O fumacê de Temer

Michel Temer, presidente da República
Michel Temer

A mídia – o novo velho jeito de se referir à imprensa – cobre, com uma seriedade quase senil, os últimos lances da mãe de todas as reformas, a que tira direitos dos velhos, mesmo que até o tapete verde do Congresso saiba que nada será votado este ano. E dificilmente será bandeira de um novo governo, que não quer começar levando bengaladas. Não por algum escrúpulo, mas por já não interessar à base gulosa – novo jeito de chamar a velha fisiologia – que já mira as urnas de outubro. Em sua mensagem ao Congresso, nossa versão chinfrim do “State of the Union”, Michel Temer afirmou que “consertar” a Previdência Social é a “tarefa urgente” do momento. Ele devia ter guardado essa frase lapidar para o auditório do Silvio Santos. Ali receberia aplausos e, quem sabe, uns aviõezinhos de dinheiro. Seria impossível resistir a tamanha sacada, ainda mais dita com o carisma que lhe é peculiar.

É o “State of the Unicorn” de Michel Temer, o mundo encantado em que vive o presidente. Lágrimas devem ter vertido de seus olhos quando escrevia a cartinha ao Congresso, entre talagadas do melhor uísque do Planalto, no cowboy preparado por Eliseu Padilha.

Na semana passada, Temer já havia repetido a ladainha de que ainda não “jogou a toalha” pela aprovação da proposta, alimentando com alpiste os colunistas que insistem que a reforma “possível” deve ser colocada em votação ainda em fevereiro, mesmo com chance de derrota. Nem o espartilho de Temer, o único que sabe onde a coisa lhe aperta, acredita nisso.

Temer, como todo patriota, só pensa no bem do país. Se ainda não existe uma estátua dele em algum lugar é porque o povo ingrato e sem visão histórica, o mesmo que lhe achata a popularidade como quem apaga bituca de cigarro, só sabe erguer homenagens tardias. Até a tatuagem de Wladimir Costa era de henna.

Quando Temer já tiver deixado a Presidência, e puder dedicar mais tempo a pensar em como se desenrolar do Porto de Santos e do Aeroporto de Guarulhos, aí sim, o prefeito de alguma Sucupira, cansado de esperar por enterros, inaugurará um grande busto de bronze do nosso estadista.

A votação da reforma está marcada para o próximo dia 19. Rodrigo Maia, o presidenciável de araque cuja principal função é preparar a candidatura do pai César ao governo fluminense, tem feito de tudo para fingir que, por ele, a reforma da Previdência já seria até ópera rock na Cidade da Música, o elefante pálido erguido pelo alcaide doidinho no trecho mais engarrafado da Barra da Tijuca. Tudo tão verdadeiro quanto a claque depilada no barquinho de Cristiane Brasil.

Há quanto tempo você lê que a proposta precisa do apoio mínimo de 308 dos 513 deputados, em duas votações , mas que líderes da base dizem que o governo conta com “cerca de” 270 votos atualmente. Esses 270 votos devem estar congelados em tubos de nitrogênio para se preservarem dessa forma. É a criogenia política a serviço do nada.

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