O conglomerado comandado pelo bispo Edir Macedo — a Igreja Universal do Reino de Deus, o partido Republicanos e a TV Record — é uma mina de votos que pode ser decisiva nas eleições presidenciais de 2022. Por saber disso, Edir Macedo e sua turma já colocaram em jogo seu cacife eleitoral para a corrida ao Palácio do Planalto ano que vem.
Dessa vez, seus interesses vão além das barganhas paroquiais. Aqui têm espaço consolidado, assegurado por suas bancadas na Câmara e no Senado, que participam de todas as bases parlamentares montadas nos últimos governos. Bateram ponto nas gestões de Lula, Dilma, Temer e Bolsonaro. E sabem que estarão presentes no apoio ao próximo governo, seja qual for. O que agora mais os preocupa é a ameaça a seus interesses internacionais.
Na África, por exemplo, a Igreja Universal teve um esplêndido crescimento nas últimas décadas. Espalhou-se ali por 39 países. Não deixa de ser impressionante para uma igreja que estreou em julho de 1977 no Coreto do Méier, bairro da Zona Norte do Rio de Janeiro, criada por Edir Macedo e um cunhado. Ela também se expandiu Brasil afora e em outros cantos do mundo. Sempre envolvida em escândalos.
Mas o destino dos dízimos arrecadados que desde o início dessa escalada motivam denúncias aqui, ali e acolá, não afetou seu crescimento. Em todos os flagrantes, a ágil troca de peças minimizou os estragos. Até agora esse método de perder os anéis para manter os dedos, mesmo aos trancos e barrancos, vinha funcionando.
Deu ruim em Angola. O país rico em petróleo, com amplas oportunidades de negócios, que fala português, era um terreno fértil e lucrativo para a Igreja Universal, que construiu ali cerca de 300 templos. Era um novo paraíso até que implodiu uma briga interna entre bispos e pastores que, segundo as investigações do ministério público e da Polícia Federal de Angola, se deu entorno da divisão do suposto butim.
Segundo reportagem da BBC News Brasil, os investigadores angolanos reuniram fartas e contundentes provas de crimes como lavagem de dinheiro, evasão de divisas e associação criminosa contra a cúpula da Igreja Universal no país. Durante a apuração, foram expulsos do país 34 bispos e pastores. Seguem na mira das investigações o bispo Honorilton Gonçalves Dias, que era uma espécie de cardeal da Igreja Universal no país e ex-chefe da TV Record no Brasil; Fernando Henriques Teixeira, ex-diretor da TV Record África; o bispo Antônio Pedro Correia, representante da TV Record África e presidente do conselho da Igreja Universal em Angola; e o pastor Valdir de Sousa dos Santos.
O inquérito que vinha sendo mantido em sigilo, passa agora a ser público por entrar em sua fase judicial. O que os investigadores anteciparam aos repórteres da BBC é explosivo. O que já se sabia aqui no entorno de Edir Macedo, que motivou uma verdadeira operação de guerra. Desencadeou uma intensa pressão em Jair Bolsonaro para que a máquina diplomática conseguisse segurar as pontas em Angola. Foram partes desde pacote desde peças movimentadas nas eleições municipais à sucessão na presidência da Câmara com os Republicanos rompendo com o bloco costurado por Rodrigo Maia para apoiar a candidatura de Arthur Lira à Presidência da Câmara. E até o aceno para Bolsonaro disputar pela sigla a reeleição em 2022.
Nada disso afetou o rumo dos acontecimentos em Angola, que pode se transformar num rastilho de pólvora contra os interesses da Igreja Universal na África. Mas a canetada do ministro do STF Edson Fachin, ratificada pelo plenário do tribunal, que devolveu os direitos políticos a Lula e o excluiu da Lei de Ficha Limpa, gerou uma nova expectativa na cúpula da Igreja Universal.
Na ótica pragmática da turma de Edir Macedo, o fato de Lula e dos governos petistas terem feito parcerias com os mesmos governantes que até hoje dão as cartas em Angola poderia justificar uma mudança de rumo na sucessão presidencial. O recado chegou a todos endereçados. Mas causou forte ruído no entorno de Bolsonaro porque o voto evangélico é uma das principais apostas na cada vez mais desidratada candidatura. Daí surgiu uma ideia que poderia se contrapor ao peso da influência de Lula em Angola.
Foi a de bater na outra porta de entrada da Igreja Universal no universo africano, aberta na África do Sul — o país mais rico da região e parceiro do Brasil no Brics — sob a batuta de Marcelo Crivella, sobrinho de Edir Macedo. Que tal se Crivella voltasse para lá? Agora com o status de embaixador do Brasil, o que de quebra lhe daria foro privilegiado e e o livraria do cerco das investigações sobre corrupção em sua gestão na prefeitura do Rio de Janeiro.
Foi levada adiante apesar da contrariedade no Itamaraty. Afinal o embaixador de carreira Sérgio Danese mal se instalou no país, após seu nome ter sido aprovado ano passado pelo Senado Federal. O Planalto não está nem aí pela opinião dos diplomatas.
Esse é o jogo nos bastidores pelo apoio eleitoral no Brasil da turma de Edir Macedo que cobra retribuição política e diplomática para manter sua influência e a impunidade em suas atividades em dezenas de países africanos. Vale acompanhar esse jogo duplo.
E conferir os resultados.