De qual direita a nossa esquerda gosta?

A inevitável aliança com partidos políticos, engendrada pelo novo Governo, foi ampla, compondo um leque que abrange toda a esquerda e boa parte da direita. Esta amplitude política é necessária?

Foto oficial na cerimônia de posse do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, no Palácio do Planalto, em 1º de janeiro de 2023 - Foto: Tânia Rego / Agência Brasil

Olhando a relação dos ministros do próximo governo Lula, consta a participação de 9 partidos. Como o Podemos foi convidado a participar e não aceitou, concluo que só o PL, partido de Bolsonaro, não poderia, por óbvio, fazer parte do novo governo Lula.

O gaúcho Leonel Brizola foi governador pelo Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro – Foto: Orlando Brito

Lembrei do ex-governador Brizola, que, ao rivalizar com a própria esquerda, dizia: “Essa é a esquerda que a direita gosta…!”.  Como, em nome da governabilidade, a esquerda precisa compor com a direita, me pergunto de qual direita a nossa esquerda gosta. Sim, assim como tem muitas esquerdas também tem muitas direitas.

Tradicionalmente, tínhamos basicamente duas esquerdas, a revolucionária e a reformista. O reformismo visto com desconfiança pela nossa esquerda. O PSDB tentou ser um partido reformista, social-democrata, mas, hoje, ironia da história, essa característica está passando para o seu concorrente, o PT.

O regime militar no Brasil estendeu-se de 1964, ano do golpe de Estado, a 1985, com a eleição de Tancredo Neves pelo Parlamento – Foto: Orlando Brito

Depois do regime militar a direita ficou, digamos, enrustida, encabulada. Hoje não, temos agora uma direita assumida e uma extrema-direita militante, barulhenta. Os liberais, que na América Latina, por terem se aliado com as piores ditaduras, não são vistos como progressistas. Mas, agora, existe também o liberalismo popular, tanto é que economistas liberais têm feito parte de governos do PT. O Programa Bolsa Família é tipicamente liberal. Tem a direita conservadora, atormentada com a pauta identitária ou dos costumes. E tem aquela direita autoritária, extremista, que tem horror a toda e qualquer pressão ou reivindicação popular.

Valdemar Costa Neto é o principal líder do PL, partido que abriga o ex-presidente Jair Bolsonaro – Foto: Reprodução / Twitter

O governo Lula claro precisa compor, mas não precisava tanto ministro: 37. Então, o presidente, além de se entender diretamente com 9 partidos e indiretamente com os demais partidos aliados, precisa cuidar também de 37 ministros! Dos 23 partidos da próxima legislatura, poucos vão ficar fora da base aliada e, com as próximas fusões, talvez apenas o PL e mais um ou dois ficarão de fora do governo.

É muito partido para governar!

Governador do Paraná, Ratinho Junior (PSD), apoiou o presidente Bolsonaro, que concorreu à reeleição – Foto: Arquivo

Assim, na prática os interesses programáticos não contam, sobra apenas a negociação de interesses específicos e de arranjos para se chegar à tal da governabilidade. Felizmente, a cada eleição o número de partidos no Congresso está se reduzindo graças à crescente cláusula de barreira para acesso ao fundo partidário. A definição ideológica e programática dos partido s deverá ficar com o tempo mais clara aos olhos dos eleitores.

O PSD, do governador Ratinho, que se manteve neutro na campanha para presidente, tem agora três ministérios, inclusive o da agricultura que muito interessa ao Paraná. É um partido de direita que, agora “lulando”, tende a ir para o centro. Falta, sem dúvida, um partido do chamado centro democrático. Será que o PSB vai agora, tendo a vice-presidência, puxar “essa direita que a esquerda gosta…”?

* Christophe de Lannoy é eng. agr., mestre em Desenvolvimento Rural. Presidente da Cooperpinhais 

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