Centrão profana obra de Niemayer

Ao destituir o Comitê de Imprensa, o líder do Centrão não estaria apenas botando abaixo parte de uma edificação histórica tombada, protegida pela legislação, mas também um conceito, pois ao situar aquela repartição nesse local, o arquiteto expressava um conceito de respeito e interação com a opinião pública nacional. É um primeiro passo de um atentado à democracia

O Comitê de Imprensa da Câmara, embaixo à direita, iluminado - Foto: Orlando Brito

Salvar um patrimônio Cultural da Humanidade das pás e picaretas do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, é a articulação que entidades e lideranças da imprensa, patrões e empregados, estão em vias de propor ao Supremo Tribunal Federal, no sentido de impedir que a obra de Oscar Niemayer seja profanada. Ao destituir o Comitê de Imprensa, o líder do Centrão não estaria apenas botando abaixo parte de uma edificação histórica tombada, protegida pela legislação, mas também um conceito, pois ao situar aquela repartição nesse local, o arquiteto expressava um conceito de respeito e interação com a opinião pública nacional. É um primeiro passo de um atentado à democracia.

Muralha de proteção

Ao determinar a destruição do Comitê de Imprensa, localizado ao lado do plenário, simbolicamente representando um laço indissolúvel entre parlamento e opinião pública, Lira está criando uma muralha para se proteger de sua própria biografia. Réu de processos capitulados no Código Penal, o novo presidente, levado ao cargo pelo baixo clero da Câmara Baixa, está procurando uma rota de fuga, uma forma um tanto grosseira de se esquivar de perguntas irrespondíveis. Olhando para o passado recente, o presidente da Câmara imagina que as passagens secretas que mandou construir (como nos castelos medievais) possam bastar para se escafeder sorrateiramente e se escapar de onde figuras com trajetórias semelhantes, como Severino Cavalcanti que teve que renunciar, e Eduardo Cunha, tirado de sua cadeira presidencial diretamente para o fundo de celas, atrás das grades.

O bota-abaixo na calada

Lira protegido por guarda-costas no Salão Verde da Câmara – Foto: Orlando Brito

Arthur Lira está se aproveitando de uma situação inédita na história do parlamento: devido à pandemia, o prédio foi fechado. Somente parlamentares e funcionários essenciais têm acesso ao Palácio Legislativo. Com isto, valendo-se da interdição, ele pode mandar seus pedreiros desfigurarem parte do edifício sem temer manifestações que, inevitavelmente, bloqueariam o bota-abaixo. Não fosse isto, o Salão Verde e as próprias instalações do Comitê seriam ocupadas pelos repórteres, por figuras do mundo cultural, por grupos e pessoas que respeitam a memória e o orgulho nacional. Esta é a questão: Lira está enxovalhando a memória do Niemayer que, ao lado de Aleijadinho, são os maiores e mais respeitados construtores da História do Brasil.

Canetada fugaz

O construtor de Brasília, cidade patrimônio da Humanidade, tombada pelas Nações Unidas, foi, em seu tempo, o maior e mais famoso arquiteto vivo de todo o Planeta. Triste destino, ser desrespeitado por uma canetada de uma figura fugaz, que sequer deverá figurar na História do Brasil, como ficaram outros antecessores nesse mesmo cargo. E que, nos tempos modernos, respeitaram a metrópole de JK na sua integridade arquitetônica e simbólica. É isto que as entidades devem argumentar e pedir a proteção do STF.

Fugindo dos 30 metros

Arthur Lira, Jair Bolsonaro e Rodrigo Pacheco – Foto: Orlando Brito

Lira já tem um problema para exercer seu cargo: não pode :integrar a linha de sucessão por ser réu de processo criminal. Agora, com isto, pretende eliminar a tradicional caminhada do presidente da Câmara, um trajeto de 30 metros entre o gabinete e plenário. É disso que ele foge. O STF deve barrar a ousadia

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