Não é preciso mais do que uma conta tosca de padaria para desmontar a narrativa do governo de que o teto de gastos foi furado para beneficiar os pobres com um aumento maior do sucedâneo do Bolsa Família, o Auxílio Brasil. Não é verdade. Os pouco mais de R$ 30 bilhões da ampliação do auxílio poderiam, por exemplo, sair dos recursos destinados às emendas parlamentares – só este ano, foram R$ 37 bilhões, sendo R$ 16 bi sob o duvidoso mecanismo das emendas de relator.
Mas Jair Bolsonaro e Paulo Guedes, que agora parece ter se juntado de corpo e alma à equipe eleitoral do chefe, precisam dessa versão para não expor o que já está óbvio: sua escravidão total ao Centrão, inclusive e sobretudo na condução da política econômica. Alem de manter intactos seus recursos para emendas, os parlamentares governistas ainda terão muito mais, pois o espaço aberto no Orçamento com as gambiarras feitas vai ultrapassar os R$ 80 bilhões, turbinando emendas e obras em redutos eleitorais.
Será uma festa para a turma do Centrão. Daqui para frente, tudo será permitido para ganhar votos no ano que vem, mas não só isso.
Acima de tudo, o Planalto tenta esconder o fato de que, no estica-e-puxa que arrebentou o teto, que prevê um semi-calote nos precatórios e que quer fazer o país engolir uma reforma do Imposto de Renda considerada ruim por dez entre dez tributaristas, está a redução do presidente da República e de seu ex-czar da Economia à sua mínima expressão. Bolsonaro e Guedes são hoje pigmeus na terra de gigantes do Centrão.
O processo que vinha se desenvolvendo desde o acordo com esse grupo parlamentar que livrou Bolsonaro do impeachment, chefiado por Arthur Lira e Ciro Nogueira, acaba de se completar. O Executivo, que muitas vezes, em governos passados, cortou emendas parlamentares para tapar buracos mais importantes do orçamento, e manejou suas verbas para governar – como lhe garante a Constituição – perdeu a prerrogativa fundamental de comandar a execução orçamentária.
É simples assim: governo que não comanda a execução do orçamento – que vem aprovado do Congresso – não governa. É uma inversão no sistema presidencialista, uma mudança institucional provocada pela fraqueza política de um presidente da República que não tem liderança, projeto nem competência para administrar o país. No popular, é mais ou menos como se o cachorro deixasse de abanar o rabo e o rabo passasse a abanar o cachorro.