A segunda intervenção em São Paulo

As eleições deste ano, em São Paulo, repete os fatos de 1930. O vazio de lideranças, provocado pelo declínio do MDB e do PSDB, provoca o ressurgimento do PT, com Fernando Haddad, e a candidatura de Tarcísio de Freitas, imposta por Bolsonaro.

Getúlio Vargas e sua comitiva, após obter êxito na Revolução de 1930 - Foto Claro Jansson

Vitoriosa a Revolução de outubro de 1930, e deposto o presidente da República Washington Luís, no dia 11 de novembro a chefia do Governo Provisório é assumida por Getúlio Vargas.

Tenente João Alberto Lins de Barros

O golpe pôs abaixo a Constituição de 1891. De imediato, Vargas dissolveu o Congresso Nacional, as assembleias estaduais, afasta governadores e prefeitos, substituídos por interventores de sua confiança, exceto o presidente de Minas Gerais, Olegário Maciel, mantido à frente do governo. Para o Estado de São Paulo nomeou como delegado-militar e depois interventor o tenente João Alberto Lins de Barros, natural de Olinda (PE), um dos líderes revolucionários. Preteriu o advogado piracicabano Francisco Morato, fundador do Partido Democrático, integrante da Aliança Liberal.

São fatos que pertencem à História. João Alberto, como intruso, enfrentou forte resistência paulista. Isolado politicamente e incapacitado para governar, pediu demissão em 24 de julho de 1931, sendo substituído por Lauro de Camargo, natural de Amparo. Em 9 de julho de 1932 São Paulo se levantou contra Vargas em luta armada, pela redemocratização do País.

As eleições deste ano são, em São Paulo, grosseira tentativa de repetição dos fatos de 1930. O vazio de lideranças, provocado pelo declínio do MDB e do PSDB, provoca o ressurgimento do PT, com Fernando Haddad, e a candidatura de Tarcísio de Freitas, natural do Rio de Janeiro, capitão da reserva do Exército, ex-diretor do Departamento Nacional de Infraestrutura e Transportes (DENIT) no governo Dilma Roussef, e ex-ministro da Infraestrutura do governo Jair Bolsonaro.

Ex-ministro Tarcísio de Freitas – Foto Orlando Brito

Nasceu a candidatura de Tarcísio de Freitas maculada por falsa declaração de domicílio eleitoral. Todo o Vale do Paraíba e as pistas da Via Dutra sabem que S. Sa, jamais residiu em São José dos Campos. Seu domicílio era Brasília, onde morava há anos, por exigências familiares e de caráter profissional.

A culpa, todavia, não cabe ao candidato Tarcísio. Indicado por Jair Bolsonaro sujeitou-se à determinação do comandante. Disputará, com o seu apoio e o de Gilberto Kassab, personagem que retratei no artigo “Partidos, polvos e camaleões” (O Estado, 14/3, A4), o governo do nosso maior, mais rico e mais desenvolvido estado, com a missão de puxar votos para o chefe.

A responsabilidade recai sobre a elite política bandeirante, que, desde a presidência de Fernando Henrique, não dispõe de nomes de primeira grandeza no cenário nacional. Geraldo Alckmin, de Pindamonhangaba, quando tinha praticamente assegurada a volta ao Palácio dos Bandeirantes, renegou o passado emedebista e tucano para se deixar seduzir por Lula. Aceitou ser o candidato à vice-presidente do figadal adversário, talvez com a promessa de vir a ser o seu sucessor.

Presidente do MDB, Baleia Rossi – Foto Orlando Brito

O jovem presidente nacional do MDB, deputado federal Baleia Rossi, não parece empenhado em assumir posição de liderança. Indica estar satisfeito em lugar secundário. Dizem os jornais que pretende entregar ao PSDB a coordenação da campanha de Simone Tebet à presidência da República. Gilberto Kassab é hábil articulador, mas desprovido de coluna vertebral. Está sempre à espreita da melhor oportunidade. Prefere agir nos bastidores usando o seu Partido Social Democrático (PSD), “nem de esquerda, nem de direita, nem de centro”, como moeda de troca por cargos. Márcio França desistiu, desalentado pelas pesquisas e com a promessa de ser candidato a senador. O ex-governador João Dória foi abatido na decolagem, por adversários dentro do PSDB. Rodrigo Garcia, que o substituiu, ainda busca o apoio do interior, para assumir a dianteira e vencer a disputa.

Franco Montoro no Palácio dos Bandeirantes, em São Paulo – Foto Orlando Brito

Quando o regime militar se sentiu obrigado a restabelecer as eleições diretas para os governos estaduais, em todo o País brotaram lideranças. Algumas novas, outras antigas. Todas, porém, dotadas de coragem para a luta contra a ditadura. Nas eleições de 1982, Franco Montoro, do PMDB, derrotou os adversários por larga diferença. Administrou a explosão social, deflagrada na gestão do presidente João Figueiredo, com sabedoria e equilíbrio, ciente de que era parte do custo da reconstrução democrática.

Fernando Haddad foi prefeito da Capital. Ocupa o primeiro lugar nas pesquisas.

Fernando Haddad e lula – Foto Ricardo Stuckert/PT

Não é desconhecido. Lula e Haddad se auxiliam mutuamente. Não será surpreendente a sua eleição, ainda que por escassa diferença de votos. Tarcísio de Freitas é considerado bom planejador e executor de obras. Ignora-se, contudo, o seu perfil de administrador público.

São Paulo, com 44,14 milhões de habitantes distribuídos em 645 municípios, cujo PIB corresponde a 31,2% do PIB nacional, enfrenta problemas de desindustrialização, de desemprego e de pobreza. Necessita de político cuja especialização não se limite à construção de estradas, sem experiência em administração e finanças públicas e na solução de questões como saúde e educação.

– Almir Pazzianotto Pinto é advogado. Foi Ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior do Trabalho

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