Bolsonaro se faz de sonso sobre ordens para a matança na ditadura

Deputado Jair Bolsonaro. Foto Orlando Brito

Diante das revelações de um memorando secreto da CIA de que o presidente Ernesto Geisel autorizou a mantança de “subversivos perigosos” nos porões da ditadura, desde que as execuções fossem autorizadas pelo general João Figueiredo, chefe do SNI e seu

1982: o general João Figueiredo foi o primeiro presidente brasileiro a falar na tribuna da ONU. Foto Orlando Brito

sucessos no Palácio do Planalto, Ricardo Miranda postou aqui “Com a palavra, Bolsonaro!”. Pois bem. Bolsonaro falou, em entrevista à rádio Super Notícia, de Belo Horizonte.

Pisou tanto na bola que alguns acharam que era melhor ele ter ficado calado. Estão errados. Para os eleitores que, com intenção ou não de votar nele, o melhor é ele se mostrar por inteiro, dizendo o que realmente pensa.

E o que ele pensa sobre as barbaridades praticadas na ditadura?

Sobre a revelação de que, pouco depois da posse, Geisel,

O discurso do presidente Geisel no Clube da Aeronáutica. Foto Orlando Brito

depois de ter sido informado que 104 presos políticos haviam sido assassinados na gestão Garrastazu Medici, autorizou a continuação da matança, desde que com mais cautela, Bolsonaro falou: “Quem nunca deu um tapa no bumbum do filho e depois, se arrependeu?”.

Não satisfeito com a absurda comparação, Bolsonaro tentou desqualificar o relatório secreto da CIA. E o fez com a mesma cara de pau de políticos pegos com a mão na botija dos cofres públicos. “O que pode ter acontecido com este agente da CIA? Quantas vezes você falou num canto ali que tem que `matar mesmo´, `tem que bater`, `tem que dar canelada”. Ele deve ter ouvido uma conversa como esta, fez um relatório e mandou. Agora, cadê os 104 mortos?”.

Bolsonaro finge que não ouviu falar das torturas, dos desaparecidos, das apurações sobre como foram assassinados opositores da ditadura, e das ossadas de presos políticos identificadas.

E, também, se faz de sonso ao especular sobre como a CIA coletou informações no alto escalão da ditadura. Sobre o comando de um regime que ajudou a instalar e a manter, um memorando, com tal riqueza de detalhes, não chegaria à mesa de Henry Kissinger — o homem mais poderoso do mundo naquele momento – apenas com fofocas e mal-entendidos.

Bolsonaro falou mais.

No melhor estilo de todos os caciques políticos flagrados em corrupção, ele fez um arremedo de teoria da conspiração para criticar a divulgação do documento da CIA: “Voltaram à carga. Um capitão está para chegar lá. É o momento. Foi o memorando de um agente que a imprensa não divulgou. É um historiador que diz que leu isso e não mostrou”.

Como assim? Um historiador diz que leu um documento, e não mostrou, com o propósito de prejudicar “o capitão que está para chegar lá”. Menos, Bolsonaro. A íntegra do memorando, excetos os trechos ainda mantidos em sigilo pelas autoridades americanas, está em todo os sites.

Como não dá para esconder o sol com uma peneira, Bolsonaro terá de resolver um dilema antes de enfrentar os debates televisivos com seus concorrentes no páreo pelo Palácio do Planalto. Ou assume que torturar e assassinar presos políticos foi uma política do regime militar para se manter no poder ou a renega, coisa que não parece disposto a fazer.

Só não vai dar pra continuar comparando torturas e assassinatos com tapinhas no bumbum de bebês.

Simples assim.

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