Brasil sob ameaça de tribalização, alerta Aldo Rebelo

O Brasil vive um momento de desorientação. Mas o caminho para o futuro é a política. Assim, o ex-ministro e ex-deputado Aldo Rebelo encara o País de 2019. Na entrevista exclusiva a'Os Divergentes, ele defende a iniciativa privada e insiste na política para mediar os conflitos da sociedade - parte deles assentados em premissas falsas como a dicotomia esquerda x direita. Receita para sair da crise? Crescimento econômico

O alagoano Aldo Rebelo, ex-deputado e ex-ministro - Foto: Orlando Brito

A tribatização ameaça a unidade do País devido a uma agenda globalizante, identitária em torno de uma disputa ideológica ultrapassada entre setores de esquerda e da direita. Sem falar na aposta de Jair Bolsonaro na divisão e fragmentação da sociedade. Falta também experiência ao presidente da República para executar uma agenda impossível de ser cumprida com o seu jeito de governar.

Com isso, o Brasil vive um momento de “desorientação” que afeta a área econômica, política e social. O alerta, em entrevista a’Os Divergentes, é do ex-ministro dos governos de Lula e Dilma, Aldo Rebelo – que também foi presidente da Câmara dos Deputados.

O caminho para sair desta barafunda é confiar que a democracia seja mediadora dos conflitos na sociedade. A onda de negação da política, devido a atuação equivocada do Ministério Público e da Polícia Federal, está passando.

“Não é o ódio, a divisão da sociedade, pregada por este Governo. O presidente da República, que deveria ser um agente da unidade do País, da conciliação, mas não. Postula cavar um fosso, um abismo entre os segmentos da sociedade por razões ideológicas, por razões secundárias”.

“A questão ideológica é falsa. O País não está dividido entre direita e esquerda”, disse o ex-filiado do PC do B e ex-ministro que ocupou as pastas da Defesa, Ciência e Tecnologia, Articulação de Governo e Esportes. Hoje, ele está sem partido, depois de passar também pelo PSB e Solidariedade – mas tem simpatia pelo PDT.

Ele defende a construção de um entendimento nacional envolvendo trabalhadores e empresários, considerados pela burocracia de Estado como quase criminosos, para contribuir com o crescimento da economia. O crescimento pode resolver o desemprego, gerar renda da população e equacionar os desequilíbrios fiscais da União, estados e municípios.

Enquanto aguarda as eleições municipais de 2020 para definir sua volta aos quadros partidários, Aldo vem dedicando seu tempo a palestras em sindicatos dos trabalhadores, entidades empresariais e igrejas, passando suas visões de que o Brasil vive um momento de “desorientação” por falta de rumo na áreas econômica, política e social.

Aldo Rebelo critica grande parte da esquerda, que renegou a causa patriota em busca de uma agenda cosmopolita, globalizante, identitária. “Não se pode esperar da esquerda uma agenda que una mais amplamente o País em torno de seus grandes objetivos. E da direita muito menos”.

Para Rebelo, “gente que esteja com agenda de globalização, seja ela identitária, ou pró-americana, isso não serve para o Brasil”.

Em conversa de mais de uma hora no Hotel Nacional de Brasília, ele falou na importância da classe política se livrar da corrupção, de acabar o modelo denuncista de fazer política onde um parlamentar utiliza o Ministério Público e a imprensa para atacar seus adversários.

”Não há possibilidade de governar o Brasil desprezando os partidos. É esse o caminho que se tentou recentemente com a mídia, o Ministério Público, com Polícia Federal e o juizado de primeiro grau. Você vai entregar o País na mão destas instituições que não têm noção do que é o Brasil. Instituições narcisistas”, criticou.

Leia, a seguir, a íntegra da entrevista exclusiva:

Os Divergentes. Ministro, o senhor tem trabalhado com a ideia de que o Brasil vive um momento de desorientação?

