Alguém vai aprender a lição chilena?

Na era digital, manifestações de rua, articuladas nas redes, aparecem como se fosse do nada, sem maiores avisos ou preparações. Catalisam insatisfações latentes em relação à política, à situação econômica e a serviços públicos e muitas vezes passam por um efeito massa de pão: quanto mais você bate, mais crescem. Assim foi no Brasil, nas chamadas jornadas de 2013, assim parece estar sendo agora no Chile  depois que o presidente Sebastian Piñera – seguindo o receituário dos governos de direita – botou Exército e Polícia nas ruas batendo nos manifestantes. Nada garante que o Chile não será aqui de novo.

Aliás, os olhos de boa parte do establishment político brasileiro, inclusive governista, estão voltados para Santiago e outras cidades chilenas palco de conflitos sérios e mortes. É um baque, para muita gente, ver o Chile, aquele nosso colega sempre apontado como primeiro da turma na escola do liberalismo latinoamericano, aquele menino perfeito que fez todas as lições, levar esse tombo.

Assim como ocorreu aqui há seis anos, as manifestações chilenas foram detonadas por um aumento banal na passagem do transporte público. Mas é evidente que o iceberg por baixo dessa ponta é enorme, e passa pelo empobrecimento da população, pela falta de atendimento de suas necessidades e pela desigualdade cada vez maior. No Chile, o 1% mais rico da população detêm 33% das riquezas (no Brasil, é cerca de 28%).

É claro que já vimos isso em algum lugar do passado e temos medo de ver no futuro. Até porque temos um governo de direita que, sem sombra de dúvida, adotaria o modelito troglodita no trato das manifestações.  No momento em que o Congresso conclui a votação da reforma da Previdência, é inevitável pensar na que o Chile fez – elogiadíssima pelos economistas liberais, mas agora, alguns anos depois, caindo na pela dos chilenos, empobrecidos e revoltados.

Curiosamente, as contas do Chile não vão tão mal, nem a economia, que cresce aproximadamente 3% este ano. Mas o que a lição chilena pode ensinar é que o discurso das belas reformas não pode perder de vista a vida real. Será que alguém vai aprender? Duvido.

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