Não me perguntem que país é esse – mas seu estrato nas redes sociais, que são a voz filtrada e possível de ser ouvida de um povo muito esquisito, ou seja, nós – beira o non sense e o universo paralelo. Todos sabem, a essa altura, no oitavo dia de greve – que, além de sermos o país do meme e de, felizmente, ainda termos a capacidade de rirmos da nossa desgraça, que Temer perdeu completamente a capacidade de governar. A república do PMDB e agregados – os fiapos políticos Temer, Jungmann, Marun, Padilha, Moreira e os fardados Joaquim Silva e Luna e Sérgio Etchegoyen – já é tratada, no caleidoscópio das redes sociais, como uma espécie de governo de mortos vivos. As panelas bateram timidamente enquanto Temer capitulava ao vivo no Fantástico, entregando anéis e dedos, carpos, metacarpos e falanges. Mas o corte de 46 centavos por litro do diesel cobrado direto na bomba, entre outras concessões – todas interessantes para os donos do negócio, e encampadas, cordeiramente, por quem está na boleia -, não surtiu efeito imediato, como já se percebe. A greve pode acabar nas próximas 24 ou 48 horas, mas o governo já acabou. Nem será preciso uma sequência de novas greves, ou uma greve geral para fazê-lo despencar no terceiro andar do Palácio do Planalto. Já caiu. A dúvida é apenas se chega ao fim do mandato – Meirelles devia tirar férias permanentes em Genebra – ou se o país partirá para uma ruptura. As redes sociais refletem esse brainstorm sem genialidade.
Não é que Temer não seja Lula, o ex-presidente e líder sindical preso, que já estaria a essa hora abraçado nos caminhoneiros, tomando chimarrão e, quem sabe, uma pinga – não darei o gosto dessa comparação, não agora -, é que Temer não percebeu, desde o início, que seria preciso uma voz carismática, que nunca teve, e uma compreensão da multiplicidade de vozes nas estradas – os chamados caminhoneiros autônomos, sabe-se lá quantos entre os 700 mil que teriam aderido ao bloqueio, e que se transformaram em centenas de líderes postando vídeos país afora. “Cada bloqueio tem seu líder”, explicou um deles a Josette Goulart, da Piauí, que acompanhou alguns dos grupos de WhatsApp. Acompanhei dezenas de vídeos no Youtube sobre o assunto, e o diagnóstico é parecido. Nesse país flertando com o caos, pipocam a todo instante vídeos com centenas de milhares de visualizações – entre 200 mil e 500 mil -, postados por caminhoneiros anônimos, ou porta-vozes de caminhoneiros. E tente buscar coerência entre eles, embora haja pontos de contato.
Coisas do mundo virtual, o personagem mais defenestrado nos vídeos é Rachel Sheherazade, apresentadora do SBT e musa da direita, que usou um vídeo para criticar duramente o movimento. “O que querem os caminhoneiros com essa greve absurda?”, pergunta ela. Em todos os vídeos há uma evidente politização do movimento, por parte dos caminhoneiros, de forma autêntica e não manipulada, que, ao perceberem sua força, deixam de falar só em preços do diesel e pedágios. Falam de basta na corrupção e, nesse caso, “fora Temer”. Não vi um único vídeo criticando o PT ou Lula. Mas tampouco vi #lulalivre. De um modo geral, são vídeos, do meu ponto de vista, preocupantes. Não mostram desesperança, mas mostram esperança…na coisa errada. Esse estranho viés de intervenção militar não soa bem. A idiotice está bem resumida num vídeo de um certo Sargento Roseno, fardado para a guerra, que, do banco de trás de um carro – esse pelo menos tinha combustível – diz que o ministro da Defesa foi encurralado pelos caminhoneiros e que “o ferro pode entrar a qualquer momento”. O post está no canal JefãonoFuscão e tem quase 500 mil visualizações. Qualquer que seja a solução dos próximos dias, essa é a pior, disparado. Ah, e o vidente paranaense Carlinhos, com 400 mil visualizações, garante que Temer não fica até o fim.