Foi o que restou

Ex- presidentes Dilma e Lula - Foto Orlando Brito

Muito tem se falado sobre herança. O que pode ser uma bênção, às vezes, vira maldição. Conheço inúmeras histórias – e aposto que você também – sobre confusões homéricas por causa de partilhas. Não há uma receita infalível que evite atritos, mágoas e ressentimentos. Até quando a divisão é planejada com antecedência, pode gerar quizília. Então, quando o provedor, ou provedora, morre de forma abrupta, a probabilidade de uma guerra familiar é maior. Por causa de uma boa herança, filho chora e mãe não vê; irmãos ensaiam um fratricídio; a mulher  pensa em matar o marido e vice-versa.

Quando a questão passa para a política, a tal da herança também costuma deixar rastros de duas maneiras: dos que a renegam e dos que rastejam para se identificar com ela. O momento que vivemos é didático para exemplificar isso.

Voltemos a 2016. Quando o processo que levaria ao afastamento de Dilma começou, uma guerra tomou conta de todos os fóruns. Também me achei no direito de opinar, embora minha opinião não tenha importância.

Partidários da ex-presidente Dilma vão despedir-se dela no Palácio da Alvorada. Foto Sivanildo Fernandes/ObritoNews

Mas vamos lá: de chofre, disse que era contra o impeachment. Um tio, antipetista até a medula, ficou sem entender e me ligou questionando minha posição. Afinal, eu criticava bastante o projeto hegemônico do PT. Expliquei que minha preocupação era com a herança. Disse que o afastamento de Dilma seria ótimo para o partido, que deixaria de herdar todas as merdas criadas, aprimoradas, desenvolvidas pelos governos Luladilma.

Uma equação simples seria construída: o PT deixava de ser responsável por tudo e ainda voltaria a exercer o papel que faz com muita competência, o de oposição. A cúpula dirigente do partido sabia muito bem que não era mais possível viver no mundo dourado de João Santana, nem usá-lo outra vez como peça de marketing. A solução era óbvia. Ser oposição ao próprio projeto. Jogar, de cara lavada, a culpa no sucessor, mesmo que saído da costela coligada. E, depois do afastamento, bastava ter uma estratégia de convencimento. Primeiro para os próprios crentes. Daí surgiu a narrativa do golpe e a ordem era para que fosse repetida à exaustão. Pronto, a herança, agora maldita, era dos outros. Os golpeados passariam a clamar pela volta do guia imortal, mesmo apenado.

Só não esperavam ter provocado a mais maldita das heranças: a candidatura à reeleição de Temer.

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