O Senado tem um dever a cumprir

Aécio Neves.

A ministra Cármen Lúcia deu um passo custoso para evitar o conflito com o Legislativo. Ao formular a emenda-jabuticaba, que permite ao STF punir um parlamentar e ao Legislativo despuni-lo, ela puxou para si e para o STF a fogueira de uma opinião pública impaciente com vacilações e desejosa de ver o circo pegar fogo. Mas também jogou no colo do Senado Federal a chance de vencer uma batalha contra o processo aparentemente inexorável de descrédito nas instituições. Poucos acreditam que, na sessão de terça-feira, os senadores tratarão Aécio Neves com o rigor usado na incineração de Delcídio do Amaral. Porém, se a Casa surpreender e tomar a decisão que dela espera o eleitorado mais vigilante, em um desses imprevistos das nuvens passageiras da política, protegerá, a um só tempo, as reputações do Congresso, do STF, do Executivo e dos partidos políticos, incluindo o PSDB. Como dizem os avós, a vida é feita de escolhas, e cavalo encilhado não passa toda hora.

Quando a 2ª Turma do STF suspendeu a ida de Aécio Neves ao Senado e à balada, espalharam-se reações compreensíveis contra o açodamento do Judiciário no bambo equilíbrio da Praça dos Três Poderes. Discursos inflamados apostaram no impasse, inclusive o do PT, que arriscou confundir seus eleitores. O argumento central daquele arroubo parlamentar era o de que não se buscava proteger um senador, mas a autonomia do Legislativo. Está na Constituição que só a ele, o Legislativo, cabe autorizar o afastamento de um congressista, a não ser em caso de flagrante de crime inafiançável, como não era o caso de Aécio nem foi o de Delcídio. Cármen Lúcia pagou um preço alto por restituir a autonomia ao Legislativo. O Senado tem agora a obrigação moral e cívica de saber o que fazer com ela.

Se cumprir o dever de prestar atenção às conversas gravadas de Joesley, que está preso por causa delas, a Casa provará ao país que a reação indignada à prepotência da 2ª Turma não foi em defesa da impunidade, mas da independência dos Poderes. Retribuirá o sacrifício feito por Cármen Lúcia, reconhecendo-lhe o mérito e o esforço pela estabilidade. Aliviará o PSDB do protagonismo capturado pela indiscrição de Aécio. E talvez o mais importante para o governo, o Judiciário e o Legislativo: terá a chance de enfraquecer a desconfiança crescente de que a derrubada de Dilma Rousseff e a condenação do ex-presidente Lula não passaram de um golpe sucupiriano de conspiradores e derrotados nas eleições de 2014.

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