Trabalho intermitente agrega à CLT contrato que já vigora em todos os continentes

Colaboração de Paulo Solmucci para Os Divergentes

Pode ser que a Câmara dos Deputados vote, ainda antes do recesso de 23 de dezembro, o
projeto de lei que cria o contrato do trabalho intermitente. Se isso não ocorrer até lá, é certo
que irá ao plenário no primeiro semestre de 2017, após o reinício das atividades legislativas,
em 2 de fevereiro. O seu trâmite recebeu a classificação de regime de urgência. Só não foi ao plenário antes da abertura da Olimpíada, como se desejava, em função do conflituoso
processo do impeachment, que chegou ao seu final no dia 31 de agosto. No Senado, há um
segundo projeto semelhante, apresentado por Ricardo Ferraço (PSDB/ES). Está sendo
examinado na Comissão de Assuntos Sociais.

O primeiro projeto de lei do trabalho intermitente nasceu há quatro anos, em 2012, por
iniciativa do deputado Laércio de Oliveira (SD-SE). Desde então, foi objeto de debates na
Comissão de Turismo da Câmara Federal e em reuniões da frente parlamentar que defende o
comércio e os serviços, cujo encontro mais recente foi o de 5 de julho deste ano, com a
presença de 51 deputados e, também, do ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira. A
aceitação da proposta tem sido unânime. Vem recebendo calorosa recepção no parlamento,
no governo Temer e, ainda, na Justiça do Trabalho.

Diz, por exemplo, o juiz Felipe Calvet, da 8ª Vara do Trabalho de Curitiba: “O trabalho intermitente é um projeto de lei muito interessante. Trará segurança jurídica tanto ao
empregado quanto ao empregador. Será muito bom, porque não deixará aquela zona cinzenta da legislação de 1943, feita em uma época em que não tínhamos a necessidade desse trabalho intermitente. Não vai flexibilizar, não vai tirar direito dos trabalhadores. Vai trazer direito aos trabalhadores, que hoje acabam ficando na informalidade por falta de legislação”. O juiz Felipe Calvet assegura que “não se trata de alteração” na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), promulgada em primeiro de maio de 1943. “É, na verdade, uma inovação legislativa para uma realidade que surgiu décadas depois. É um acréscimo, não uma flexibilização”.

O trabalho intermitente permite ao contratante e ao contratado a formalização de horários específicos de trabalho, em escala móvel. Assim, um estudante consegue ajustar as suas agendas da escola e do trabalho, além de reservar um tempo para as lições de casa e o descanso. Por exemplo: pode trabalhar determinadas horas das manhãs das segundas-feiras ou das tardes de quinta, optando, se assim desejar, por uma jornada integral aos sábados. Os brasileiros que estudam ou residem no exterior se beneficiam desta maleabilidade. É uma forma de contrato que vigora na grande maioria dos países dos continentes da América, Europa, Ásia e Oceania. No Brasil, porém, os contratos permaneceram no formato de tamanho único, ao longo dos últimos 73 anos.

Por falta da formalização legal da modalidade de trabalho por horas pré-contratadas, as empresas de eventos têm sido indiscriminadamente multadas. Na Olímpiada, foram aplicadas 500 multas. Portanto, aconteceu o que o próprio governo federal já temia. Os empreendedores de todos os grandes eventos estão suscetíveis a tais penalidades, em face da insegurança jurídica gerada pela inexistência de um contrato que regule o trabalho intermitente, caracterizado pela escala móvel. Na edição de 2016 do Rock in Rio, as multas somaram R$ 20 milhões. O ministro Ronaldo Nogueira diz que a legalização ajudará a diminuir o trabalho informal no país, que hoje atinge a 12 milhões de pessoas.

Estima-se que o trabalho intermitente criará dois milhões de novos empregos formais, com todos os direitos assegurados: férias, décimo-terceiro, fundo de garantia etc. “Esse trabalhador precisa ser trazido para a formalidade, por meio de um contrato específico, que ofereça fidelidade na relação entre o que contrata e o que é contratado”, afirmou o ministro
Ronaldo Nogueira, em reunião da frente parlamentar do comércio e dos serviços, presidida
pelo deputado Rogério Marinho (PSDB/RN).

É consensual entre os parlamentares e ministros o claro entendimento de que a inexistência do contrato de trabalho intermitente, na CLT, gera extrema insegurança jurídica, elevada informalidade no emprego e considerável redução dos investimentos, inclusive afugentando investidores estrangeiros que veem o Brasil como a mais vasta fronteira global para a realização de grandes eventos festivos, esportivos e culturais.

Se, com todos os constrangimentos causados por uma legislação trabalhista complexa e inadequada, o Brasil consegue fazer o Carnaval carioca e baiano, as feiras literárias de Parati e Porto Alegre, o Rock in Rio, as múltiplas competições esportivas da natureza, e o maior campeonato de futebol nacional do mundo, o que acontecerá depois da legalização do trabalho intermitente?

Paulo Solmucci é presidente executivo da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes

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