Aldo Rebelo. A desorientação reside no desajuste dos três eixos que conduziram a trajetória do País até aqui. A construção econômica da nação, a construção social e política. Precisamos retomar a ideia de que o Brasil precisa voltar a crescer. Sem voltar a crescer não tem solução para nenhuma das graves crises que enfrenta há alguns anos. Não temos solução para a crise fiscal, se não voltarmos a crescer. Não tem recursos nem para União, estados e municípios. Você tem que fazer a economia crescer para resolver o desemprego e crise social. O crescimento é um fator benigno. Cria na sociedade um ambiente benigno, de generosidade, de entusiasmo. Precisamos crescer para resolver as desigualdades sociais, que voltaram a aumentar. Se você vai a São Paulo, Porto Alegre ou Recife você vê nas ruas o retrato da indigência, da pobreza. O País precisa voltar a confiar que a democracia é a única mediadora dos conflitos que nós temos. Não é o ódio, a divisão da sociedade, pregada por este Governo. Pregada pelo presidente da República, que deveria ser um agente da unidade do País, da conciliação, mas não. Postula cavar um fosso, um abismo entre os segmentos da sociedade por razões ideológicas, por razões secundárias. O País já se dividiu algumas vezes por grandes causas. A questão ideológica é falsa. O País não está dividido entre direita e esquerda. Nós não vivemos mais na Guerra Fria. O Brasil não está dividido em uma agenda de costumes, abraçada por uma parte que se chama de direita, e outra que se chama de esquerda. Se dividiu na Independência, Abolição da Escravatura, na Proclamação da República, na Revolução de 1930.

“Precisamos retomar a ideia de que o Brasil precisa voltar a crescer. Sem voltar a crescer não tem solução para nenhuma das graves crises que enfrenta há alguns anos”.

Os Divergentes. O resultado das eleições de 2018 não é reflexo do desgaste do modelo partidário e de governabilidade? A visão ideológica da esquerda foi questionada neste processo?

Aldo Rebelo. É preciso saber o que se pode chamar de esquerda hoje. Quando participei do movimento estudantil, uma agenda abertamente de esquerda era a luta pela igualdade. Uma agenda anti-imperialista, pelos direitos dos povos, a luta pela redemocratização do País. Hoje, grande parte da esquerda renegou a agenda patriota, inclusive as cores e os símbolos do País foram abandonados em busca de uma agenda cosmopolita, globalizante, identitária. Não se pode mais esperar da esquerda uma agenda que una mais amplamente o País em torno de seus grandes objetivos. E da direita muito menos. Esse pessoal não está ligando para o Brasil. Esse pessoal faz uma passeata aqui no domingo e depois embarca e vai para Miami (EUA). Se sentem muito mais americanos que brasileiros. Para eles, o Brasil é como se fosse uma colônia de férias, ou, no máximo, onde ganham dinheiro para gastar no exterior. Então o Brasil não pode depender desta gente. Precisa depender de quem está aqui trabalhando, produzindo. Dos empresários nacionais, dos agricultores, da classe média nacional, dos trabalhadores nacionais. Gente que pensa no País. Gente que esteja com agenda de globalização, seja ela idenditária, ou pró-americana, isso não serve para o Brasil.

Os Divergentes. O Congresso Nacional vem assumindo responsabilidade maior do que tinha em função de um presidente que tem dificuldade de construir consensos. A saída para esta proposta de união nacional pode estar dentro do Congresso?

Aldo Rebelo. A ironia desta situação é de que os que tiraram a Dilma do Governo, não tinham como plano entregar o governo ao Bolsonaro. O Bolsonaro foi um acidente de percurso, um imprevisto. Essa gente não queria o Bolsonaro, ele não era o projeto do sistema. Tanto é que Bolsonaro tem conflitos importantes com esse pessoal e está procurando um candidato para substituí-lo em 2022. Bolsonaro não estava preparado para assumir esta responsabilidade. Não tem uma ideia muito clara do que é o País. Sobrevivia em um mandato de deputado em torno desta sua agenda de confronto. E com essa agenda ele chegou à Presidência. E com esta agenda tentar governar o País, o que é impossível.

Os Divergentes. O Congresso pode ocupar espaço deixado por Bolsonaro?

