Difícil de entender  o “discursinho” de Itu do presidente

Para ressaltar a passagem da Proclamação da República, o presidente Michel Temer resolveu escolher a cidade de Itu, aquela que ficou famosa por usar o diminutivo para nomear coisas enormes. Agora, depois da passagem de Temer por lá, além da “borrachinha de Itu”, da “canetinha de Itu”, etc, temos a desafiar a nossa compreensão o “discursinho de Itu”. Quando resolveu discorrer sobre certa “vocação autoritária” da sociedade brasileira, Temer pretendia apenas dar uma aula banal de história ou queria dizer mais alguma coisa? Era um “discursão” ou um “discursinho”?

Por que cargas d’água um presidente que tem sua legitimidade contestada por parte da população, que amarga índices péssimos de popularidade, contorna denúncias graves contra ele e administra os achaques da sua base de sustentação vem discorrer sobre suposto apoio da população a soluções autoritárias?

Aparentemente, Temer tentava falar sobre seu próprio caso. Da tese de que foi vítima de uma tentativa de golpe por parte do procurador-geral da República. “Se nós não prestigiarmos certos princípios constitucionais, a nossa tendência é sempre caminhar para os autoritarismos”, disse lá o presidente. Para emendar que a população brasileira teria desejado a ditadura de Getúlio Vargas e a ditadura militar.

Bem, em primeiro lugar, aparentemente como historiador Michel Temer deixa um pouco a desejar. Numa reportagem na edição desta quinta do El País, a historiadora Heloisa Starling , da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), mostra que pesquisas de opinião feitas à época apontavam para um apoio da maioria da população às reformas propostas por João Goulart na época do golpe de 1964. Havia, ela aponta, apoio ao golpe, mas ele não era majoritário. Essas pesquisas não foram divulgadas à época.

Ou seja, pelo menos com relação ao golpe militar de 1964, se havia apoio a favor, havia maior posição em contrário. Se não há dados semelhantes quanto ao movimento de Vargas, há informação sobre a própria Proclamação da República, que foi também no seu início um golpe militar. Sobre ela, disse Aristides Lobo em 1889: “O povo assistiu bestificado à Proclamação da República”. Ou seja, se não era contra, também não era a favor. E Aristides Lobo era republicano e foi ministro do governo que se instalou.

Longe de ser pacífica a ideia do apoio ou não da sociedade a soluções autoritárias, o que parece mais claro é que tal caminho tem sido por aqui muitas vezes a opção das elites. O fato é que o Brasil interrompe toda hora sua experiência democrática. Tem mais ou menos a mesma idade dos Estados Unidos e metade do tempo de democracia.

E é por isso que ficamos sem saber se houve um “discursinho” ou um “discursão” de Itu…

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