Presidentes e ditadores, e não só aqui no Brasil, sempre tentaram fazer do esporte plataforma para seus projetos de poder, gangorras para sua (im) popularidade e trampolins festivos para fases críticas da vida nacional. Claro, desde que o time ganhe. Alguns clássicos são Pelé erguendo a taça Jules Rimet ao lado do General Emílio Garrastazu Médici após vencer a Copa de 1970; Jorge Rafael Videla com os jogadores argentinos, em 1978, com o país dividido entre a cruel ditadura militar e o êxtase por sediar uma Copa do Mundo; e Hitler e os Jogos Olímpicos de 1936, inaugurados pelo próprio Führer, em Berlim, com um imenso potencial como arma de propaganda, mas que não contava com a superioridade do negro do Alabama Jesse Owens, que bateu quatro recordes olímpicos. No Brasil de Temer 3% – não, não é a série da Netflix, essa é a popularidade residual do nosso estadista -, o país vive, como no paradoxo de 70, uma relação curiosa. (Quase) todos querem que o Brasil ganhe o Hexa, qualquer que seja a camisa que se vista, mas ninguém acredita que o escrete, por mais protocolar que seja, vá fazer, no pós-Copa, um mise en scène no parlatório do Planalto ao lado de Temer, Padilha, Moreira, Marun e a república tosquiada do MDB.
Não apenas por aqui, mas a visita da seleção brasileira vencedora de uma Copa do Mundo virou tradição desde a dobradinha Médici-Pelé-Jules Rimet. Só sobrou a reputação de Pelé nessa história, felizmente. A Jules Rimet foi roubada e derretida e Médici e os generais ditadores só remanescem em sonhos de bolsominions. Em 1994, não se fugiu da regra: a seleção tetracampeã visitou Itamar Franco. E em 2002, o técnico Felipão levou a seleção brasileira que conquistou o pentacampeonato mundial ao então presidente Fernando Henrique Cardoso. Vestindo um casaco verde, uma calça azul e uma camisa xadrez amarela, FHC autografou algumas bandeiras levadas pelas dezenas de torcedores que aguardavam o pronunciamento. Na memória, ficou a cambalhota de um jogador mediano, Vampeta, autor da manobra a la Cirque du Soleil na rampa do Palácio do Planalto. Melhor lembrar dos gols – mesmo que de pênalti.
Então, torçam, brasileiros, torçam com vontade, com a amarelinha, a azulzinha, a branquinha – hoje tão esquecida -, a vermelhinha – que parece a camisa do América do Rio do grande Trajano -, com a camisa do Flamengo, líder do Brasileirão, do Barcelona ou a velha camisa russa CCCP – como alguns amigos pretendem homenagear a pátria soviética. Ninguém vai torcer menos para o Brasil, independente da segunda pele que veste. Entender isso é, nesses tempos cascudos, apenas praticar o bom esportismo, a tolerância e o respeito ao próximo. Mas isso, reconheço, anda difícil. Se você quer vestir a camisa amarela, vista. Danem-se os “patos paneleiros”. Dane-se a Cristiane Brasil – impedida de assumir Ministério do Trabalho e alvo de processo trabalhista, que votou sim para derrubar a Dilma com a camisa do Brasil nessa Copa do Mundo. Sinta vergonha alheia, mas não sinta vergonha da nossa seleção. Enfim, recomponha-se.