Promessas e Projetos

A história de eleições passadas revela que projetos e promessas de candidatos são como jornal amanhecido; usa-se para embrulhar peixe na feira. As promessas se repetem este ano, e o horário gratuito de TV e rádio abre espaços para mentiras gastas e desbotadas.

A história de eleições passadas revela que projetos e promessas de candidatos são como jornal amanhecido; usa-se para embrulhar peixe na feira, ou como tapete sanitário para cachorro.

Uma das promessas sistematicamente violadas é a de não abandonar o mandato pela metade, para cumpri-lo até o final, com dignidade, rigor e coragem. Também no Senado o solene compromisso é esquecido, quando se transfere a cadeira senatorial ao suplente – alguém desconhecido e sem votos – para assumir ministério.

Luiz Felipe D’Ávila, Lula, Simone Tebet, Jair Bolsonaro, Soraya Thronicke e Ciro Gomes durante debate na Band – Foto Reprodução Tv Band/Canal Uol

O perverso fenômeno das promessas se repete nas eleições deste ano. Não bastassem debates e entrevistas dominadas por manipulações de dados e fantasias, o horário gratuito de televisão e rádio abre espaços para mentiras gastas e desbotadas.

O País está em crise. O desenvolvimento foi interrompido há décadas. Há desemprego, expansão da informalidade e do bico, ou contrato intermitente, acompanhados pelo recrudescimento da inflação, aumento da taxa de juros, elevação geral dos preços e do custo de vida. Apesar de advertências vindas da natureza, a devastação da Amazônia prossegue sem enfrentar resistência, rios caudalosos perdem volume d’agua, longas temporadas de seca anunciam o avanço da aridez em terras antes conhecidas pela fertilidade.

Manisfestantes pró e contra Lula fazem protesto na frente do Supremo Tribunal Federal – Foto Orlando Brito

Lulistas e bolsonaristas antecipam final de campanha dominado pela violência. Perderam a noção de civilidade. Lula discursa para boquiabertos fanáticos tendo ao lado o apático Geraldo Alckmin, um dos adversários mais venenosos em recente passado. Procede como se não houvesse Operação Lava Jato, delações homologadas, desvios de dinheiro público, escândalos no Banco do Brasil, nos fundos de pensão, na Petrobrás, condenações em várias instâncias, sempre por unanimidade.

Jair Bolsonaro – Foto Orlando Brito

Jair Bolsonaro tenta se reeleger após quatro anos de governo controvertido. Pesquisas de opinião pública revelam alta taxa de rejeição, por ele próprio incrementada. A economia, entretanto, indica tendência à recuperação. O Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 1,2% no segundo semestre. Após muitos anos, o mercado de trabalho apresenta índices positivos. Ignora-se, contudo, se a evolução do quadro econômico conseguirá reverter o quadro que lhe é desfavorável. Ciro Gomes e de Simone Tebet não dispõem de tempo para ganhar apoio entre eleitores cujas decisões estão tomadas. Salvo acontecimento inesperado, disputarão o terceiro lugar. Luiz Felipe d’Ávila aguardará por nova oportunidade.

Auxílio Brasil – Foto Divulgação/Ministério da Cidadania

Como sempre, o ponto fraco da campanha reside no excesso de promessas e ausência de projetos adequados à realidade. Não se compram papel higiênico, pó de café pacote de papel A4, nem se constroem hospitais e estradas, se não houver dinheiro em caixa. O orçamento de 2023 está comprometido. O endividamento público é colossal. Os pobres sabem que será difícil manter o valor do Auxílio Emergencial. O Fundo de Financiamento de Campanha e o orçamento secreto consumiram as últimas reservas. Todos, entretanto, garantem, reverter a crise nos primeiros meses de governo, como se o Tesouro Nacional fosse inesgotável.

Lula – Foto Ricardo Stuckert/Divulgação PT

Lula promete recuperar hipotético paraíso perdido. Esquece que, durante 13 anos do PT à frente do governo, houve desindustrialização, doença, violência, corrupção, fome, pobreza, malversação do dinheiro público. Ciro Gomes imprimiu o projeto de governo em livro adquirido por cerca de 200 mil eleitores. Quem o leu? Com duas notas públicas resolverá o dilema Petrobrás, cujo defeito seria o de render dividendos para acionistas, o maior dos quais é a União. Com aprovação do Código de Trabalho em seis meses, garante que exterminará milhões de conflitos gerados à sombra da octogenária CLT, e afastará o temor pânico do empresariado, que adota soluções robóticas e eletrônicas para não ter empregados.

Senadora Simone Tebet – Foto Orlando Brito

Um pouco mais contida, Simone Tebet também promete. Acredita que bastará apoio feminino para fazer as mudanças educacionais, culturais, políticas, sanitárias e econômicas, indispensáveis. Às mulheres garante equiparação salarial mediante lei. Ignora que a desigualdade não resulta da ausência de legislação. Afinal, o art. 7º, XXX, da Constituição, proíbe diferença de salários por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil, dispositivo que encontra ressonância no art.  461 da CLT, vigente há quase 80 anos.

Eleitor, se acautele. O voto livre, inalienável e consciente é a arma de que você dispõe para exercer o poder. Para que isso aconteça, deverá estar bem representado. Lembre-se do ditado: promessa de político só vale para quem acredita.

 

– Almir Pazzianotto Pinto é Advogado. Foi Ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior do Trabalho

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