O clã Bolsonaro entra na roda da CPI

A CPI vai investigar porque o governo virou refém do lobby dos Bolsonaros pela cloroquina

O ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, na CPI da Covid com os senadores Renan Calheiros e Omar Aziz - Foto Edilson Rodrigues/Agência Senado

Por mais que pareçam diferentes, o valor das lendas na política mal difere das crendices no dia a dia da vida de todos. O eventual êxito em cada uma delas, se o vento for a favor, vira marca registrada, carimbo de sucesso. A máxima de que se sabe como uma CPI começa e não como termina, atribuída a Ulysses Guimarães, virou apenas um bordão.

Do começo ao fim, as CPIs costumam ser previsíveis, em sua maioria manipuladas. Falo com carteirinha: como repórter, cobri todas as CPIs relevantes criadas após o AI-5 em 1968. CPI bem sucedida é caso raro. Dá para contar nos dedos. Costumam desandar pelos mais variados motivos. Em algum momento, virou um grande negócio, que cresceu sob a batuta de Eduardo Cunha, o grande maestro do Centrão.

CPI Mista do Cachoeira, em 2012: pilhas e pilhas de documentos e relatórios sobre a bancada dos parlamentares- Foto Orlando Brito

Mesmo com todas essas ressalvas, as poucas CPIs que vingaram fizeram história. A do PC Farias, tesoureiro do Caixa 2, resultou no impeachment de Collor, a dos Correios escancarou o Mensalão, e a dos Bingos, também conhecida como a do fim do mundo, chutou pau da barraca da promiscuidade vigente em Brasília.

As CPIs seguem por caminhos diferentes. Em geral, começam bem e terminam mal. Por alguma ou outra razão, tropeçam mesmo quando recebem a bola na marca do pênalti. A maioria funciona como um Var, pode começar anulando o pênalti. Segue o jogo. Quando enrosca, não vai dar em nada. É como um teatrinho para satisfazer a opinião pública até que mude o interesse para outro escândalo. Joguinho manjado, mas que costuma funcionar.

A CPI da Pandemia é uma exceção nas investigações parlamentares. Ela já começou com um roteiro de começo, meio e fim definidos. Cabe a ela apenas completar o tabuleiro. O ex-ministro Luiz Henrique Mandetta seguiu o script e pôs importantes peças no jogo. Mais do que confirmar com detalhes o que já era sabido, abriu uma brecha para a CPI investigar como as decisões, inclusive sobre saúde, são tomadas no Palácio do Planalto.

Os irmãos Carlos e Eduardo Bolsonaro – Foto Orlando Brito

Já se sabia que o clã Bolsonaro palpita, com algum poder de decisão, nas mais variadas áreas do governo, especialmente nas que sentem como ameaça. Metem o dedo em tudo. Pelo que Mandetta contou a CPI vão muito além da mão. Estavam presentes em momentos decisivos para a investigação. Carlos Bolsonaro, o Carluxo, se apresentava como um fiscal nas reuniões mais decisivas sobre o enfrentamento inicial à pandemia.

De acordo com o depoimento de Mandetta, Carluxo e seus irmãos participaram da estranha reunião em que surgiu uma minuta de um decreto para modificar a bula da cloroquina para indicá-la para o Covid-19, uma maluquice sem pé nem cabeça ali sepultada pelo presidente da Anvisa, almirante Barra Torres.

Live de Bolsonaro: fé na eficácia da cloroquina. Nem caiu de paraquedas.  Essa história da cloroquina não surgiu do nada, nem evoluiu por acaso, o que motivou todo esse empenho, até hoje defendido pela bancada governista na CPI, merece ser investigado. O país precisa de uma resposta.

Virou uma das questões centrais da CPI o porque do jogo do tudo ou nada do clã Bolsonaro na cloroquina. Parece que vai além da pura crendice.

A conferir.

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