Aldo Rebelo. Não vejo. O Congresso é uma instituição importante, mas foi submetido também a um desgaste profundo. Alias, o Bolsonaro é produto do esforço de um conjunto de instituições de forças sociais que se voltaram, não é contra um partido, contra o Congresso, contra a política. A mídia, como grande corporação privada, é protagonista desta situação que está aí, as corporações públicas como o Ministério Público, o Judiciário de primeiro grau, a Polícia Federal. Setores médios que estavam resistentes à permanência do PT no governo. Todo este pessoal se uniu para tirar a Dilma do Governo. Só que eles tinham um projeto diferente que não foi possível realizar e terminou com a Presidência do Bolsonaro.

Os Divergentes. Quem vai tirar o Bolsonaro do poder nas próximas eleições?

Aldo Rebelo. O que há em curso é um rearranjo de forças dentro do próprio campo conservador que já se anunciam novos pretendentes. Está aí o Luciano Huck, o governador de São Paulo, o do Rio de janeiro. O Sergio Moro é outro nome. Neste campo mais progressista de esquerda estão postos os nomes de Ciro Gomes, o Haddad, o governador da Bahia e o Lula. Quem vai ser o protagonista ao final desta batalha não está posto. Há conjunturas que são criadas por lideranças ou por grupo de lideres. E há conjunturas que eles vão criar suas próprias lideranças.

“Todo este pessoal se uniu para tirar a Dilma do Governo. Só que eles tinham um projeto diferente que não foi possível realizar e terminou com a Presidência do Bolsonaro”.

Os Divergentes. O senhor não mencionou o papel que possam ter as chamadas classes sociais. Que tipo de proposta pode unir o capital e o trabalho no esforço de desenvolvimento?

Aldo Rebelo. Essa que me referi. A retomada do crescimento é uma bandeira que une os trabalhadores, por dar perspectiva de geração do emprego, valorização do trabalho, ampliação da renda dos trabalhadores e que dá também perspectiva para os empresários. A retomada do crescimento cria para a classe empresarial da cidade e do campo, dos pequenos, dos médios , dos grandes da indústria e dos serviços, uma perspectiva otimista. Veja o caso da China. Há 10 anos, 20 anos, parte da esquerda acusava a China de concorrer com o mundo por causa do trabalho semiescravo. Nos últimos 5 anos, a China foi o País que mais ampliou a renda dos trabalhadores em todo o mundo, mais do que na Europa. Onde mais se reduziu a pobreza foi na China. Onde mais se elevou o padrão de vida material da população. Onde mais se criou bilionários foi na China, onde mais se multiplicou o capital foi na China. Então, a agenda do crescimento é de ampla unidade de forças sociais e econômicas.

“Então, no Brasil nós temos quem não produz manda em quem produz. Quem não paga imposto manda em quem paga. Quem não gera emprego manda em quem gera. Quem não cria divisas manda em quem cria divisas”.

Os Divergentes. Na China, o Estado tem um papel muito forte na indução do investimento. O Brasil está sem recursos para investir? O nosso crescimento terá que ser feito pelo estado ou setor privado?

Aldo Rebelo. Este é outro sintoma da profunda desorientação das nossas elites em estabelecer este conflito entre estado e mercado. O Brasil precisa de mais mercado e mais estado. O Estado para apoiar o desenvolvimento. Em todo o mundo o Estado foi apoiador do investimento. Orientador do desenvolvimento econômico. O Brasil precisa mais mercado, porque nós criamos uma burocracia antimercado. Esses órgãos de controle de fiscalização, se fizer um inventário, provavelmente, o Brasil tenha a burocracia que mais desestimula investimento no mundo. A burocracia que mais desestimula investimento não está em nenhum País socialista. Não está em Cuba, China, no Vietnã. Está no Brasil. Aqui criou-se uma burocracia na qual quem produz é quase um criminoso. Quem investe é quase um criminoso. Seja na cidade ou no campo. Não falo do grande investidor, não. Tente qualquer um abrir uma pequena loja para saber o que vai enfrentar. Tente qualquer um produzir qualquer coisa no País. Então, no Brasil nós temos quem não produz manda em quem produz. Quem não paga imposto manda em quem paga. Quem não gera emprego manda em quem gera. Quem não cria divisas manda em quem cria divisas. Isso é muito desalentador para o País. Nós precisamos de fato reforçar no Brasil o empreendedorismo.

