Lula na cadeia seria um eleitor imbatível nas eleições de 2018

Ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Foto Orlando Brito

Lula candidato estará no segundo turno; condenado, mas solto, um eleitor poderoso; preso, um eleitor imbatível. Esta análise Os Divergentes ouviu da boca de duas grandes expressões da esquerda, ambos ex-presidentes de partidos, em conversa informal.

Como sugerem os fatos que estão tomando conta do cenário, é muito possível que o sistema judiciário desafiado decrete algum tipo de condenação ao ex-presidente. Teremos, então, uma das duas hipóteses aventadas, com Lula participando do pleito como impedido pela Lei da Ficha Suja ou, mais ainda, no fundo de uma cela de penitenciária ou, numa fórmula mais amena, em prisão domiciliar, proibido de ir aos palanques ou se fazer ouvir pela televisão.

Nestas duas hipóteses, admite-se que Lula patrocinaria um candidato. Neste caso não se repete o episódio Dilma Rousseff. Em 2010 ela concorreu como sucessora para dar continuidade a um governo extinto, como foi  Eurico Gaspar Dutra, em 1946, indicado e apoiado por Getúlio Vargas, o mandatário deposto. Agora seria o restabelecimento de uma situação perdida, uma restauração. É diferente.

O nome que se apresenta é de Fernando Haddad, um jovem da elite paulista, professor da mais importante universidade de País, a USP, uma das maiores do mundo, que vem de uma campanha política amargando uma derrota. Entretanto, naqueles dias de 2016 seria uma façanha acima de qualquer expectativa um candidato petista vencer na capital paulista. A seu favor Haddad trás a imagem de probo: passou uma eleição acirrada sem uma só mácula, num universo de políticos em que quase todos teriam alguma explicação a dar sobre suas finanças eleitorais. É um nome forte.

Voltemos aos postes: Haddad não é Dutra. O velho marechal seria mais comparável a Dilma, pois embora Dutra tivesse jogado a pá de cal na ditadura Vargas, chegou ao eleitorado com a imagem de continuador, apoiado pelo ditador deposto.

Como Dutra, Dilma fez um governo politicamente medíocre e economicamente desastroso. Getúlio voltou em 1951 para consertar. De fato fez grandes reformas econômicas. Só para citar as mais estratégicas e que são ainda hoje comemoradas: segurança energética com a Petrobrás, um sistema para capitalizar a indústria com o BNDE (ainda sem o S), e criou as bases para um sistema financeiro para fomentar a agricultura com o Banco do Brasil. O estado à frente, dinâmico e eficiente, como era o padrão da época, dominada pela flamante social democracia europeia.

Enredado nas teias de uma tragédia, com o filho a ponto de ser acusado de assassinato, bombardeado por uma campanha de mídia sem precedentes no país, somente comparável à recente experiência macartista nos Estados Unidos, Vargas caiu, mas levou consigo o sonho de poder da oposição udenista e seu candidato Juarez Távora, um herói das revoluções, bom orador e com pinta de galã.

Getúlio deixou um candidato com mensagem de continuidade e avanço, Juscelino Kubitschek, então um político regional, desconhecido, governador de Minas Gerais, apoiado por intelectuais e das chamadas forças populares emergentes. Venceu e deixou um nome na História.

Seria o caso de comparar a candidatura Haddad à de Juscelino?

Esta crônica se limita a especular sobre o quadro eleitoral. Há muito mais em jogo. Então outra comparação com os tempos passados.

Em 1937, quando se deu o chamado golpe do Estado Novo, o país vivia uma situação que vale ser lembrada, ainda limitando-se ao quadro eleitoral.

Os velhos partidos esfumavam-se. As eleições marcadas para de janeiro de 1938 ofereciam duas candidaturas representativas das forças tradicionais: a oposição com ex-governador de São Paulo, Armando Salles de Oliveira (professor da USP, esteio da elite paulista), e o governo vinha com o paraibano José Américo de Almeida, líder político nordestino nos tempos da revolução, ex-ministro de Vargas na fase constitucional. Havia um terceiro nome, mas sem chances eleitorais, o líder integralista Plínio Salgado, propagado por uma militância estridente e fardada, ultranacionalista, assemelhada aos nazi-fascismo europeu.

O País fervia como um caldeirão de feijoada, uma crise a fazer inveja para esta de nossos dias, pois além de toda a brigalhada interna havia conspirações internacionais (Plano Cohen), comunistas presos, fascistas marchando nas ruas, governadores inquietos e, até belicosos, como era o caso de Flores da Cunha, do Rio Grande do Sul, que importou da Tchecoslováquia equipamentos de guerra para a Brigada Militar. Não deu em nada.

Esperava-se que as eleições acalmassem os ânimos. Não deu para chegar lá.

Em 10 de novembro de 1937 Vargas estava num jantar com amigos na hora em que os militares deram um golpe e lhe entregaram uma nova ditadura numa bandeja. Nas praias do Rio de Janeiro, nas praças e bulevares das capitais, o povo assistia a tudo “bestificado”, como disse Aristides Lobo sobre a passividade com a queda do Império. Hoje se usa outra expressão para o ânimo popular com a política e as eleições.

Como dizia Eric Hobsbawm, tempos interessantes.

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