Juros baixos dependem, primeiro, da confiança no comando da economia

Até aqui, os sinais de quem manda na economia - leia-se Lula - não ajudam na redução da Selic, desejo do setor produtivo. Sem contas públicas no prumo, o BC não vai arriar

Quem quer juros altos?
Luiz Inácio Lula da Silva, presidente do Brasil, quer o fim do  Banco Central independente – Foto: reprodução

O Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, tem todo o direito e dever de se preocupar com os efeitos das elevadas taxas de juros sobre a atividade econômica do Brasil. As atuais taxas de 13,75%, fixadas pelo Banco Central (BC) para controlar a inflação, se mantidas neste patamar em 2023, vão contribuir para retrair ainda mais o crescimento da economia, que deve ficar em torno de 1% do Produto Interno Bruto (PIB).

Lula da Silva sabe que um crescimento robusto da economia é condição primeira para aumentar o poder de compra da população, geração de emprego, ganhos de arrecadação de impostos para fazer frente às promessas de campanha de aumento real do salário mínimo, isenção de até R$ 5 mil de Imposto de Renda dos assalariados e combate à pobreza. Os juros altos são uma pedra no caminho do governo de Lula difícil de ser removida pelas circunstâncias da política monetária e fiscal do País.

Independente pra quê? 

Sede do Banco Central, na área central da capital da República

Em dois momentos neste primeiro mês à frente da Presidência da República, Lula criticou as elevadas taxas de juros, a volatilidade de câmbio e a necessidade de avaliar a autonomia do Banco Central. O recado a diretoria do Banco Central pela imprensa acaba piorando o ambiente e condições para que os juros possam cair.

Um fator fundamental para sucesso  de qualquer Banco Central do mundo e a confiança dos agentes econômicos nas medidas adotadas pelas autoridades monetárias. A perda da credibilidade dos atuais dirigentes do BC traz um prejuízo imenso ao esforço de  controle da inflação, da estabilidade da moeda e funcionamento do sistema financeiro.

Alexandre Padilha é o ministro das Relações Institucionais, a ponte entre o Governo Federal e o Parlamento

A primeira manifestação pública de Lula cobrando queda de juros abalou a credibilidade da autoridade monetária e deixou o mercado preocupado com a interferência política do Presidente da República no BC. Diante da repercussão negativa, o ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, teve que fazer uma declaração em nome governo dizendo que diretoria do BC é independente para conduzir a política monetária.

Que tal conversar tête-à-tête?

Pela atual legislação, o Presidente da República não tem poderes para dar ordem direta ao presidente do BC. No entanto, Lula poderia chamar Roberto Campos Neto ao Palácio do Planalto e manifestar sua preocupação com os efeitos das atuais taxas de juros sobre a economia. Roberto Campos Neto, que já reduziu a taxa Selic a 2% no governo de Jair Bolsonaro, diria que redução dos juros depende de um esforço fiscal do Tesouro Nacional, redução dos preços das commodities e do comportamento da inflação.

O lugar para a voz do Presidente da República ter efeito sobre queda dos juros é no Conselho Monetário Nacional (CMN), onde são definidas as metas da inflação que o BC deve buscar. Para uma meta da inflação mais alta, os juros podem ser menores.

O governo de Lula poderia, sim, contribuir de fato com redução de juros fazendo o que está ao seu alcance, que é reduzir o déficit público. Quanto maior for o ajuste fiscal, melhor serão as condições para o BC iniciar um processo de queda dos juros.

Receita lulista para o crescimento 

Antonio Palocci foi ministro da Fazenda do primeiro Governo Lula – Foto: Orlando Brito

A realidade é que Luiz Inácio da Silva que, de fato, pegou gosto pelo comando da economia desde quando Antonio Palocci deixou o Ministério da Fazenda, acredita que a retomada do crescimento da economia deverá ocorrer com a elevação do gasto público, ampliação do crédito, aumento do salário mínimo, retomada das obras do PAC e os efeitos em cadeia no setor produtivo dos investimentos das empresas estatais, como a Petrobras.

A receita deu certo nos seus dois primeiros governos: com injeção de recursos públicos no PAC e aumento das linhas de crédito ao consumo pelos bancos, a economia cresceu, houve geração de empregos e renda, a dívida pública em proporção do PIB caiu. Só que o esgotamento deste modelo ocorreu no governo de Dilma Rousseff.

Luiz Inácio Lula da Silva pegou uma herança maldita na área econômica de um desequilíbrio orçamentário para 2023 de mais de R$ 100 bilhões, inadimplência recorde das famílias, dívida pública perto de 80% do PIB, sem falar nos efeitos da inflação sobre a capacidade de compra da população. Não há dúvida que é importante a redução dos juros pelos efeitos perversos sobre o estoque da dívida do Tesouro Nacional e do crédito para o setor privado. Juros menores são sinais importantes, mas estão muito longe de garantir a retomada do crescimento por si só.

Receita campista para o crescimento 

Roberto Campos Neto, independente por força de lei, define a Taxa Selic, referência para toda a economia brasiliana – Foto: Raphael Ribeiro / BCB

Roberto Campos Neto conseguiu trazer a taxa Selic para 2% ao ano no governo de Jair Bolsonaro, sem que a economia voltasse a crescer. Se reduzisse novamente hoje os juros neste patamar, haveria implicações desastrosas para economia. Os detentores de um crédito junto ao Tesouro Nacional, de RS 5,8 trilhões, não iriam aceitar rolagem desta dívida pública com juros abaixo da inflação. O Tesouro Nacional não teria recursos para resgatar a dívida, o que resultaria em um calote generalizado.

Por outro lado, são duvidosos os benefícios da queda dos juros no custo  final para um tomador de crédito. O spread bancário e o risco de inadimplência tenderiam a aumentar em função da inflação alta. Os juros baixos  trariam  também um impacto sobre o câmbio. O real sofreria desvalorização diante do dólar. Haveria um estímulo às exportações com risco de desabastecimento de alimentos, como a carne, e aumento dos preços de todos os produtos importados. Este processo de desvalorização cambial levaria a uma pressão inflacionária.

A retomada do crescimento, como Lula deseja, depende do conjunto da obra, não só de juros baixos, mas de outros fatores: ajuste nas contas públicas, combate à inflação, investimentos públicos e privados, além da confiança nos comandos da política monetária, pelo Banco Central, e fiscal, pelo Governo.

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