No Congresso, agora vale a lei de Murici

Seja porque o pagamento das emendas está atrasado, seja porque os parlamentares acham que já deram muito na reforma da Previdência – promulgada semana passada sob a solene indiferença do presidente Jair Bolsonaro – o fato é que o Congresso cansou. Deputados e senadores perderam a cerimónia e estão impondo mais e mais derrotas ao Planalto nas votações. Alguns já apostam que não vai sobrar muito do pacotaço fiscal enviado pela equipe econômica ao Legislativo.

Também estão marcados para morrer os principais itens de medidas provisórias baixadas na semana passada. Na MP que cria o novo regime de contratação para jovens, deverá ser derrubado o dispositivo que trata de seu financiamento via cobrança de contribuição previdenciária sobre o salário desemprego. Parece piada, comentam parlamentares importantes e influentes. Como o Congresso não pode criar despesas sem indicar a fonte, cabe ao governo propor uma nova fórmula e dizer de onde vai tirar os R$ 10 bilhões do programa. Se nada fizer, a medida caduca.

Outro dispositivo da MP fadado à rejeição é o que acaba com o registro profissional de algumas profissões, como a de jornalista, em mais uma iniciativa de Bolsonaro para atingir os profissionais da imprensa, com quem vive às turras. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, já anunciou que não há chance de aprovação dessa medida. Aliás, na semana passada, o Legislativo já mostrou de que lado está ao derrotar, na comissão mista, a medida provisória de Bolsonaro que liberava as empresas de publicar seus balanços em jornais impressos – o que traria forte impacto financeiro aos jornais.

Ninguém espera que o pacote fiscal que atira em todas as direções seja votado nas cinco semanas que restam até o final do ano. No máximo, alguma medida emergencial para garantir a viabilidade do orçamento de 2020 – uma das poucas matérias que serão votadas ainda este ano. Artigos das PECs que permitirão ao governo reduzir a jornada e o salários de funcionários públicos, reduzir na prática os investimentos em educação e saúde, descumprir decisões judiciais se não houve orçamento para pagar seus beneficiários, entre outras medidas do saco de maldades, vão para o ano que vem – ou, mais provavelmente, para a lata do lixo.

Antigamente, derrotar o governo em votações era quase sempre traumático, sujeitando os infratores a constrangimentos e até punições traduzidas pelo corte de emendas e pela perda de cargos. No governo Bolsonaro, instalou-se no Parlamento um clima de cada um por si. Ninguém sabe quem é governo, quem é oposição, quem não é nenhum dos dois ou quem é os dois. A decisão do presidente da República de sair de seu partido e fundar um outro, rachando o que restava de uma mínima base parlamentar, é a cereja desse bolo.

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