Os Divergentes. Isso não é um pouco culpa da esquerda que sempre achou que o capital e os proprietários eram vilões?

Aldo Rebelo. A burocracia não tem ideologia. Ela se autoprotege. Não é uma coisa nem de esquerda ou de direita. Criou-se um mostrengo dentro da burocracia que tem uma ideologia própria, de ter controle, de ter força, de ser mediadora de tudo. O País precisa de mais mercado e de mais estado, principalmente na área de ciência, tecnologia de inovação. Os grandes ganhos de inovação na economia dos Estados Unidos que deram estas gigantes de tecnologia da informação, da inteligência artificial foi resultado de investimento público.

Os Divergentes. O Brasil não perdeu o bonde da historia nesta questão de educação?

Aldo Rebelo. São deficiências que podemos corrigir. O bonde da história gira. Ele faz a viagem de volta e passa de novo. Você perde muitas vezes uma viagem, você desembarca, mas você pode retomar logo depois. O Brasil tem a grande vantagem de não contar com elementos desagregadores internamente, as divisões nacionais, divisões étnicas, os grandes conflitos religiosos. Em uma geração ou duas você consegue melhorar a educação do País, retomar os investimentos na área de pesquisa, dotar a rede de equipamentos de meios pra requalificar nosso pessoal. Isso você pode fazer.

“Ou nos unimos em torno dos interesses nacionais, ou vamos regredir a uma tribalização entre esquerda e direita, tribalização de gênero, tribalização de raça”.

Os Divergentes. Na sua avaliação, o Brasil depende muito mais da educação, do trabalho e empreendedorismo do que a discussão ideológica de direita e esquerda?

Aldo Rebelo. A ideologia que pode remover os obstáculos ao crescimento do País, a elevação do padrão de vida da população, é a ideologia do nacionalismo substituindo a tribalização, porque hoje a fronteira é essa: ou nos unimos em torno dos interesses nacionais, ou vamos regredir a uma tribalização entre esquerda e direita, tribalização de gênero, tribalização de raça. Isso está em curso aí. Não falta quem defenda este tipo de coisa. Ou seja, o País se une em torno do interesse nacional ou vai se tribalizando, inclusive com a tribalização promovida por setores da esquerda e da direita. O que é que o Governo atual faz, se não aposta na divisão, aposta na fragmentação.

Os Divergentes. E quais as conseqüências desta fragmentação?

Aldo Rebelo. Leva a essa desorientação que pode dar em governos incapazes de conduzir o País porque não reúnem nem força, energia e clareza para onde ir. Fica fabricando conflitos com os vizinhos aqui, com a Venezuela, Argentina. Achando que existe um perigo no mundo do socialismo. Recriando na fantasia a ideia da Guerra Fria. Renegando a tradição da nossa diplomacia. Achando que o Estado é um inimigo ser combatido, que um programa de privatização é que vai resolver os problemas do País.

Os Divergentes. Mas as privatizações não podem ajudar neste processo de alavancagem do crescimento?

Aldo Rebelo. Depende do que você quer privatizar. Uma coisa é você fazer a distribuição do petróleo do pré-sal, outra é privatizar a Petrobras e se desfazer inclusive das refinarias, da parte lucrativa da empresa que é o refino.

Os Divergentes. E a questão da Amazônia?

Aldo Rebelo. O Brasil nunca integrou o espaço da Amazônia. Quando falo em integrar é integrar geograficamente, povoando. Integrar economicamente, desenvolvendo. Integrar socialmente, oferecendo condições de vida à população. Integrar na infraestrutura. Nós não temos infovia na Amazônia. Tudo que nós temos de infraestrutura no Brasil está no litoral: a ciência, o desenvolvimento, a cultura, a pesquisa. Nós deixamos a Amazônia abandonada. Quem foi para lá tomar conta? As ONGs. Na Amazônia temos a população com maiores índices de analfabetismo, de doenças infecciosas, a maior taxa de mortalidade infantil. Se você olha naquele mapa com a Guiana Francesa, Holandesa e Inglesa, aquilo é um testemunho da cobiça dos impérios coloniais sobre a Bacia Amazônica.

