A guerra de resistência de Moro contra os desvarios de Bolsonaro

Presidente Jair Bolsonaro e o ministro Sérgio Moro - Foto Orlando Brito

Dia sim, no outro também, Jair Bolsonaro dá uma estocada em Sérgio Moro. Sempre subindo o tom. Caciques políticos e palacianos se admiram com o fato de Moro ainda não ter pedido o boné e deixado o governo. Espalham variadas versões para o “receio” do ministro da Justiça largar o poder. Há aliados de Moro que também defendem que ele pare de engolir sapos e rompa logo com Bolsonaro. Outros parceiros fazem uma análise diferente.

O que tem feito Jair Bolsonaro esbravejar toda a manhã, ao cruzar com os repórteres de plantão à porta do Palácio da Alvorada? Um dia é a Receita Federal, no outro a Polícia Federal, sem falar na fogueira em que se meteu com as asneiras sobre as queimadas na Amazônia. As bobagens amazônicas são fogo de palha, maneira burra de distrair a plateia. O que de fato o incomoda são as apurações e investigações do Coaf, da Receita Federal e da Polícia Federal que, de um jeito ou outro, esbarram em encrencas do clã Bolsonaro no Rio de Janeiro.

A prioridade de Jair Bolsonaro sempre foi sua família. Gente de seu entorno diz que, na ótica dele, assim que assumisse o poder em Brasília, os eventuais problemas do passado se dissipariam. O caso envolvendo o senador Flávio Bolsonaro — e todos os seus desdobramentos familiares — estariam superados. Não foi o que aconteceu.

Jair Bolsonaro e os filhos Flávio, Eduardo e Carlos = Foto Roberto Jayme/Ascom/TSE

Seu ministro da Justiça e todos os órgãos de controle de seu governo não mexeram sequer um pauzinho para travar o avanço das apurações. Quem apareceu com uma solução mágica foi o ministro Dias Toffoli, presidente do STF, que numa canetada suspendeu o inquérito que atingia Flávio Bolsonaro e dezenas de investigações baseadas em relatórios do Coaf.

Foi o suficiente para Bolsonaro se convencer de um canto de sereia que vinha ouvindo desde que assumiu o governo e começou a se relacionar com outros poderes em Brasília: a tinta de sua caneta nova, se adequadamente usada, era capaz de produzir prodígios nos embates entre poderes. Inspirado no neo parceiro Toffoli, que também tirou o Coaf e a Receita do cangote de ministros do STF, ele resolveu reorganizar os órgãos de controle de acordo com as necessidades do clã Bolsonaro.

Presidentes do STF, Dias Toffoli, e da República, Jair Bolsonaro – Foto Orlando Brito

O maior trunfo foi a transferência do Coaf para o Banco Central. Ali, os atuais conselheiros seriam substituídos inclusive por gente de fora do serviço público. A resistência dos orgãos de controle, com o apoio de Sérgio Moro, conseguiu barrar essas mudanças. Os conselheiros, inclusive os dois delegados federais que iniciaram a Lava Jato, foram mantidos nos cargos.

No embalo do Coaf, sempre no afã de proteger Flávio Bolsonaro, o 001, o presidente resolveu meter o bedelho na Receita Federal e na Polícia Federal no Rio de Janeiro. Além do superintendente da Receita no Rio, ele quis mudanças inexplicáveis como trocar, por um indicado dos Bolsonaros, o chefe da Alfândega do Porto de Itaguaí, posto tido como estratégico no combate a milícias e a outras facções criminosas. Uma pequena sublevação na Receita resultou na queda do subsecretário-geral João Paulo Fachada, mas até agora preservou sua estrutura no Rio. Pode ter sido uma vitória dos adversários da Lava Jato, mas ainda não abriu espaço para a troca no Rio pelos apadrinhados de Flávio Bolsonaro.

Com todas as farpas em Moro, Bolsonaro ainda não conseguiu emplacar seu candidato à chefia da Polícia Federal no Rio de Janeiro. O máximo que até agora conseguiu foi abreviar a saída do delegado Ricardo Saadi. Com o apoio de Flávio Bolsonaro, o delegado Alexandre Saraiva, superintendente da PF no Amazonas, foi barrado pela cúpula da PF, que escolheu outro delegado para o cargo. Essa decisão foi comunicada a Bolsonaro pelo diretor-geral da Polícia Federal, Maurício Valeixo, acompanhado por Sérgio Moro.

Maurício Valeixo – Reprodução/RPC TV

Foi uma conversa indigesta para Bolsonaro. Ele passou dias se remoendo. Até que criou coragem e, nas declarações aos plantonistas da imprensa nessa quinta-feira, ameaçou demitir Maurício Valeixo. “Agora há uma onda terrível sobre superintendência. Onze foram trocados e ninguém falou nada. Sugiro um cara de um Estado para ir para lá, `está interferindo. Espera aí. Se eu não posso trocar o superintendente, eu vou trocar o diretor-geral”.

Diante dessas ameaças, Sérgio Moro deveria pedir demissão? Uns aliados acham que sim. Outros pensam diferente e avaliam que, enquanto ele conseguir resistir aos desvarios de Bolsonaro, evitando o desmanche dos órgãos estatais de controle, não tem porque pedir demissão. Joga para Bolsonaro e sua acalentada Bic o ônus de demitir um subordinado que tem mais popularidade do que ele. É pagar para ver.

A conferir.

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