Tive a oportunidade, muitos anos atrás, de conversar com uma pessoa que viveu bem internamente as delícias palacianas. Era um homem com cargo de destaque e muito próximo ao presidente da república à época.
Quando trocamos impressões, eles haviam deixado o governo há pouco. Numa mesa de jantar com poucas pessoas, ele me contou: “ninguém imagina o que seja o poder”. E continuou sua reflexão, com os olhos fitando o além: “a pessoa tem de ter muito controle emocional para não sucumbir a tudo o que lhe é oferecido, qualquer desejo seu, mesmo os não revelados, são realizados. E tudo acaba muito rapidamente quando não se está mais no comando”.
Jamais esqueci dessa conversa em que ele revelou, dentre outras coisas, que, se não tiver cuidado, a pessoa esquece até de como abrir uma porta. Quando se está no poder, todas as portas se abrem sem esforço, seja isso uma metáfora ou não. Retornar ao mundo dos simples mortais é um exercício de maturidade emocional e política.
Lembro de ter lido na revista Piauí um perfil de Fernando Henrique Cardoso depois que deixou a presidência. Se não me falha a memória, ele viajou para Paris no dia seguinte à posse de Lula, após republicanamente ter passado a faixa. A matéria, muito bem escrita por João Moreira Sales, revela que FHC entrou na fila ao embarcar no aeroporto no Brasil e ao desembarcar na França, embora pudesse ter a regalia de tratamento especial. Ele dizia que queria voltar à vida normal como uma pessoa comum. Quando questionado se pensava em retornar à vida pública, com um mandato no Senado, por exemplo, ele respondeu que não teria paciência para ouvir certos discursos. (E olha que naquela época não tinha Damares e Moro como senadores).
Jamais esqueci desse perfil do FHC na revista Piauí. Ali ele fala também dos convites que recebeu para lecionar em universidades americanas e como gostava de conversar com alunos ao ter retomado sua vida acadêmica.
Gostei dessa história especialmente por gostar de pessoas que sabem virar a página. Há momentos de altos, de baixos e de calmaria. E é importante saber surfar em cada um deles.
Nunca fiz parte da turma dos inimigos do fim. Acho importante saber sair na hora certa, antes de as luzes começarem a apagar. Tudo termina, tudo passa, e como diz o ditado popular: melhor aceitar que dói menos.
Todo esse arrodeio apenas para dizer: Bolsonaro, saiba sair direito. Talvez seja sua última chance de ser elegante.