Os Divergentes. E como está sua militância partidária?

Aldo Rebelo. Me afastei da vida partidária. Vou retomar, mas vou esperar passar a eleições de 2020, porque haverá mudança no quadro partidário. E também pelo seguinte: eu mudei de partido do PC do B para o PSB, e depois para o Solidariedade, mas o fundamental é você ser leal aos seus compromissos e suas ideias. Penso mais ou menos como pensava na minha juventude. Meus ideais são os mesmos: sonho com um País forte, grande, respeitado, socialmente equilibrado, democrático.

Os Divergentes. O senhor não se vê nestes partidos que estão aí?

Aldo Rebelo. Eu tenho alguma simpatia pelo PDT, porque é o que mantém uma distância maior desta chamada agenda dos costumes. Agenda identitária. Os demais [partidos] se transformaram em correia de transmissão de movimentos comportamentais. Mas também não quero me filiar por enquanto a partidos. Quero aguardar.

Os Divergentes. Mas o senhor continua fazendo política?

Aldo Rebelo. Acho que o fundamental é travar luta de ideias. Vou continuar na militância política, social. Converso com os partidos, com entidades dos trabalhadores. Tenho uma agenda sindical muito forte em São Paulo. Vou muito aos sindicatos. Não há uma semana que não vá aos sindicatos conversar com os trabalhadores. Converso com entidades empresariais. Conversos com as igrejas. É preciso dialogar amplamente em torno de uma agenda para o País.

“Não há possibilidade de governar o Brasil desprezando os partidos. É esse o caminho que se tentou recentemente com a mídia, o Ministério Público, com a Polícia Federal e o juizado de primeiro grau. Você vai entregar o País na mão destas instituições que não têm noção do que é o Brasil. Instituições narcisistas”.

Os Divergentes. E como senhor vê o papel dos partidos?

Aldo Rebelo. Você precisa dialogar com os partidos. Não há possibilidade de governar o Brasil desprezando os partidos. É esse o caminho que se tentou recentemente com a mídia, o Ministério Público, com a Polícia Federal e o juizado de primeiro grau. Você vai entregar o País na mão destas instituições que não têm noção do que é o Brasil. Instituições narcisistas. Que cometeram erros em suas trajetórias. Instituições que pensam no seu próprio poder. São diferentes, inclusive, das Forças Armadas, que cometeram erros na sua trajetória, mas tem uma preocupação com o País, com a questão nacional. Estavam lá em Guararapes para expulsar os holandeses, estavam na Bahia e Maranhão para expulsar os portugueses na Independência, estavam nos campos do Paraguai, na luta pela República. Então, as forças armadas são instituições de estado. O Ministério Público, quando você olha para trás, o que vê?

Os Divergentes. O Estado precisa diminuir o tamanho desta burocracia?

Aldo Rebelo. O Estado é obeso onde não deveria ser e raquítico onde deveria ser mais musculoso. É obeso nos órgãos de controle. Examine os concursos públicos e veja onde é que as vagas são ofertadas? As vagas para engenheiros, quantas vagas para engenheiros e quantas vagas para instituições ligadas a esta estrutura de poder do Judiciário? Quantas vagas para cientistas? Quantos concursos para preencher instituições de pesquisas do País?

Os Divergentes. Como o senhor está vendo, do ponto de vista das barreiras partidárias, as próximas eleições municipais?

Aldo Rebelo. Será uma eleição muito fragmentada porque a legislação obriga que todos tenham candidatos, porque encerrou o ciclo das coligações proporcionais.

Os Divergentes. O senhor acha que a tendência do eleitorado ainda é a negação da política?

Aldo Rebelo. A negação da política enfrenta uma crise. É uma onda que vai passando. Porque aquilo que tentou substituir a política se mostrou também muito inconsequente, muito pouco razoável, e vai se mostrar ainda mais inconsequente e sem razoabilidade. Acho que a política vai recuperar uma hora seu papel de protagonismo. Mesmo porque estes pretensos negacionistas da política terminam vindo para a política, como aconteceu com o juiz Sergio Moro.

