A polarização é real. Suas ondulações não raro falseiam fatos e versões, fazendo parte de um jogo político pouco favorável para fazer avançar a política. Candidatos blefam e seus exércitos de seguidores replicam o blefe, apostando numa vitória no primeiro turno. Improvável e indesejável. Como assim?
BOLSONARO não reverte a rejeição brutal nem ultrapassa o seu teto de 35% dos votos; LULA não logrará diminuir a abstenção, levando jovens, mulheres e idosos a votar dia 02 de outubro, tampouco ampliará a diferença de hoje sobre Bolsonaro (12 a 15%). Muitas deverão ser as surpresas e os institutos de pesquisa terão, enfim, o acerto de contas com a certificação da ciência ou do embuste.
Uma vitória no primeiro turno seria nociva para o Brasil, ou, melhor, para o Centrão, seja lá quem liquide a fatura. Uma verdade precisa ser dita sobre o Centrão, esse bode da vez. O Centrão exerceu papel importante desde Tancredo, se formos analisar votação a votação no Congresso. Obviamente, esse papel teve um preço. Sempre tiraram leite da vaca, mas não mataram a vaca.
Acordos como os que permitiram Lula chegar ao poder e os contextos que levaram Bolsonaro a vencer não serão repetidos. Deram no que temos hoje, uma política quase sem política. Um pêndulo entre descrença e apatia quanto às questões públicas e progressiva rivalidade passional com amor incondicional por líderes populistas.
À retórica dos extremos o mercado responde com uma exigência à classe política: a de urgente estabilidade para fazer o país crescer mais, com desenvolvimento social. Já se sabe que o Brasil é muito maior que suas elites de todas as cores, e vai dar certo, independente de ser fulano ou beltrano o presidente.
Ciro Gomes e Simone Tebet prestam um inestimável serviço ao país ao permitir uma reconfiguração mais ampla de forças para o segundo turno, e para a governabilidade redefinida, pra melhor. O Centrão será mais centro nas alianças de Lula e Bolsonaro. Este colocando a liberdade na sua pauta e aquele reconsiderando o papel dos grandes produtores rurais. Ciro Gomes possui boas ideias e programa sólido de governo. Simone Tebet ajudará a acalmar o agronegócio.
Mas sem ilusões, por favor. Todos querem “negociar” melhor as coisas dentro dum segundo turno. Qualquer dos dois a vencer será marionete do Centrão, então a diferença será mais discursiva, embora sob maiores filtros fora dos extremos.
Não haverá saídas extremas para o Brasil, sejam de esquerda, sejam de direita.
Esse movimento do pêndulo, ora mais à direita, ora mais à esquerda, significa a vitória da própria democracia, malgrado ressentimentos alimentados pelos salvadores da pátria. Bolsonaro e Lula vão adequando suas falas a outros auditórios que não são os seus.
O segundo turno reafirmará a existência de ambos, esquerda e direita, naquilo que delas há de melhor, pautas por mais igualdade (contra todas as formas de desigualdade) e por mais liberdade (contra todas as formas de iniquidade).
O jogo de truco é um autoengano. Blefes podem fazer parte do jogo e ajudar na disputa de forças, mas não substitui de maneira segura a arte de compor para governar.
– Edmundo Lima de Arruda Jr