Que tiro será esse? Próximo presidente poderá ser uma bala perdida

Como disse Helena Chagas, a primeira pesquisa Datafolha após a condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva veio mais para confundir do que para explicar. Quando ele é retirado das opções, aparece um quadro no qual Jair Bolsonaro lidera, mas sem grande consistência: sua intenção de voto diminuiu e ele perde em várias situações de segundo turno. Especialmente, a pesquisa não aponta ninguém que claramente vá se beneficiar ou ser o repositório dos votos que seriam dados a Lula no caso, bastante provável, dele não disputar a eleição. Ou seja: embolou o jogo.

Vamos admitir, apenas por hipótese, que todo esse processo,  que envolve o Ministério Público, a Polícia Federal, o Poder Judiciário em várias instâncias – que, de acordo com o site do Ministério Público, levando-se em conta somente a sua vertente no Paraná já expediu 888 mandatos de busca e apreensão, 222 mandados de condução coercitiva, 101 mandados de prisão preventiva, 111 mandados de prisão temporária, 117 condenações contra 113 pessoas, que somam 1.753 anos de prisão, entre outros números –, de fato tenha sido movido com o único propósito de impedir Lula de disputar a eleição.  Se tal conspiração for verdade, todos esses conspiradores correm o risco, a julgar pela Datafolha, de atirar no que viram e acertar o que não viram.

Parafraseando a DJ Todynho (perdoem, sinal dos nossos tempos), há uma chance de nos perguntarmos em outubro que tiro será esse. No quadro embolado que a pesquisa Datafolha demonstra, há uma grande chance de o próximo presidente ser uma bala perdida. Ou seja: alguém completamente fora do quadro anteriormente previsto.

E, se havia nisso tudo de fato alguma conspiração de “centro-direita”, a pesquisa aponta uma grande chance do resultado final não vir desse campo.

Ao longo dos últimos dias, enquanto se desenrolava a condenação de Lula, Bolsonaro também viu sua situação ser questionada por denúncias de uso indevido de verba de moradia. Às quais respondeu de forma absolutamente grosseira. Assim, o que a pesquisa mostra é uma situação cristalizada. Como polarizava com Lula, sem ele Bolsonaro lidera. Mas com os mesmos índices que já tinha, até um pouco menos.

E quem parece mais se beneficiar da saída são outros candidatos identificados com o mesmo campo da centro-esquerda de Lula: Marina Silva e Ciro Gomes. Marina irá para a sua terceira eleição presidencial, e sempre apareceu em posição de destaque. Nas últimas eleições, chegou a liderar por um momento depois da morte de Eduardo Campos (era a sua candidata a vice). Parte da sua força vem desse recall. E parte vem de certo perfil próximo do de Lula (de mulher pobre que ascendeu, ex-petista, com preocupações parecidas). Mas, desde que saiu do PT, Marina só aumentou seu afastamento do partido, a ponto de apoiar Aécio Neves no segundo turno nas últimas eleições. Isso faz com que não herde votos da militância. Mas o eleitorado de Lula é muito maior que a militância petista.

Já Ciro faz um movimento pendular no apoio a Lula. Bem lá atrás, há quase um ano, já dizíamos por aqui que o plano B de Lula poderia ser Ciro. De lá para cá, ora Ciro viu-se mais próximo disso, ora mais longe. Então, ora ele defendeu Lula mais fortemente, ora afastou-se para atacar mais duramente a ele e ao PT. O fato é que Ciro foi construindo ao longo do tempo um perfil de “sincerão”, que agrada a parte do eleitorado. E “sincerão” numa linha que coincide com certos pontos do discurso lulista e petista, de enxergar erros e disposição político-partidária nas ações da Lava-Jato, ao mesmo tempo em que por vezes aponta para erros do PT, especialmente na forma como construiu suas alianças e imiscuiu-se com elas. Se o macho man não se enrolar nas respostas como aconteceu em outras ocasiões…

A profusão de diferentes cenários testados pelo Datafolha, trazendo de volta nomes que pareciam já fora da disputa como o prefeito de São Paulo, João Dória, e o apresentador Luciano Huck, é outro elemento a reforçar como o quadro está embolado.

Dentro, portanto, dessa imprevisibilidade, alguém pode fazer um momento inesperado e tomar o tiro que os estrategistas imaginavam que iria acertar outra pessoa. Ainda vamos ter que esperar mais um pouco para saber que tiro será esse…

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