“A política é a única instituição capaz de mediar a vida e o destino em uma sociedade democrática.
Senão você vai entregar o poder a um tirano”
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Os Divergentes. A negação da política parece que está muito carregada por esta questão da corrupção. O senhor acha que a política consegue se livrar da corrupção?

Aldo Rebelo. A política tem que ser separada da corrupção, que é um fenômeno no mundo, infelizmente da vida pública e vida privada. Ninguém cogita acabar com o mercado porque ele se envolve com a corrupção. Como o capitalismo, que protege a corrupção, ninguém cogita. Ou como também existe corrupção no socialismo, vamos acabar com ele. Ninguém cogita acabar com estes sistemas por causa da corrupção. Então, o que você tem é que combater e separar. A política é a única instituição capaz de mediar a vida e o destino de uma sociedade democrática. Senão, você vai entregar o poder a um tirano.

Os Divergentes. A sociedade brasileira estaria correndo um risco da tirania pelo desgaste da política?

Aldo Rebelo. Nada. A tirania de quem? Os militares, que constituem uma corporação respeitada, admirada e com história, não conseguiram implantar uma tirania no Brasil. A ditadura esgotou-se em menos de 20 anos, quanto mais estas instituições que ninguém sabe o que são. O Ministério Público, a Polícia Federal e o juizado de primeiro grau ganharam algum protagonismo com base na perda de credibilidade da política, mas não na credibilidade destas instituições.

Os Divergentes. O senhor generaliza, mas na Justiça de primeiro grau deve ter muitas decisões corretas e adequadas, assim como na Polícia Federal e no Ministério Público?

Aldo Rebelo. É, não se pode generalizar, mas criticar aquelas que interferiram de fato no destino político do País. Aliás, instituições que não querem que a política interfira na sua vida. Agora mesmo quando o presidente Bolsonaro decidiu escolher o chefe do Ministério Público, que não integrava a lista tríplice, houve protesto. Estas corporações querem interferir na política, mas não querem que a política interfira na vida das corporações.

Os Divergentes. O estado precisa diminuir o tamanho desta burocracia?

Aldo Rebelo. Não penso.

Os Divergentes. Então, o senhor se vê dentro do PDT?

Aldo Rebelo. Não. Não faz parte dos meus planos. Disse que tenho simpatia, assim como tinha pelo PSB. Não está no meu horizonte ir para o PDT. Só vou pensar nisso depois das eleições de 2020.

Os Divergentes. O senhor pensa em criar um partido?

Aldo Rebelo. Não. O Brasil já tem partidos demais. O que vale a pena no momento é fazer o debate das ideias sobre os destinos do Brasil.

Os Divergentes. O senhor concorda de certa maneira que os partidos políticos não estão ajudando muito o País?

Aldo Rebelo. Os partidos não estão nem sendo convocados. No atual governo tem um certo desprezo pela política e nisso também não mudou muito em relação ao passado. Eu lembro quando cheguei em Brasilia como deputado como era a vida política. Tinha o governo (Collor, depois Itamar e Fernando Henrique) que tinha sempre de outro lado um jornalista, um deputado do PT e um membro do Ministério Público. Ou seja, a política era travada nas páginas dos jornais com um promotor e a judicialização da política. Sempre que se perdia uma disputa no Congresso se corria ao Supremo Tribunal Federal, que era uma erro absoluto. Um equívoco. Mas isso foi apreendido. Esta receita foi institucionalizada e unificou para todo mundo. Quando o PT chegou ao governo, a oposição do PT aprendeu o caminho. Era a mídia, o Ministério Público e o Judiciário. Agora, também não mudou. É como se houvesse a ideia e a ilusão de que o País pode ser governado sem a política. É que a política é uma coisa muito difícil. Uma vez uma cientista perguntou ao Albert Einstein: mas, mestre, o homem dominou o átomo, mas não conseguiu impedir a bomba. Einstein disse: olha, é que a política é uma ciência muito mais difícil do que a física.

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