Partidos demais, reforma de menos

No início dessa nossa atual experiência democrática, quando acabou o bipartidarismo e partimos para o pluripartidarismo, fazia todo sentido o espectro político-ideológico que se formou. Se não vejamos, da direita para a esquerda:

O PDS, herdeiro da antiga Arena, era o representante da direita ultranacionalista que comandou o país no autoritário regime militar. O PFL e o PL surgiam como representantes do novo modelo de direita moderna, de concepção econômica neoliberal que despontava no mundo naquele início dos anos 1980. O PP de Tancredo Neves era a representação dos que eram politicamente conservadores, mas defensores da democracia. O PMDB, herdeiro do antigo MDB, típica agremiação de centro, filha do velho PSD anterior à ditadura. O PSDB trazia para o país os conceitos da social-democracia parlamentarista europeia. O PSB vinha em seguida propondo o modelo dos partidos socialistas democráticos também da Europa. Os partidos comunistas, PCB e PCdoB, representavam as diferenças de concepção de seu modelo após a revisão feita na União Soviética por Kruschev. O PDT como representante do trabalhismo getulista. O PT legenda do novo sindicalismo surgido depois das greves do ABC e da nova esquerda que buscava se desvincular dos velhos partidos comunistas, forjada nas academias e na Igreja Progressista.

É meio triste ver que passados estes mais de trinta anos desde o fim da ditadura e a criação dos partidos mencionados acima, tudo isso tenha se transformado numa tremenda geleia. A maioria dos partidos caminhou para um centro conveniente. Há gente mais e menos conservadora em praticamente todas as legendas. Gente que migrou conforme suas conveniências de momento. Diante da polarização PT/PSDB que marcou os últimos anos até a queda de Dilma Rousseff, a maior parte dos partidos flutuou entre um grupo e outro apenas pela atração do poder. Com o PMDB à frente, com a sua maioria dentro de todos os governos, emprestando seu grande número de votos no Congresso em troca do atendimento dos seus interesses, os confessáveis e os inconfessáveis. O PSDB nem costuma dizer mais que a defesa do parlamentarismo está no seu programa partidário. E nunca houve qualquer herança trabalhista e sindical em pessoas como, por exemplo, Delcídio do Amaral.

A geleia partidária brasileira é uma das raízes mais importantes da crise política que vivemos. Existem mais de 50 partidos políticos no país. Mais de trinta com registro definitivo no Tribunal Superior Eleitoral. Numa pesquisa nas páginas desses partidos na Wikipedia, nada menos que 37 declaram-se de centro. Ou seja: escapam do debate pelo meio. Porque assim estão prontos a aderir a qualquer governo conforme a ocasião. Associe-se a isso a paupérrima discussão das torcidas organizadas nas redes sociais, nas quais, na maior parte do tempo, fica só o sujo falando do mal lavado, numa troca de dedos acusatórios para delitos semelhantes, e eis a nossa tragédia.

A outra grande raiz dos nossos problemas está no custo altíssimo das campanhas eleitorais. Milhões de reais gastos em meras eleições de deputado estadual. Somas enormes de dinheiro entrando, seja pelo caixa 1, seja pelo caixa 2.

Seja no mensalão, seja agora na Operação Lava-Jato, estão nos dois aspectos colocados aí acima a origem de todos os crimes revelados e de todas as condenações definidas. Partidos sem coloração ideológica aderem aos governos por razões que passam longe, a quilômetros, de adesão convicta aos programas propostos ou por afinidade. Entram em troca de esquemas de poder e de dinheiro, que acabaram sendo escancarados pelas investigações nos dois escândalos e em outros correlatos.

Chegando aí ao segundo ponto: sem convicção ideológica, aderem em troca do dinheiro de que precisam, na melhor das hipóteses, para se elegerem. Dinheiro que entra fácil e é fácil de ser desviado. Na atual balada do Ministério Público, da Polícia Federal e da Justiça, uma situação que não é mais muito tolerada. Daí a crise permanente que estamos vivendo e as prisões lotadas de antigas excelências.

Trágico cenário… No momento, o Congresso discute uma reforma política. Alguém leu ou ouviu surgir dessa discussão alguma proposta para esses problemas expostos acima? Segue a nossa tragédia…

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