Produtores rurais propõem desmatamento zero na Amazônia

Um grupo conservador, formado por ministra e ex-ministros, pode ser a arma do vice-presidente da Republica, Hamilton Mourão, para exibir uma inusitada face conservacionista do Governo Bolsonaro. Um inédito "desmatamento zero" da incandescente Amazônia

Hamilton Mourão, o vice-presidente da República, e Tereza Cristina, a ministra da Agricultura / Foto: Orlando Brito

O vice-presidente Hamilton Mourão está de olho na proposta da ministra da Agricultura, Tereza Cristina, de adoção oficial de meta “desmatamento zero” na Amazônia. Ele é o presidente do Conselho Nacional da Amazônia Legal. A proposta foi defendida em 2019 pelo ex-ministro da Luís Fernando Cirne Lima na Frente Parlamentar da Agropecuária, quando a atual titular da pasta era presidente da Frente Ruralista.

O ex-ministro Luiz Fernando Cirne Lima

Fundador da Embrapa (foi ministro da Agricultura entre 1969 e 1973), Cirne Lima integra o conselho de administração do grupo gaúcho SLC, controlado pela família Logemann, um dos maiores produtores mundiais de algodão, soja e milho. Ou seja, vindo de onde vem, a proposta teria origem nos plantadores, não como projeto de governo (a ministra é produtora rural) ou entidades ambientalistas, o que representa uma configuração nova para a questão. São os produtores que pegam a bandeira da preservação da floresta ao rejeitarem o aumento de áreas para lavouras na selva amazônica.

Essa ideia de um posicionamento vinha amadurecendo desde os tempos dos debates na Câmara dos Deputados sobre a nova legislação dos defensivos agrícolas, no dizer dos plantadores, ou agrotóxicos, na linguagem dos militantes ambientalistas. Neste sentido, aumenta seu alcance.

Os três tenores do agronegócio

O ex-ministro Alysson Paulinelli

Foram convocados a opinar sobre alternativas para sustentabilidade os ex-ministros que implantaram a revolução tecnológica na agropecuária brasileira. Os três são engenheiros agrônomos e compõem um trio que é chamado de “os três tenores do agronegócio”: Cirne Lima é ex-professor da Faculdade de Agronomia da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), o mineiro Alysson Paulinelli (1974-79) e o paulista Roberto Rodrigues (2003-06), professor de agronegócio da Fundação Getúlio Vargas.

Este apelido eles ganharam quando participaram, na condição de esteios do grande salto da agropecuária brasileira, de importadora de alimentos para segunda maior produtora mundial. Há uma quarta figura, mas ligada diretamente à comercialização internacional, o ex-ministro Pratini de Moraes (1999-2003), economista.

Ex-ministro Roberto Rodrigues – Foto: Orlando Brito

Eles vêm de formações em escolas de agronomia brasileiras que são referências internacionais na área acadêmico-científica: Cirne Lima da UFRGS, Paulinelli da Faculdade de Agronomia de Lavras, Roberto Rodrigues da Escola Superior de Agricultura Luís de Queiroz (USP, Piracicaba) e a própria ministra da Faculdade de Agronomia de Viçosa (MG). Estas seriam as bases técnicas da revolução agrícola no País a partir dos anos 1970.

Temporada do fogo

A determinação dos plantadores de assumir a liderança de uma ação conservacionista seria um argumento poderoso para o vice-presidente usar, na condição de gestor do passivo amazônico (queimadas e desmatamento). O desafio retórico é dar respostas adequadas, tecnicamente embasadas e com força política para enfrentar os efeitos negativos à imagem internacional do Brasil durante a próxima temporada dos inevitáveis incêndios florestais típicos da estação da seca no extremo norte.

A estiagem vai de junho a novembro. O fogo se propaga no segundo semestre. Recomeça a polêmica.

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