotar a mecanização das lavouras, o uso de fertilizantes, defensivos e sementes certificadas. Em poucos anos a economia rural, que desde os tempos coloniais baseava-se em culturas permanentes, como café e cacau, para lavouras anuais, com forte participação de gramíneas e leguminosas, tanto para grãos como para pastagens.

Foi o primeiro grande salto. Os proprietários de terras ali aprenderam a fazer lavouras. Os pecuaristas deram um passo na direção do melhoramento genético dos rebanhos, introduzindo novos sistemas de alimentação dos animais. Nessa época o País começa a exportar carne congelada, produzidas pelas cooperativas de criadores do Rio Grande do Sul.

Foi a primeira revolução agrícola, a partir do pós-guerra, com participação destacada do diretor da Carteira de Crédito Agrícola do BB, o então deputado federal Nestor Jost (PSD-RS), depois presidente do banco e ministro da Agricultura. Esta grande modernização foi realizada sob a liderança do Poder Executivo, inspirada pelo então presidente Vargas, que já vinha dando os primeiros passos nos tempos de seu primeiro governo entre 1930 e 1945, estruturado na gestão de seu sucessor, Eurico Gaspar Dutra, e levado a cabo no período 1954/57, continuado por Juscelino Kubitschek, com seu ministro da Agricultura, Mário Meneghetti.

O ex-ministro Allysson Paulinelli

A segunda revolução, ainda em curso, foi posta em marcha por ministros originários do meio acadêmico, professores de Agronomia, Luís Fernando Cirne Lima (da UFRGS), criador da Embrapa, e seu sucessor, o mineiro Alisson Paulinelli, da Faculdade de Agronomia de Lavras (MG). Esta revolução teve como base a ciência aplicada à produção, com ganhos exponenciais de produtividade e conversão pelo emprego de insumos químicos da incorporação de terras de baixíssima fertilidade, como o cerrado. Nesta fase, o Brasil passou a ser o segundo maior produtor de alimentos do planeta.

Na pecuária, houve grande melhoramento dos rebanhos na segunda revolução agrícola, como a conversão da avicultura doméstica em industrial e a transformação do rebanho do porco-banha pela criação de raças do tipo porco-carne. Destacam-se ações na área sanitária, dentre as quais a viabilização das importações de reprodutores da Índia, da Inglaterra, da Argentina e outros países da Europa, e sêmen congelado dos Estados Unidos. Um grande salto zootécnico.

A nova fase da terceira revolução está sendo liderada pela classe política, como representantes dos produtores. Desta feita, está sendo conduzida pelo segmento parlamentar do setor, tendo a frente no presidente da Frente Parlamentar da agropecuária, em ação paralela ao Ministério da Agricultura e sua titular, a ministra Tereza Cristina (DEM-MS).

Projeto engenhoso

O objetivo é vencer o mais antigo problema rural do país, as secas do Nordeste, que há séculos penalizam o homem do campo. O projeto é engenhoso. No caso do gás, há uma fórmula para viabilizar o uso energético desse hidrocarboneto, contornando o limitador da escala, nessa versão para uso rural. A ideia é construir uma rede de pequenas usinas a gás, integradas com plantas eólicas e solares, próximas à zona de produção, para diminuir o custo de transmissão e distribuição.

Plataforma para exploração de petróleo da Petrobras – Foto: Agência Petrobras

A usina motorizada será a base do sistema, cobrindo as variações das geradoras intermitentes, eólicas e solares. Esta solução, entretanto, teria uma limitação, que é o transporte do gás, produzido em campos marítimos, até a boca da fornalha. Neste caso, em vez de oleodutos convencionais, uma infraestrutura cara e que demanda grande volume de tráfego seria substituída por caminhões e trens, que são meios de transporte já disponíveis na região. O gás retirado do mar seria liquefeito e transportado em carretas ou vagões tanques. Para plantas de pequeno ou, no máximo, médio porte, o transporte terrestre é válido. Este seria o ponto principal. Centenas de sistemas eólicos, solares e gaseificados pelo interior, dando condições de produção para terras tidas hoje coo desérticas.

Dessalinização da água do mar

Esta mesma energia, no litoral, seria usada para a dessalinização da água do Oceano Atlântico, depois enviada por dutos gigantescos, no porte dos canais de desvio do rio São Francisco já em uso, para o interior. Com a topografia nordestina, é possível levar a água a baixo custo, com poucos pontos de bombeamento.

Irrigadas, as lavouras da região poderiam produzir três safras de milho por ano, valendo-se da intensa insolação, que diminui em 22 dias por ano o tempo de uma safra dessa commodity. “Vamos produzir de 30 a 40 milhões de toneladas por ano naquelas terras torcidas, em lavouras de altíssimo desempenho, pela simples aplicação de tecnologia desenvolvida no próprio país”, diz o deputado. “Já temos as sementes, desenvolvidas na Embrapa, para transformar o Nordeste. Só falta levarmos adiante esse projeto, que sairá no bojo da legislação sobre o gás natural que está em fase final de tramitação no Senado”, assegura o presidente da Frente Ruralista.

Alceu Moreira lembra a frase do antigo arcebispo de Recife, Dom Helder Câmara, que dizia: “O deserto é fértil” , vislumbrando a transformação dos sertões, agrestes e semiáridos em terras produtivas e vigorosas, como, no anos 1970, ocorreu no cerrado do centro-oeste, antigamente áreas inaproveitáveis para a agricultura e inviáveis ao uso econômico, convertidas em espaços de grande produção, nos estados centrais brasileiros.

Água e energia, lavouras e criações comandadas pela internet. Esta seria a resposta do agronegócio às críticas que os ruralistas recebem nas cidades, onde as populações urbanas ainda veem o plantador com a visão dos anos 1950, com o estereótipo de latifundiário clássico atrasado e destruidor da natureza. “Já estamos deitando fiação de fibra ótica nos leitos dos rios para levar conectividade aos rincões mais distantes”. Até parece: o futuro boia-fria seria um robô com chapelão de boiadeiro.

Deixe seu comentário